A série “À Conversa com um Ecólogo” é uma parceria Wilder e Sociedade Portuguesa de Ecologia (SPECO), que nos dá a conhecer diferentes ecólogos portugueses. Desta vez, ficamos a saber no que trabalha este professor e investigador da Universidade de Coimbra, apaixonado pelo que faz.
Ruben Heleno, 43 anos, é um apaixonado pelo trabalho que faz enquanto professor, investigador e coordenador de outros investigadores, dedicado ao estudo do funcionamento dos ecossistemas e dos serviços que nos prestam. “É impossível ficarmos aborrecidos”, comenta. Adora dar aulas e fazer trabalho de campo, mas principalmente pensar em novas perguntas, buscar-lhes as respostas e publicar finalmente os artigos científicos.
Assista ao seu testemunho em vídeo e leia a entrevista.
Quem é e o que faz como ecólogo?
Sou professor de Ecologia na Universidade de Coimbra e investigador no Centro de Ecologia Funcional CFE-TERRA da UC. Isso quer dizer que divido o meu tempo entre a investigação científica e as aulas, nomeadamente as do Mestrado em Ecologia, que coordeno. Enquanto investigador, tenho o prazer de liderar um grupo de investigadores, alunos de doutoramento e de mestrado, onde estudamos como as alterações globais afetam a estrutura, o funcionamento e a resiliência das comunidades biológicas. Para compreender esse funcionamento não basta olhar para as espécies (isto é, as peças) que existem num determinado local, é necessário saber como é que essas espécies se “encaixam” para formar a complexa rede de interdependências que suporta o funcionamento dos ecossistemas e os serviços que eles nos prestam.
Um dos processos que gosto mais de estudar é o serviço de dispersão de sementes que os animais prestam às plantas, e que é fundamental para a resiliência das florestas. Mas como as redes ecológicas são uma ferramenta muito versátil em ecologia, é muito fácil estabelecer pontes com outros investigadores e usar as redes ecológicas em muitos contextos. Por exemplo, usamos frequentemente redes ecológicas para estudar também a polinização, a restauração ecológica, controlo biológico, efeitos do fogo, da herbivoria, o impacto das invasões biológicas e da poluição, ou para estudar aspetos mais fundamentais sobre a teoria ecológica e evolutiva. Em suma: é impossível ficarmos aborrecidos.
Como começou na ecologia?
Desde muito cedo que fazia parte dos clubes de ambiente da escola e participava em atividades das ONGs locais. Quando chegou a hora de decidir o curso, não tinha grandes dúvidas de que o que eu queria era estudar a natureza, e por isso a escolha natural era Biologia. Durante a licenciatura, tive a oportunidade de passar uma semana numa das ilhas mais pequenas do arquipélago das Berlengas (os Farilhões) a estudar aves marinhas, e a partir daí nunca mais me afastei das aves, nem das ilhas. Seguiu-se o doutoramento nos Açores, um pós-doc nas Galápagos e muitos projetos posteriores em ilhas espalhadas um pouco por todo o mundo.
Qual é a melhor parte do seu trabalho?
Todas! Não, quase todas! Adoro trabalho de campo, principalmente quando temos que acampar em ilhas completamente desabitadas para estudar as interações entre espécies, muitas vezes endémicas, que habitam esses ecossistemas tão especiais. Mas também gosto muito de dar aulas (muito mais do que eu próprio esperava), de orientar alunos e de divulgar o nosso trabalho, nomeadamente em escolas. Mas se tiver que escolher apenas uma, o que mais gosto é sem dúvida de pensar em novas perguntas, em como as poderemos responder e depois escrever os artigos científicos para contar ao mundo o que descobrimos. A única parte menos boa é a burocracia, mas é um pequeno preço a pagar.
Porque é a ecologia importante?
Porque todos nós fazemos parte dela e dependemos dela. A ecologia é a ciência que estuda como as espécies interagem entre si e com o meio ambiente e, quer queiramos quer não, nós somos mais um nó nessa enorme rede. Somos uma das 10 milhões de espécies do planeta: comemos outras espécies, vestimo-nos com outras espécies, construímos casas com outras espécies e dependemos do ar, da água e de tantos outros serviços que os ecossistemas saudáveis nos dão. Como qualquer outra espécie, também temos parasitas e outros organismos que podem causar doenças e até pandemias, e todos estes organismos – os amigos e os inimigos – têm um enorme impacto na saúde, na economia na qualidade de vida. Ou seja: a ecologia não é opcional, não é uma moda. A humanidade depende dos recursos do planeta e do funcionamento da biosfera e quanto melhor compreendermos os impactos das nossas ações e agirmos sobre elas, melhor para o planeta e melhor para nós.
O que gostaria de fazer mas ainda não fez?
A resposta a essa pergunta não é fácil. Felizmente, tive oportunidades que me permitem sentir completamente realizado. Quero continuar a fazer investigação de ponta e a treinar investigadores e investigadoras das novas gerações que tenham a mesma paixão. No futuro, talvez me aventure a escrever divulgação científica para públicos não especializados, mas sem pressa.
A série “À Conversa com um Ecológo” é uma parceria entre a revista Wilder e a Sociedade Portuguesa de Ecologia (SPECO). Serão vários os investigadores portugueses, de todas as idades, que vão estar aqui a explicar o que fazem e o que é a Ecologia. Para celebrar o Dia da Ecologia, que se comemora em Setembro. Recorde os os testemunhos de Filipa Coutinho Soares, Mário Santos, Susana C. Gonçalves, Zara Teixeira, Maria Amélia Martins-Loução, Carlos Vila-Viçosa e Hélia Marchante.