Neste novo artigo da série “Abra espaço para a natureza”, Carine Azevedo abre-nos um novo mundo de possibilidades para criarmos e aproveitarmos um espaço verde com os mais novos. Vale tudo, mesmo uma pequena varanda.
As crianças passam demasiado tempo agarradas aos dispositivos digitais. Por isso, é fundamental proporcionar-lhes oportunidades para explorar e aprender na natureza. As experiências ao ar livre, como a simples observação de insetos polinizadores e a descoberta de aromas e cores, estimulam a curiosidade natural e o respeito pelo ambiente.
Um jardim educativo pode ser uma forma poderosa de incentivar as crianças a deixar os equipamentos eletrónicos de parte, para saírem e explorarem o ar livre e ligarem-se com o meio ambiente natural local. Nestes espaços verdes, podem aprender sobre biodiversidade, sustentabilidade e a importância da conservação da natureza, ao mesmo tempo que se divertem.
A chave para criar um jardim educativo e dedicado aos mais novos está na diversidade de experiências que este oferece. Neste artigo, vou partilhar algumas ideias para tornar o jardim mais cativante e estimulante para os mais novos.
Áreas temáticas
Dividir o jardim em diferentes áreas temáticas permite criar ambientes específicos que estimulam a curiosidade das crianças. Cada área pode ser projetada com plantas e elementos que enfatizam um aspeto sensorial ou educativo, proporcionando um espaço diversificado para exploração e aprendizagem ao ar livre.
- Plantas nativas como a esteva (Cistus ladanifer), a urze (Calluna vulgaris), o medronheiro (Arbutus unedo), o azevinho (Ilex aquifolium), a estevinha (Cistus salviifolius) e outras oferecem uma variedade de texturas interessantes para as crianças explorarem através do toque e da observação.
- A anémona (Anemone coronaria), a giesta-amarela (Cytisus scoparius), o lírio-de-amor-perfeito (Iris planifolia), a roselha (Cistus crispus), o lírio-amarelo (Iris pseudacorus), a bonina (Bellis perennis), a erva-de-são-roberto (Geranium robertianum), a cila (Scilla monophyllos), a tulipa-brava (Tulipa sylvestris), a violeta-brava (Viola riviniana) e a papoila (Papaver rhoeas) proporcionam cores vibrantes e atrativos visuais que estimulam a imaginação das crianças e tornam o ambiente mais acolhedor.
- O rosmaninho (Lavandula stoechas), o alecrim (Salvia rosmarinus), o tomilho (Thymus spp.), a erva-cidreira (Melissa officinalis), as mentas (Mentha spp.), a flor-de-mel (Lobularia maritima) e a perpétua-das-areias (Helichrysum stoechas), são alguns exemplos de plantas que oferecem aromas relaxantes e agradáveis, criando uma experiência sensorial enriquecedora para as crianças enquanto aprendem sobre o cultivo e o uso dessas plantas.
Incluir plantas com diferentes texturas, aromas e cores estimula os sentidos e incentiva a aproximação com a natureza desde cedo, promovendo o respeito pelo ambiente e pela biodiversidade local.
Atividades interativas
Além de criar áreas temáticas diversificadas, também podem incluir-se atividades interativas no jardim para encorajar as crianças ao exercício físico e promover a exploração, a descoberta e a aprendizagem. Estas atividades são fundamentais para desenvolver habilidades motoras, cognitivas e emocionais:
1. Observação da vida selvagem
Guiar as crianças na observação de insetos polinizadores como abelhas e borboletas que visitam as flores do jardim ensina-as sobre a importância da polinização, mas também permite que as crianças vejam de perto a interação entre plantas e animais.
A criação de um ambiente acolhedor com plantas para atrair a vida selvagem pode ser motivador para que as crianças explorem cada recanto do jardim. Construir pequenos abrigos para insetos ou pássaros usando materiais naturais encontrados no próprio jardim, como ramos, folhas secas e pedras, ajuda-as a compreender a importância de fornecer habitats para a vida selvagem, mas também incentiva a criatividade. Estes projetos práticos são divertidos e, ao mesmo tempo, ajudam a educar sobre ecologia e sustentabilidade.
2. Plantar e cuidar
A participação das crianças na sementeira e na plantação de novas plantas no jardim, com explicações sobre o processo desde a preparação do solo até ao cuidado regular das plantas, ajuda-as a aprender sobre as necessidades específicas de cada planta e a importância de cuidar do ambiente em que vivem. Plantas como a flor-de-mel (Lobularia maritima), o tomilho (Thymus spp.) e a hortelã (Mentha spp.) são fáceis de cultivar e mantêm o interesse das crianças devido aos seus aromas e usos culinários.
A criação de uma pequena horta, onde as crianças podem colher e provar os frutos, os vegetais e as flores que ajudaram a cuidar, ajuda-as a aprender sobre a origem dos alimentos, a importância da agricultura e também serve como uma recompensa pelo seu trabalho na hora da colheita.
A integração de práticas de compostagem para ensinar sobre a reciclagem de resíduos orgânicos e a importância do ciclo de nutrientes na natureza ajuda as crianças a aprender como é que resíduos orgânicos, como as cascas da fruta e dos vegetais, e as folhas caídas das árvores e dos arbustos, podem ser transformados num composto rico para as plantas crescerem.
3. O jardim e as estações do ano
Ver como as plantas do jardim mudam ao longo do ano é uma atividade educativa fascinante. Observar a floração e a germinação de novas plantas na primavera, o crescimento no verão, a mudança das cores no outono e a dormência no inverno são atividades que ajudam as crianças a compreender o ciclo natural da vida das plantas e a sua adaptação às diferentes estações. Esta experiência permite-lhes compreender o ritmo natural e como as plantas se ajustam às variações climáticas sazonais.
A exploração das mudanças que ocorrem ao longo das estações também proporciona uma oportunidade para discutir as alterações climáticas e os seus efeitos no ambiente local. Por exemplo, as temperaturas mais elevadas na primavera podem afetar os períodos de floração das plantas, enquanto a alteração nos padrões de chuva influencia o crescimento e a saúde das mesmas. O jardim pode servir como um laboratório vivo onde as crianças podem testemunhar diretamente os impactos das atividades humanas no meio ambiente. Esta experiência promove um entendimento mais profundo da importância da sustentabilidade e incentiva a práticas que ajudem a conservar a biodiversidade local.
4. Brincadeiras criativas
Criar um espaço no jardim que seja tranquilo e acolhedor, onde as crianças possam simplesmente sentar-se para ouvir uma história, por exemplo, permite que elas se conectem com os elementos naturais ao seu redor: o ar puro que respiram, o som dos pássaros a chilrear, os aromas das flores e a brisa que acaricia a pele, enriquecendo o seu entendimento sobre o ambiente e incentivando a um maior respeito pela natureza.
Espaços equipados com materiais naturais como troncos, pedras e areia estimulam a criatividade. Estes espaços não estruturados permitem que as crianças experimentem livremente e desenvolvam habilidades de resolução de problemas, colaboração e imaginação enquanto brincam num ambiente natural.
Utilizar troncos e pedras para criar pequenos percursos e desafios físicos é uma boa maneira de integrar a atividade física no jardim. Elementos como escadas de troncos, pontes de madeira e pequenos túneis naturais incentivam o movimento, a atividade física e estimulam a imaginação e a criatividade das crianças.
Planeamento, manutenção e sustentabilidade
Um jardim destinado à diversão das crianças não se constrói apenas com atividades e estruturas. O planeamento deve ser cuidadoso desde o início, e embora a planificação seja semelhante a qualquer outro jardim, é necessário considerar alguns aspetos:
- Segurança: É fundamental certificar que o espaço é seguro, livre de produtos químicos perigosos e com superfícies adequadas para brincadeiras.
- Escolha das Plantas: Deve optar-se por plantas nativas, atrativas e de fácil cultivo.
- Tamanho do espaço: O jardim pode variar, desde um pequeno canteiro até uma área maior, dependendo da disponibilidade e do contexto urbano ou rural. Até um vaso pode ser visto como um jardim.
- Tema do Jardim: Pode ser um jardim de borboletas, um jardim sensorial, um jardim de ervas para cozinhar, ou até um jardim com várias áreas temáticas, consoante a área disponível.
- Identificação de plantas: Usar placas ou etiquetas para identificar e ajudar a que aprendam os nomes das plantas.
- Experiências simples: Semear plantas anuais em diferentes condições de solo ou luz, para aprender sobre o crescimento das plantas.
- Cuidados de manutenção: Ensinar sobre a importância de remover ervas daninhas, da rega regular e como observar sinais de saúde nas plantas.
- Tempo ao ar livre: Incentivar as crianças a passarem tempo no jardim diariamente, observando as mudanças ao longo das estações.
Ao criar um jardim que combina educação, diversão e sustentabilidade, estamos a proporcionar um espaço lúdico para as crianças, mas também a fortalecer o vínculo das crianças com a natureza. Estaremos a cultivar plantas e a “cultivar” uma geração de cuidadores conscientes, que valoriza e protege o meio ambiente, e são apaixonados pela natureza. Além disso, um jardim para crianças pode fortalecer laços familiares, promover uma alimentação saudável e desenvolver habilidades sociais ao trabalharem em equipa.
Em Portugal, temos a sorte de contar com uma variedade impressionante de plantas nativas perfeitas para integrar neste tipo de jardim, proporcionando um verdadeiro mergulho na biodiversidade local e uma oportunidade única para as crianças explorarem e aprenderem na natureza.
Então, mãos à obra! Vamos abrir espaço para a natureza para que as crianças explorem, aprendam e se divirtam no jardim!
Na série “Abra espaço para a natureza” encontrará mais alguma informação que ajudará na escolha das espécies e nos cuidados a ter com as suas plantas. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas”, irá encontrar um vasto leque de espécies nativas que se poderão adequar às diferentes condições do seu jardim.
Aproveite para partilhar as fotos do seu jardim nas redes sociais com #jardimtemático e no Instagram, comigo (@biodiversityinportuguese) e com a Wilder (@wilder_mag).
Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas.
Para acções de consultoria, pode contactá-la no email [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.