Num mundo cada vez mais urbanizado, onde os espaços naturais desaparecem a um ritmo preocupante, os jardins assumem um papel central. Muito mais do que espaços decorativos, os jardins são pontos de encontro entre o ser humano e a natureza, promovendo o bem-estar, proporcionando refúgio à vida selvagem e contribuindo para o equilíbrio e a revitalização dos ecossistemas locais.
No entanto, a beleza dos jardins não se limita aos grandes espaços exteriores. As varandas, janelas e até as plantas no interior das casas também podem fazer a diferença. Mesmo nos espaços mais pequenos, é possível cultivar a natureza em ambientes urbanos.
Este texto é um convite para refletir sobre o papel dos jardins nas nossas vidas e sobre como podemos abrir espaço para a natureza — independentemente do lugar ou do tamanho do espaço disponível.
Jardins: Ecossistemas em miniatura
Os jardins são mini-ecossistemas. Muito mais do que simples conjuntos de plantas, são espaços vivos onde a vida se manifesta de formas variadas e surpreendentes. As flores fornecem néctar e pólen aos polinizadores e a outros insetos úteis que também encontram refúgio entre as folhas e os ramos das plantas. Os arbustos e as árvores oferecem abrigo a aves e a pequenos mamíferos e o solo sustenta um mundo invisível de microrganismos, onde também os fungos e as minhocas trabalham incansavelmente para devolver os nutrientes ao solo, mantendo o jardim num estado contínuo de renovação.
Cultivar um jardim, por mais pequeno que seja, é uma forma de contribuir para a recuperação do equilíbrio ambiental das cidades. Com gestos simples, como plantar espécies nativas ou flores que atraem borboletas, abelhas e outros polinizadores, como abordei no meu texto “Como criar um jardim para borboletas”, ou ainda criando pequenos refúgios para a vida selvagem, seguindo as dicas de “Como criar um jardim para a vida selvagem”, transformam-se os espaços verdes em verdadeiros aliados da biodiversidade.
As sebes de jardim, além de fornecerem privacidade, são elementos decorativos que apoiam a vida selvagem, atraindo pássaros e outros animais. Saiba mais no artigo que dediquei às sebes de jardim “Sebes de jardim: um elemento decorativo amigo da vida selvagem”.
Além disso, os jardins podem ser um excelente recurso educativo. Para crianças e adultos, observar o ciclo da vida – desde a germinação de uma semente até à queda das folhas, ou ainda o voo de uma borboleta e a forma com a chuva cai no solo – é uma oportunidade única para compreender a importância de preservar o ambiente. Para os mais novos, um jardim pode ser um espaço ideal para aprender sobre a natureza de forma prática e divertida, proporcionando oportunidades de exploração e descoberta. Descubra o que precisa de fazer para criar um espaço amigo dos mais pequenos no artigo “Como criar um jardim para crianças”.
É uma excelente maneira de envolver os miúdos e crescidos no cuidado do mundo natural. Quando este cuidado se estende a espaços públicos verdes, criam-se corredores verdes que beneficiam a comunidade, melhoram a qualidade de vida e contribuem significativamente para a sustentabilidade das cidades.
Os jardins são muito mais do que simples áreas verdes. Lembram-nos que somos parte de um ecossistema interdependente e que, ao cuidar da natureza, estamos a cuidar de nós mesmos.
Ver a natureza que nos rodeia
No ritmo acelerado do quotidiano, é fácil ignorar a presença subtil da natureza à nossa volta. Contudo, ao criar um espaço verde, por mais modesto que seja, abrimos caminho para desacelerar, contemplar e redescobrir aquilo que muitas vezes passa despercebido.
A contemplação é um ato simples de parar, observar e sentir: a luz a atravessar as folhas, o som de uma abelha em movimento, o aroma das ervas aromáticas acabadas de tocar. Estes pequenos momentos, simples mas profundos, não são apenas prazerosos, são indispensáveis. Estudos comprovam que estar rodeado por plantas pode reduzir a ansiedade, melhorar o humor e até aumentar a capacidade de concentração.
Mas contemplar não é apenas olhar para fora. É também olhar para dentro. O simples gesto de colocar uma semente no solo e vê-la germinar é uma metáfora poderosa para o cuidado, a paciência e a esperança. Ao cultivarmos a natureza, cultivamos também a nossa própria resiliência e harmonia.
Transformar a relação com a natureza em algo consciente não requer grandes mudanças. Basta uma simples pausa para admirar o crescimento de uma planta, o que pode relembrar-nos de que, mesmo nos dias mais agitados, a natureza continua, persistente e generosa.
À janela e na varanda: ideias criativas para ter um jardim em casa
Não é necessário ter um grande jardim para usufruir dos benefícios da natureza. Seja numa varanda, numa janela ou mesmo dentro de casa, existem muitas formas de trazer a natureza para o nosso dia-a-dia. A chave está em adaptar as ideias ao espaço disponível e às necessidades de cada um.
- Na janela: um peitoril pode transformar-se numa mini-horta de ervas aromáticas, úteis na cozinha e para perfumar o ambiente, como o alecrim (Salvia rosmarinus), o cebolinho (Allium schoenoprasum), a erva-cidreira (Melissa officinalis), a flor-de-mel (Lobularia maritima subsp. maritima) e o rosmaninho (Lavandula stoechas). E é fácil ter um jardim de plantas aromáticas num apartamento. Se preferir um peitoril mais florido, além destas plantas pode também plantar boninas (Bellis perennis), urzes (Calluna vulgaris) e margaça-de-inverno (Chamaemelum fuscatum) e dessa forma alegrar mais a sua casa e atrair polinizadores.
- Na varanda: jardins verticais, vasos suspensos ou trepadeiras podem maximizar pequenos espaços e transformá-los em verdadeiros refúgios verdes. No meu texto “Como criar jardins verticais: uma solução criativa e sustentável para pequenos espaços” ensino a utilizar a verticalidade para criar mais verde em espaços pequenos e urbanos. Apostar em plantas nativas, mais resistentes ao clima local garante menor necessidade de manutenção e maior impacto positivo para a biodiversidade.
- No quintal: mesmo num pequeno jardim, é possível optar por plantas multifuncionais, como árvores frutíferas de pequeno porte ou arbustos floridos ou um prado vibrante de flores silvestres para atrair polinizadores e ser amigo da vida selvagem. O meu texto “Como transformar o seu relvado num prado florido e sustentável” pode ser um bom ponto de partida para quem desejar criar um espaço ecológico que valorize a biodiversidade.
- Dentro de casa: as plantas de interior, como fetos, lírios-da-paz ou suculentas, não só decoram como também purificam o ar e criam ambientes mais tranquilos e saudáveis. Saibam mais no texto “Como é que as plantas podem purificar o ar e controlar a humidade dentro de casa?”, onde ajudo a entender os benefícios das plantas no interior da casa.
Pode também optar por ter plantas insetívoras dentro de casa. Além de criar um ambiente mais exótico, essas plantas ajudam a controlar os insetos indesejados. Saiba mais no texto “Como ter um jardim num apartamento: plantas carnívoras”. O texto “Como usar plantas para afastar mosquitos e outros insetos” também é uma excelente leitura, oferecendo sugestões práticas de plantas funcionais e decorativas para afastar os insetos indesejados.
Repensar os espaços verdes no quotidiano é um exercício de criatividade. Não importa o tamanho do espaço, mesmo um único vaso pode ser o início de uma relação renovada com a natureza.
Abrir espaço para a natureza é abrir espaço para a vida. Cada planta, cada jardim, tem o poder de melhorar o ambiente e promover a biodiversidade. Cuidar de uma planta ou de um pedaço de terra é um ato simples, mas significativo, que contribui para algo maior. Seja na janela, na varanda ou num grande jardim, cada gesto verde é um acto de cuidado e transformação. Ao integrar a natureza no nosso dia-a-dia, estamos a criar espaços mais sustentáveis e a garantir um futuro melhor para todos.
Na série “Abra espaço para a natureza” terá acesso a mais temáticas que podem ajudar a aprofundar o conhecimento e a prática. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas”, vai encontrar um vasto leque de espécies nativas que se podem adequar às diferentes condições do seu jardim.
Como o Natal está a chegar, não se esqueça de que também pode celebrar esta época com plantas nativas, seja através da escolha de uma árvore de Natal sustentável, ou decorando a sua casa com plantas que traga do jardim, com um toque de verde natural que pode ser tanto bonito quanto ecológico.
A época do Natal é uma excelente oportunidade para refletir sobre como podemos integrar as plantas nativas de forma decorativa e consciente. Ao optar por plantas que são típicas da região, contribuímos para a preservação da biodiversidade e para a criação de um ambiente mais sustentável. Não é necessário recorrer a decorações artificiais ou importadas, quando podemos encontrar beleza nas plantas nativas que já fazem parte da nossa paisagem natural.
Aproveite para partilhar as fotos da sua árvore de natal e das suas decorações nas redes sociais com #jardimtemático #celebraronatalcomplantasnativas e no Instagram, comigo (@biodiversityinportuguese) e com a Wilder (@wilder_mag).
Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas.
Para acções de consultoria, pode contactá-la no email [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.