Neste novo artigo da série “Abra espaço para a natureza”, Carine Azevedo dá dicas de que plantas escolher, de como preparar o solo para criar prados floridos e de como os manter.
Transformar um relvado convencional num prado florido está a tornar-se uma escolha cada vez mais comum entre os entusiastas de espaços verdes. Esta transformação reduz a manutenção e o consumo de água, promove a biodiversidade e cria habitats essenciais para a vida selvagem.
Em tempos de crescente urbanização e mudanças climáticas, os prados oferecem uma alternativa sustentável e ecológica tanto em jardins privados como em espaços urbanos.
Quais os benefícios de transformar um relvado num prado florido?
Os relvados tradicionais exigem cortes frequentes, consumo elevado de água e, muitas vezes, o uso de fertilizantes e herbicidas que prejudicam o ambiente.
Por outro lado, os prados floridos requerem muito menos manutenção e oferecem uma beleza natural durante todo o ano. São ecossistemas ricos em biodiversidade, atraindo polinizadores como abelhas e borboletas, proporcionando abrigo a pequenos mamíferos e ajudando a regenerar o solo.
Transformar o seu relvado num prado não significa abdicar de um espaço bonito e organizado. Pelo contrário, pode criar um prado vibrante, adaptado às condições do espaço disponível e que evolui ao longo das estações. Na primavera e no verão, as flores silvestres florescem, criando uma explosão de cores. No outono, os caules secos e as sementes fornecem alimento a aves e outros animais enquanto que, no inverno, a beleza do prado reside nas plantas perenes e nas texturas dos caules secos.
Prados de baixa manutenção: beleza natural com o mínimo de esforço
Os prados destacam-se pela sua baixa manutenção. Ao contrário dos relvados, que necessitam de cortes regulares e regas frequentes, os prados podem ser cortados apenas uma ou duas vezes por ano. Este corte, realizado no final da primavera e no outono, controla o crescimento excessivo e permite que as plantas perenes prosperem.
As misturas de semente para prados podem incluir uma variedade de plantas silvestres, tanto nativas quanto exóticas.
As espécies nativas são especialmente valorizadas, pois são mais resistentes à seca e ao calor, além de estarem bem adaptadas ao clima local e às condições climáticas adversas. Essa melhor adaptação contribui para uma menor necessidade de cuidados e rega, tornando o prado uma escolha sustentável e económica.
Ao optar por uma mistura de plantas que florescem em diferentes estações, garante-se um prado sempre atrativo e interessante, ao mesmo tempo que se contribui para o ambiente.
Os prados não estão limitados a zonas rurais ou a espaços privados. Nas cidades, podem ser uma solução inovadora para criar áreas verdes sustentáveis. Substituir relvados em parques e jardins urbanos por prados reduz os custos de manutenção, promove a biodiversidade, e melhora a qualidade de vida dos habitantes.
Cidades como o Seixal, Lisboa, Guimarães, Lousada e Coimbra já demonstram o sucesso desta iniciativa, ao implementarem prados floridos em espaços públicos, contribuindo para a beleza natural e
a sustentabilidade nas cidades.
Além disso, os prados urbanos ajudam a mitigar as “ilhas de calor”, a absorver dióxido de carbono e a melhorar a gestão da água da chuva, prevenindo inundações. Assim, ao criar prados em áreas urbanas, as cidades tornam-se mais ecológicas e resilientes às mudanças climáticas.
Como criar um prado de flores silvestres no seu jardim
Criar um prado de flores silvestres é simples, mas requer alguns cuidados com o solo e a escolha das espécies. Aqui ficam os principais passos para garantir um prado florido, duradouro e de baixa manutenção.
Escolha das plantas: A escolha de plantas nativas é fundamental para o sucesso de um prado, pois estão melhor adaptadas às condições locais. Estas espécies promovem a biodiversidade e garantem um prado visualmente atrativo e sustentável. Em Portugal, existem várias plantas silvestres adequadas para prados, que florescem ao longo do ano, como:
- Bonina (Bellis perennis)
- Trevo-vermelho (Trifolium pratense)
- Flor-de-mel (Lobularia maritima)
- Serralha (Sonchus oleraceus)
- Língua-de-ovelha (Plantago lanceolata)
- Erva-das-sete-sangrias (Glandora prostrata)
- Rosmaninho (Lavandula stoechas)
- Rabo-de-lebre (Lagurus ovatus)
- Flor-de-ouro (Bellardia trixago)
- Esteva (Cistus ladanifer)
- Junco-solto (Juncus effusus)
- Macela-de-São-João (Achillea ageratum)
- Papoila (Papaver rhoeas)
- Saudades-roxas (Scabiosa atropurpurea)
- Centáurea-parda (Centaurea pullata)
- Estevinha (Cistus salviifolius)
- Margarida (Leucanthemum vulgare)
- Trovisco-macho (Euphorbia characias subsp. characias L.)
- Morganheira-das-praias (Euphorbia paralias)
- Verbasco-das-varas (Verbascum virgatum)
- Tremoceiro-amarelo (Lupinus luteus)
- Malva-de-três-meses (Malva trimestris)
- Pampilho (Coleostephus myconis)
Preparação do solo: Antes de semear, é necessário preparar adequadamente o solo. O primeiro passo é remover o relvado existente e as ervas daninhas. De seguida, deve-se descompactar o solo para melhorar a drenagem e a circulação de ar. Os prados prosperam em solos relativamente pobres, por isso não é necessário adicionar grandes quantidades de nutrientes. Por outro lado, os solos excessivamente ricos podem favorecer o crescimento de outras plantas, que podem competir com as espécies do prado. Contudo, se o solo estiver muito compacto ou for excessivamente pobre, pode-se adicionar uma pequena camada de composto natural para melhorar a estrutura e a capacidade de retenção de água, sem o tornar demasiado nutritivo.
Sementeira: A época ideal para semear o prado é no outono ou no início da primavera, quando as
condições de temperatura e humidade são mais favoráveis para a germinação das sementes.
O processo de sementeira passa por espalhar as sementes uniformemente sobre o solo previamente preparado, garantindo que a mistura de espécies seja bem distribuída. Após espalhar as sementes, é necessário pressioná-las ligeiramente sobre o solo, utilizando um rolo de jardim ou até com os pés, sem as enterrar demasiado, pois precisam de luz para germinar. Uma leve cobertura com solo ou substrato pode ser suficiente para proteger as sementes do vento e das aves. Para evitar que as aves comam as sementes, pode-se utilizar redes ou coberturas leves nas áreas recém-semeadas.
Em seguida, deve-se regar cuidadosamente. Regar logo após a sementeira ajuda a assentar as sementes no solo e a manter a humidade necessária para a germinação.
Utilizar um regador com chuveiro fino ou um sistema de rega suave é a melhor opção para garantir uma distribuição uniforme da água, evitando deslocar as sementes. É importante garantir que as sementes não sejam arrastadas durante a rega, pois isso pode resultar numa distribuição desigual das sementes sobre o terreno, impedindo até que algumas sementes germinam corretamente. Além disso, se as sementes forem movidas para camadas mais profundas do solo, podem não receber a luz necessária para a germinação.
É igualmente importante evitar o encharcamento do solo, pois o excesso de água pode causar o apodrecimento das sementes e das primeiras raízes que se formam. O solo encharcado reduz a quantidade de oxigénio disponível, o que pode comprometer o crescimento saudável das plantas.
A germinação pode levar algumas semanas, dependendo da espécie e das condições climáticas. Os primeiros sinais de crescimento podem não ser imediatos. Seja paciente, pois um prado silvestre pode levar até um ano para atingir o seu pleno desenvolvimento.
Manutenção: Nos primeiros anos, é fundamental monitorizar e controlar plantas que possam competir com as espécies do prado. À medida que o prado se estabiliza, a manutenção diminui significativamente. Um corte no final da primavera, após a floração, e outro no final do outono, são suficientes para manter o prado saudável e promover novas florações no ano seguinte. Além disso, é importante deixar uma área do prado sem corte, de modo a proporcionar abrigo e alimento à vida selvagem durante o inverno.
Durante as primeiras semanas após a sementeira é importante manter o solo húmido, especialmente se houver pouca chuva.
Transformar o relvado num prado florido é uma decisão ecológica que alia beleza, sustentabilidade e conservação da biodiversidade. Além de exigir menos manutenção, um prado florido beneficia o ambiente, criando habitats para polinizadores e outras espécies. Seja num jardim privado ou num ambiente urbano, os prados são uma solução criativa e prática para quem deseja abraçar a natureza de forma harmoniosa e duradoura.
Na série “Abra espaço para a natureza” encontrará mais alguma informação que ajudará na escolha das espécies e nos cuidados a ter com as suas plantas. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas”, irá encontrar um vasto leque de espécies nativas que se poderão adequar às diferentes condições do seu jardim.
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Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas.
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