Migrações: Joana e a sua equipa estão a seguir 15 abelharucos por GPS

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Entre Junho e Julho, nas vésperas dos coloridos abelharucos partirem para África nas suas migrações outonais, Joana Costa e a sua equipa marcaram 15 aves numa das três colónias de nidificação que acompanharam. A Wilder quis saber como correu a monitorização de 2024 a esta espécie.

Nesta altura do ano há um vai-vem de aves, numa azáfama para chegarem aos locais onde escolheram passar os meses mais frios. Umas chegam a Portugal e outras já se foram embora (e depois há as que estão apenas de passagem, parando por aqui apenas para descansar).

Abelharucos. Foto: Joana Costa

Os abelharucos (Merops apiaster), aquelas aves que mais parecem pertencer aos trópicos de tão coloridas que são, estão entre as espécies que já partiram para passar o Inverno em África, a Sul do deserto do Saara. Só as voltaremos a ver na Primavera, lá para Abril.

Mas antes de se irem embora, Joana Costa, investigadora da Universidade de Aveiro, coordenou, no âmbito do seu pos-doc, uma campanha para monitorizar as viagens destas aves em três colónias em Idanha-a-Nova, Constância e Abrantes. Estas campanhas acontecem desde 2015 e estiveram suspensas em 2021 e 2022, tendo sido retomadas em 2023.

“O que fizemos este ano foi um bocadinho o seguimento do trabalho que tem sido feito desde 2015, quando começámos a estudar esta espécie em Portugal”, explicou a investigadora à Wilder.

“O nosso objetivo principal tem sido estudar a migração, fenologia e ecologia reprodutora do abelharuco. Este ano, especificamente, quisemos perceber se fatores como data de postura, idade dos adultos, número de ajudantes (aves que não se reproduziram, mas que ajudam a alimentar as crias de um casal) ou uso do habitat influenciam o sucesso reprodutor”, acrescentou.

Medições de um abelharuco. Foto: Joana Costa

Para isso “fizemos captura-marcação-recaptura de abelharucos adultos nas colónias de nidificação, quantificámos o número de crias voadoras por ninho e colocámos dispositivos GPS em 15 indivíduos”. 

Na campanha deste ano, os investigadores conseguiram capturar 131 abelharucos, 23 dos quais foram recapturas do ano passado, ou seja, aves que foram marcadas o ano passado e este ano regressaram à mesma colónia.

Colocação de um dispositivo GPS num abelharuco. Foto: Joana Costa

Segundo Joana Costa, esta foi a primeira vez que a equipa colocou GPS nos abelharucos, da colónia de Abrantes, em vez dos habituais geolocalizadores. E explica porquê. “Colocámos GPS em 15 aves para perceber que habitats utilizam os abelharucos adultos ao longo da época de alimentação das crias e se essa utilização do habitat se traduz em diferenças no sucesso reprodutor. Além disto esperamos que algumas das aves marcadas com GPS regressem para o ano às mesmas colónias de forma a podermos recolher informação detalhada dos seus movimentos durante o período não reprodutor.”

Ao longo de quase 10 anos de estudo dos abelharucos já há muito que se sabe sobre a migração destas aves espantosas.

Abelharucos. Foto: Joana Costa

Por exemplo, “sabe-se que a população que nidifica em Portugal passa o inverno na África Ocidental (entre o Senegal e a Nigéria)”, diz Joana Costa.

Também se sabe que os abelharucos “abandonam as colónias assim que as crias saem do ninho e partem para África entre finais de Julho e Agosto. A sua viagem dura em média 29 dias, mas pode ser tão rápida como 9 dias ou lenta como 58 dias, varia muito de indivíduo para indivíduo”. 

Abelharuco no ninho. Foto: Joana Costa

Partem dos locais de invernada em Março e chegam novamente a Portugal a partir de Abril.

“Os abelharucos tendem a ser mais rápidos na migração de Primavera. As primeiras aves a partirem da zona de invernada têm maior probabilidade de chegar mais cedo à colónia de nidificação, iniciar a postura mais cedo e consequentemente produzir mais crias. Vemos então aqui uma cascata de efeitos entre o período não reprodutor e reprodutor, evidenciando que as condições experienciadas numa época podem afetar a seguinte.”

Abelharuco a sair do ninho. Foto: Joana Costa

Joana Costa sublinha que “estes dados salientam a importância de aprofundar o conhecimento sobre esta espécie de forma a identificar quais são os fatores, tanto em África como em Portugal, que poderão estar a moldar a sua demografia”.

Actualmente, o abelharuco tem estatuto de conservação Pouco Preocupante, segundo a Lista Vermelha das Aves de Portugal. “Distribui-se de norte a sul do território continental. No entanto, nas regiões Norte e Centro ocorre essencialmente no interior, distribuindo-se de forma mais generalizada no sul do país”, segundo esta Lista Vermelha.

Joana Costa e a equipa espera agora que “algumas aves marcadas com GPS regressem às mesmas colónias de nidificação para podermos fazer o download dos dados. Isto irá permitir obter informação detalhada dos movimentos dos indivíduos nas zonas de invernada”.

Abelharuco. Foto: Joana Costa

“Penso que estudar o uso do habitat nas zonas de invernada, em África, é um dos nossos objetivos futuros, assim como obter mais detalhes sobre a migração, por exemplo se fazem paragens, onde e de quanto tempo. Além disso, interessa-me bastante a temática das alterações climáticas e gostava de estudar como é que esta espécie se vai adaptar aos verões cada vez mais quentes e secos da Península Ibérica.”


Uma pergunta a Joana Costa: Porque considera estas aves incríveis?

Joana Costa: Os abelharucos são aves incríveis por muitas razões. Por exemplo, pelas longas distâncias que percorrem e a sua capacidade de prosperar tanto num clima quente, como é o caso do sul da Península Ibérica, ou num clima mais continental e frio, como na Alemanha onde estão em expansão. Acho extraordinário e muito interessante também o seu comportamento social. Por exemplo sabe-se que podem escolher passar o ano inteiro com os mesmos companheiros ou trocar de grupos a meio da migração ou invernada. Além disso são de uma resiliência enorme, escavam os ninhos em barreiras muitas vezes a grande profundidade (o túnel mais longo que registei tinha 2,20m) e é incrível como conseguem produzir descendência num microambiente tão inóspito.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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