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Joana vai descobrir a viagem dos abelharucos portugueses até África

16.07.2015

Todos os anos, os coloridos abelharucos (Merops apiaster) começam a chegar a Portugal com a Primavera, para nidificar e cuidar das suas crias. Mas quatro a cinco meses depois, entre Julho e Agosto, regressam a África para passar o Inverno. Joana Costa coordenou três campanhas de capturas destas aves para saber quais as suas rotas de migração e quais os locais exactos de invernada.

 

Para já, sabe-se que os abelharucos passam o Inverno “a Sul do deserto do Saara, possivelmente numa região da faixa tropical”, uma vez que há registos de observações, explica à Wilder Joana Costa, bióloga de 26 anos ligada à Universidade de Aveiro.

Todavia, salienta, “não sabemos exactamente para onde as nossas populações [de abelharucos] se deslocam dentro daquela região e qual a sua rota migratória”. É por isso que Joana está a fazer um doutoramento sobre as “consequências das estratégias migratórias e selecção de habitat numa espécie insectívora afro-paleártica”, sendo essa espécie o abelharuco.

Para conhecerem melhor por onde voam estas aves, Joana e um grupo de voluntários capturaram em Junho quase 100 abelharucos através de armadilhas montadas em ninhos, em três campanhas: duas numa colónia de abelharucos na região de Barrancos, no Alentejo (45 abelharucos) e uma terceira numa colónia em Idanha-a-Nova (48).

 

 

Durante os trabalhos foram colocados 60 geolocalizadores em abelharucos adultos. Estes aparelhos vão armazenar os dados de localização das aves. “Os abelharucos vão migrar para África e, através da informação recolhida pelos geolocalizadores, esperamos perceber melhor a sua rota migratória” e mais dados sobre os seus locais de invernada, acrescenta.

O objectivo, explica Joana, é contribuir para a conservação da espécie. “De que vale conservar o habitat dos abelharucos em Portugal, quando o seu habitat de invernada em África está a ficar debilitado?”.

No caso das aves migradoras, é importante trabalhar em rede para a conservação da espécie, e não apenas a nível local. As rotas seguidas pelas aves também importam, pois ao longo do caminho os abelharucos vão fazendo paragens para descansar e reabastecer energias, sublinha.

 

 

 

Depois, no próximo ano, Joana espera voltar a capturar esses abelharucos quando regressarem aos locais de nidificação em Portugal, o que costuma acontecer “se a época de reprodução tiver corrido bem e o local permanecer com todas as condições necessárias”. Será então que lhes vai retirar os geolocalizadores e descarregar essa informação para o computador, ficando a conhecer os locais por onde andaram.

A investigadora admite ainda que “existem algumas excepções, como casais que podem mudar de colónia. Este vai ser o verdadeiro desafio.”

Mas a colocação dos geolocalizadores não foi o único trabalho de campo, uma vez que a bióloga também pretende conhecer mais sobre a fenologia e dieta destes abelharucos. “Também se procedeu à contagem do número de juvenis de cada ninho e à recolha de egregópilas (restos de insectos não digeridos, regurgitados pelo indivíduo) para posterior análise da dieta”, conta.

Quanto aos juvenis, a equipa contabilizou 21 ninhos em Barrancos e 29 ninhos em Idanha. “Todos estes ninhos tinham juvenis a ser alimentados pelos progenitores. O número de juvenis mostrou-se bastante variável, entre um e três por ninho.”

 

 

Ao longo deste trabalho de campo, Joana observou também que os abelharucos adultos “esforçam-se por alimentar as crias ao longo de todo o dia, situando-se o pico de movimento na parte da manhã.”

Joana e o grupo que a acompanhou concluíram ainda que parecem existir abelharucos “mais desconfiados do que outros”, pois alguns não se deixavam capturar. E aperceberam-se de que os movimentos diários destas aves se vão alterando, à medida que a época reprodutora avança.

Na verdade, no final da campanha, “surgiram quase tantas perguntas como respostas”. E foi de surpresa, numa situação engraçada que aconteceu em Barrancos, que a bióloga se apercebeu de uma mudança no comportamento dos progenitores com as crias.

“Tínhamos preparado um método para capturar os abelharucos adultos quando saíssem dos ninhos, assim que o sol nascesse. Mas quando isso aconteceu, os abelharucos começaram a aparecer vindos do montado e não dos ninhos, ou seja, os progenitores já não passavam a noite com as crias”, relata à Wilder.

Para o próximo ano, quando os abelharucos regressarem de África, Joana Costa vai estar à espera, ansiosa por descobrir por onde andaram afinal estas aves de cores garridas, às quais é impossível alguém ficar indiferente.

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

Se quiser saber mais sobre esta espécie migratória, Joana Costa explica que esta é uma boa altura para observar abelharucos. Os primeiros “começam a chegar em finais de Março, início de Abril, e partem entre Julho e Agosto”, embora ocorram variações e anos atípicos. São mais fáceis de encontrar no Sul e Interior Centro do país.

Os abelharucos são “particularmente visíveis” durante a fase inicial de construção dos ninhos e de acasalamento e na fase de alimentação das crias, se se souber onde os procurar, mas é necessário ter muito cuidado, porque são aves muito sensíveis à perturbação durante a reprodução.

Pode ver, por exemplo, os abelharucos a alimentar as crias neste vídeo da correspondente da Wilder, Marta Ribeiro.

“É comum observá-los perto de barreiras de areia, barro ou argila, situadas à beira de rios ou ribeiras, ou até em barreiras junto à estrada ou areeiros abandonados. Podemos observá-los a perseguir insectos em áreas abertas ou pousados nos fios eléctricos ou ramos de árvores”, acrescenta a bióloga.

Outra forma boa de os localizar é pela sua vocalização, que utilizam para manter a coesão do grupo.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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