O que procurar no Outono: a azinheira

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Na semana em que se celebra o Dia da Floresta Autóctone, vou falar-vos de uma árvore típica da paisagem mediterrânica que por esta altura se encontra em plena frutificação: a azinheira (Quercus rotundifolia).

A azinheira – também conhecida como azinho, carrasco, sardão, carrasca, azinheira-de-bolota-doce, ou sardoeira – é uma espécie da família Fagaceae, a que pertencem inúmeras espécies nativas da floresta portuguesa, como o sobreiro (Quercus suber), os carvalhos (Quercus spp.), a faia (Fagus sylvativa) e o castanheiro (Castanea sativa).

A família Fagaceae está representada um pouco por todo o mundo por oito géneros botânicos, sendo o mais expressivo o género Quercus, a que pertence a azinheira, com cerca de 460 espécies botânicas aceites. Em Portugal são oito as espécies nativas representativas deste género. E há um exemplar que merece o nosso destaque.

Azinheira

A azinheira é uma árvore de porte médio, podendo atingir de 8 a 15 metros e, raramente, 20 a 25 metros de altura. Possui uma copa geralmente ampla e arredondada, tronco curto e tortuoso e casca acinzentada.

Azinheira. Foto: Xemenendura/WikiCommons

É uma espécie de crescimento lento e de elevada longevidade, podendo ultrapassar os 1000 anos.

A azinheira é uma espécie perenifólia – tem folha persistente -, mantém as folhas verdes durante todo o ano. A renovação das folhas ocorre de dois em dois ou de três em três anos, sem que a árvore fique despida.

As folhas são simples, espessas, coriáceas e possuem margem lisa ou espinhosa. A página superior das folhas é verde-escuro brilhante e a página inferior é coberta por um feltro esbranquiçado. Possuem pecíolo com 3 a 10 cm de comprimento e o limbo possui formas muito variáveis, desde ovado a elíptico. Esta variação da forma está dependente do indivíduo, da idade e do raminho de crescimento.

A floração ocorre na primavera, entre os meses de fevereiro e maio. Como é uma espécie monóica, as flores masculinas e femininas crescem na mesma árvore. As flores masculinas são amareladas, alaranjadas e por fim tornam-se pardas. Aparecem em grande quantidade, agrupadas em inflorescências – amentilhos suspensos – na extremidade dos ramos do ano.

As flores femininas são pequenas, peludas e desenvolvem-se em menor quantidade, sobre os rebentos do ano. Crescem de forma isolada ou em grupos de duas flores e são de cor avermelhada, mudando para cor de laranja com o avançar do tempo.

Foto: Luís Nunes Alberto/WikiCommons

Os frutos – glandes ou bolotas – formam-se a partir das flores femininas. São oblongo-cilíndricos, pontiagudos e glabros. Possuem uma cúpula protetora, em forma de dedal, coberta de pequenas escamas quase planas e tomentosas, que cobre menos da metade do fruto.

As bolotas amadurecem e caem no outono, entre outubro e dezembro, e perdem rapidamente a capacidade de germinar, não sendo fácil a sua conservação por muito tempo. Frutifica geralmente a partir dos 8-10 anos, mas só a partir dos 15 a 20 anos é que passa a uma frutificação regular e mais abundante.

Espécie tipicamente mediterrânica

A azinheira é originária do sul da Europa e está presente em quase toda a Bacia do Mediterrâneo.

Em Portugal é comum em todo o território, sobretudo em zonas com influência continental e mediterrânica, ou seja sobretudo nas regiões do interior e no sul, embora também possa encontrar-se na faixa do litoral, excepto em zonas de climas temperados do norte e centro litoral.

A azinheira pode encontrar-se em bosques e matagais de folha perene, em associação com outras espécies ou como espécie dominante, formando azinhais. No sul, onde é mais predominante, ocupa extensos povoamentos, formando os “montados de azinho”, muitas vezes em sistemas agro-florestais, como em pastagens ou em campos de cultivo agrícola, como as culturas de cereais, ou em povoamentos mistos com o sobreiro.

Foto: Ziegler175/WikiCommons

É uma espécie rústica e resistente, mas é sensível ao frio, ainda que tolere temperaturas mínimas até aos -3ºc.

É uma árvore heliófila, ou seja, de plena luz e intolerante ao ensombramento, que possui uma grande plasticidade ecológica. Também é classificada como uma espécie xerófila, estando adaptada a períodos de secura, mais ou menos prolongados, conseguindo viver com pequenas quantidades de águas.

É indiferente às condições edáficas, excepto em solos encharcados (com má drenagem), ou muito arenosos. Pode desenvolver-se em solos pobres, rochosos, pedregosos e esqueléticos, com pouca ou nenhuma humidade e é tolerante a qualquer tipo de pH. 

Árvore nobre

A azinheira é uma árvore nobre e tem um importante valor ornamental. É bastante tolerante à poluição urbana e a sua copa ampla e densa proporciona uma agradável sombra, sendo ideal para embelezar qualquer parque ou jardim, desde que lhe seja garantido espaço para que se possa desenvolver de forma natural, ainda que suporte intervenções de poda.

Graças à sua grande capacidade de germinação e de renovação através do cepo, é uma espécie muito resistente aos incêndios.

Os frutos da azinheira são considerados os de melhor qualidade entre as várias espécies do género Quercus, constituindo uma excelente fonte de alimento para os animais durante o outono e o inverno, sendo tradicionalmente utilizadas na alimentação dos porcos de montanheira.

As bolotas também são usadas na alimentação humana. Possuem um elevado valor nutricional e são ricas em fibras, proteínas e em compostos antioxidantes.

Apesar da sua utilização na alimentação humana ter decaído bastante nos últimos séculos, está a ser lentamente retomada, pois pode ser uma excelente alternativa nutricional para pessoas intolerantes ao glúten. Em algumas regiões, as bolotas são assadas, como as castanhas, ou misturadas com outros cereais para fazer farinha para pão.

A madeira de azinho é muito densa e compacta, resistente mecanicamente, além de ser bastante durável ao apodrecimento, no entanto deforma-se quando seca, e é difícil de trabalhar. É usada na construção, para o fabrico de pequenas peças de pavimentos – parquet, pois além da madeira apresentar “desenhos” que criam um belo efeito, também é muito rija, sendo resistente ao pisoteio, não sendo danificada pelos “saltos altos”.

É igualmente utilizada no fabrico de algumas peças de mobiliário e em peças para reboques, arados e outras ferramentas. Antigamente era usada em rodas de carros de bois e nas respectivas carroçarias e também na construção do cavername de naus e caravelas.

A madeira de azinheira possui um alto valor calorífico, sendo muito apreciada para carvão e lenha.

A casca, sobretudo dos exemplares mais jovens, possui uma grande quantidade de taninos, pelo que é muito apreciada no curtimento e tingimento de couro e outros materiais.

A azinheira também tem aplicações medicinais, pelas suas propriedades adstringentes. As folhas, frutos e casca são usados, na medicina popular, para tratar disenterias e diarreias.

Árvore protegida

A designação científica dada a esta espécie revela a imponência e beleza destas árvores. O termo genérico Quercus é o nome clássico, em latim dado aos carvalhos, azinheiras e sobreiro, uma planta sagrada para Júpiter e deriva do celta “Kaer-” e “-quer” que significa “bela árvore” ou “a árvore por excelência”. O termo rotundifolia deriva da combinação entre duas palavras: rotundos-, que significa “redondo ou esférico” e de –folius que significa “folha”, ou seja que tem “folha arredondada”.

A azinheira é uma espécie protegida em Portugal. A sua proteção justifica-se largamente pela sua importância ambiental e económica, já reconhecida na Lei de Bases da Política Florestal publicada em 1996 (Lei n.º 33/96, de 17 de Agosto).

O decreto-de-Lei n.º 169/2001, de 25 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 155/2004, de 30 de Junho, estabelece as medidas de proteção desta espécie, assim como do sobreiro. De entre as medidas constantes neste diploma, destaca-se a necessidade de pedido de autorização prévia ao ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas para proceder ao corte, arranque ou à poda de azinheiras e sobreiros.

Floresta autóctone

A floresta autóctone é uma floresta representada por espécies da flora nativa do próprio território, ou seja, que ocorre naturalmente ou de forma espontânea numa determinada região e que se encontra bem adaptada às suas condições edafo-climáticas.

As espécies que compõem a floresta nativa são geralmente mais resistentes a pragas e as doenças, podem suportar longos períodos de seca ou de chuva intensa, quando comparadas com as espécies exóticas, introduzidas no mesmo habitat.

As florestas autóctones são uma valiosa fonte de riqueza natural e de manutenção da biodiversidade. Exercem um papel fundamental na regulação e melhoria do clima, são excelentes sumidouros de carbono, favorecem a regulação do ciclo hidrológico e da qualidade da água, assim como promovem a formação e fertilidade dos solos.

Em Portugal, a floresta autóctone é representada pelos carvalhos, sobreiros, azinheiras, castanheiros, loureiros, azevinhos, faias, medronheiros e tantas outras espécies arbóreas, arbustivas, herbáceas, além dos muitos animais, fungos e outros seres vivos que a compõem. A floresta é muito mais do que árvores, é todo um ecossistema.

No mês em que se celebra a floresta autóctone e em que se fecha o concurso para apresentação de candidaturas para a Árvore Portuguesa do ano 2022, promovido pela União Florestal Mediterrânica (UNAC), é fundamental compreender a importância das árvores.

As árvores começam a vida como minúsculas plantas nascidas por semente, podendo acabar os seus dias como gigantes centenários. Muitas são as histórias que têm para contar, já passaram por muitas guerras e por períodos de paz mas, para que assim continuem, é necessário a sua preservação.

Azinheira secular do Monte Barbeiro. Foto: Nuno Sequeira/WikiCommons

Exemplo dessa resiliência é a Azinheira Secular do Monte Barbeiro (Mértola), com mais de 150 anos, que representou Portugal no concurso de Árvore Europeia em 2019, onde arrecadou o 3º lugar.

No entanto, a tendência populacional desta espécie tem vindo a decrescer nos últimos anos, é importante perceber que esta espécie contribui para a biodiversidade local, além de sustentar a economia dessas regiões.


Dicionário informal do mundo vegetal:

Perenifólia – de folha persistente ou folha perene. Árvore que mantém as folhas verdes ao longo de todo o ano, fazendo a sua renovação gradual sem que fique despida.

Coriácea – que tem uma textura semelhante à casca da castanha ou do couro.

Pecíolo – pé da folha que liga o limbo ao caule.

Limbo – parte larga de uma folha normal.

Ovada – folha com a forma de um ovo mais larga perto da base.

Elíptica – folha com forma que lembra uma elipse, mais larga no meio e com o comprimento duas vezes a largura.

Monóica – espécie que apresenta flores femininas e masculinas separadamente na mesma planta.

Inflorescência – forma com as flores estão agrupadas numa planta.

Amentilho – inflorescência semelhante a uma espiga, onde as flores, geralmente unissexuais, surgem agrupadas num eixo comum.

Cúpula – invólucro duro, em forma de taça, formado por numerosas e pequenas brácteas, que protege e envolve (totalmente ou parcialmente) a flor e o fruto, de algumas espécies arbóreas e arbustivas, nomeadamente da família Fagaceae.

Heliófila – planta que vive preferencialmente em locais de exposição solar plena. Necessita da luz solar para um bom desenvolvimento.

Xerófila – planta adaptada aos climas secos, a períodos de seca mais ou menos prolongada. Que consegue viver com pequenas quantidades de águas.  


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

Para acções de consultoria, pode contactá-la no mail [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.

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