Foto: Luís Cardoso

Luís Cardoso criou um guia fotográfico que nos dá a conhecer 65 borboletas de Penela

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Apaixonado pela ciência cidadã e pela natureza do concelho onde reside, no distrito de Coimbra, Luís falou à Wilder sobre o novo livro e como tem sido trabalhar neste projeto.

Foi no final de 2020 que Luís Cardoso, farto de estar confinado pela pandemia e por um apartamento na cidade, se mudou de Coimbra para uma casa no concelho de Penela – a uma curta distância de onde morava anteriormente, mas muito mais próximo da natureza e do campo, onde sempre tinha querido viver.

“Comecei a interessar-me por flores e orquídeas”, contou à Wilder este engenheiro informático, que em abril de 2022 lançou um projeto dedicado à biodiversidade de Penela na plataforma online Biodiversity4All – hoje, estão ali reunidas mais de 820 espécies registadas por mais de 140 observadores.

“A primeira coisa que comecei a fotografar e a identificar foram as orquídeas, mas comecei a reparar que havia borboletas nas flores, e também a identificá-las”, recordou. Passado algum tempo, ao juntar-se a um bioblitz – uma ação de ciência cidadã que junta cidadãos e cientistas no registo e identificação de diferentes espécies – Luís teve conhecimento dos Censos de Borboletas de Portugal e decidiu começar a participar. E foi assim que começou a fotografar e identificar cada vez mais borboletas e teve a ideia de juntá-las num guia dedicado a estes insetos no concelho de Penela.

Luís Cardoso é autor de todas as fotografias, tratou da informação e de toda a montagem gráfica. O livro foi estruturado em diferentes famílias com a ajuda de Eva Monteiro, coordenadora dos Censos de Borboletas de Portugal e membro do Tagis, uma ONG portuguesa dedicada à conservação dos insetos. Com apoio do município, foi possível avançar para a fase de impressão.

“Este guia é mais focado na fotografia e não tanto nos aspetos científicos e técnicos, pois o objetivo é pôr as pessoas a verem as diferentes espécies de borboletas”, explicou o autor à Wilder. “É uma espécie de inventário para termos noção de que espécies de borboletas diurnas existem no concelho.”

Após vários anos a percorrer a região de Penela, Luís tem noção de que este é um concelho dividido em geografias distintas, incluindo uma zona mais seca (Cumieira e Rabaçal), povoada por numerosas orquídeas silvestres, e uma zona de influência atlântica na serra do Espinhal, mais húmida e com as plantas características de solos onde abundam os xistos. O resultado é a existência de espécies de borboletas ligadas a habitats muito diferentes entre si. “Acredito que Penela será um dia reconhecido como o concelho com mais diversidade de borboletas do distrito de Coimbra, eventualmente da zona Centro”, afirma este naturalista, que quer “trazer mais à luz” um concelho que tem sido “um bocado ignorado”.

Por ali, descreve, é possível observar várias espécies de borboletas que estão nos limites das respetivas áreas de distribuição. É o caso da melanargia-mediterrânica (Melanargia ines), mais típica do sul do país mas que por vezes é encontrada mais acima. O problema é que além de ser rara nesta zona de Portugal, é também muito irrequieta e difícil de fotografar.

Melanargia-mediterrânica (Melanargia ines). Foto: Luís Cardoso

Em 2024, Luís Cardoso deparou com estas borboletas de asas axadrezadas, pretas e brancas, durante um passeio na freguesia da Cumeeira. “Como é mais rara, queria mesmo fotografar esta borboleta, mas quando as pessoas se aproximam, fogem logo.” Demorou uma hora para conseguir uma única boa fotografia da espécie, que figura agora neste novo guia.

Encontrar e fotografar outras borboletas menos comuns tem sido também “uma questão de sorte”. Foi o que aconteceu em abril passado com a verdinha-da-primavera (Tomares ballus). Luís deu de caras com esta espécie de lindas asas em tons violeta, laranja e azuis durante um passeio descontraído com a namorada. Uma boa surpresa. “Reparámos num prado muito bonito e percebi então que estava ali uma borboleta rara.” Graças a um atraso de alguns meses no seu projeto, conseguiu fotografá-la ainda a tempo de constar das páginas do novo guia. O lançamento aconteceu no final de maio passado, durante a feira do livro de Penela.

Verdinha-da-primavera (Tomares ballus). Foto: Luís Cardoso

À medida que for descobrindo e fotografando mais borboletas no concelho, é possível que Luís Cardoso faça nascer novas edições, a convidar a mais passeios em busca destes insetos de asas coloridas. Até lá, é possível acompanhar as suas descobertas naturalistas numa conta no Instagram, que é também a melhor forma de o contactar e pedir mais informações sobre este guia.

Três borboletas para procurar em Penela

Luís Cardoso sugere-lhe ainda três espécies de borboletas que fazem parte do livro Borboletas de Penela e que podemos procurar neste concelho do distrito de Coimbra, ou também noutros locais do país:

Borboleta-do-medronheiro (Charaxes jasius)

Foto: Luís Cardoso

Trata-se de uma “borboleta icónica”, descreve o autor do guia de borboletas de Penela, que lembra que a borboleta-do-medronheiro é a maior borboleta diurna da Europa. “É relativamente comum, mas a maioria das pessoas nunca a viu, pois só gosta de determinados locais e não é muito fácil de observar”. De facto, esta espécie costuma estar associada apenas a locais onde existem medronheiros, uma vez que as lagartas se alimentam em exclusivo das folhas deste arbusto. Luís Cardoso teve sorte e já as observou bem de perto. “Uma vez, uma parou no meu chapéu”, recorda, satisfeito.

Azulinha-do-tomilho (Pseudophilotes panoptes)

Foto: Luís Cardoso

Esta borboleta da família das Lycaenidae, por vezes conhecida como família das “azulinhas”, está associada a um habitat algo ameaçado, explica Luís Cardoso, uma vez que os tomilhais são cada vez mais difíceis de encontrar. Na zona de Penela, é possível observar o habitat desta espécie na zona da serra do Rabaçal, “associada a uma flora extremamente rica”.

Bela-dama (Vanessa cardui)

Foto: Luís Cardoso

“Quando está a migrar, em Penela há belas-damas por todo o lado.” É durante o mês de maio que é mais fácil observar esta viajante de longas distâncias, que todos os anos percorre milhares de quilómetros. “Acho-a muito interessante porque migra entre a Europa e África”, nota Luís Cardoso, que lembra que a bela-dama existe praticamente em todos os continentes.


Saiba mais.

Recorde uma entrevista dada por Luís Cardoso à Wilder no final de 2020, no mesmo ano em que se mudou para Penela e para mais perto da natureza.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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