As associações condenam o abate de centenas de árvores no distrito de Santarém para a instalação de parques solares. Projetos de centrais fotovoltaicas têm-se multiplicado por todo o país, destruindo habitats protegidos, alerta o Geota.
A Quercus foi alertada por populares para o abate de 200 sobreiros, árvore emblemática de Portugal e uma espécie protegida por lei, para a construção do mega Parque Solar Escalabis, numa área de 568 hectares nos concelhos de Santarém e Cartaxo. Este parque, de 189 MWp de potência total instalada, deverá produzir cerca de 390 GWh/ano com tecnologia fotovoltaica tradicional de painéis solares.
“O projeto do Parque Solar Escalabis foi alvo de Avaliação de Impacte Ambiental durante o período de isolamento da pandemia, razão pela qual está a gerar contestação social em localidades vizinhas, como o Casal de Além, no concelho da Azambuja”, recorda a associação em comunicado.
A Quercus lamenta a promoção do arranque de cerca de 200 sobreiros na área abrangida pelo projecto.
“Alertámos o SEPNA (Serviço de Protecção da Natureza) da GNR e questionámos a Direção Regional de Conservação da Natureza e das Florestas do ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) no passado dia 28 de fevereiro e estamos ainda a aguardar pelo esclarecimento, com o envio das autorizações do abate dos sobreiros”, explica aquela associação.
A Quercus pede à APA – Agência Portuguesa do Ambiente, enquanto autoridade de AIA do projeto em pós-avaliação da Central Solar Fotovoltaica Escalabis, promovida agora pela Escalabis, S.A., que “efetue uma auditoria detalhada sobre os incumprimentos ao estabelecido no projeto e os divulgue publicamente para o cabal esclarecimento dos responsáveis”.
A Quercus já tinha alertado para a problemática aprovação de parques fotovoltaicos em áreas florestais. Mas “os estudos têm viabilizado projetos insustentáveis que não deveriam ser aprovados, revelando a desregulamentação administrativa que contraria o ordenamento do território, assim como a falta de responsabilidade ambiental das empresas promotoras ao não procurarem áreas mais adequadas, como por exemplo as coberturas de edifícios industriais e residenciais”.
Também o Geota denunciou hoje o projeto de uma grande central fotovoltaica, em Casal da Valeira e Vale Pequeno, no concelho da Chamusca, que implica o abate de 675 sobreiros.
“O GEOTA participou na consulta pública e chumbou este projeto por considerar que é necessária uma análise custo-benefício correta de cada projeto e que o impacto ambiental desta ultrapassa os seus benefícios económicos”, defendeu em comunicado.
Esta associação diz ter sempre apoiado a aposta em energia solar. “Porém, a preservação da biodiversidade e respeito pelas comunidades locais sempre se sobrepôs e, ainda que se reconheça a necessidade de algumas grandes centrais, é fundamental reduzir os seus impactos negativos para as espécies e comunidades.”
“Há pouco tempo, já tinha sido licenciado o projeto da maior central solar da Europa, a central Fernando Pessoa, em Santiago do Cacém”, lembrou ainda. “Este projeto possui 1.200 hectares impossibilitando compatibilizar com quaisquer outras atividades no território e que vai implicar o corte de 1,5 milhões de árvores.”
“Com o argumento falacioso de que se trata de projetos “ambientais”, estes projetos de grandes centrais fotovoltaicas têm-se multiplicado por todo o país, em zonas protegidas de montado, de REN e RAN, com forte impacte ambiental, obrigando ao corte de milhares de sobreiros e de milhões de outros espécimes, destruindo habitats protegidos e impedindo a implantação de outras atividades económicas sustentáveis.”
Há projectos recentes de grandes centrais solares fotovoltaicas que provocaram o abate de centenas de sobreiros, azinheiras e carvalhos, ou que ainda aguardam o parecer do ICNF para o abate, nos concelhos de Gavião, Alenquer, Azambuja, Penamacor, Famalicão, Évora, Vendas Novas, Fundão e Santa Maria da Feira. Em causa está o abate de sobreiros, azinheiras e oliveiras. Num dos casos, no Fundão, está em causa “o abate de uma zona de carvalho negral, destruindo o habitat natural de uma comunidade de cegonhas brancas”.
“É fundamental conhecer os impactos de todas estas operações, contabilizar o total de sobreiros e azinheiras que estão a ser abatidos e pôr fim a este ataque ambiental.”
No entender do Geota, “a transição energética não pode ser feita à custa da destruição do ambiente”, nomeadamente da destruição de habitats insubstituíveis, de uma inutilização de solo fértil e da destruição de árvores protegidas.
“O Geota defende que há zonas artificializadas e construídas onde faz sentido implantar projetos de centrais fotovoltaicas” e lembra que “a experiência de outros países que têm menor exposição solar, mas um maior aproveitamento de energia solar do que Portugal, mostra que é possível instalar esta tecnologia através de abordagens de menor impacto ambiental e com maior participação da população”.
O GEOTA e as restantes ONGA da Coligação C6 exigem uma avaliação ambiental estratégica para que seja o Governo a indicar onde e como serão instaladas as novas centrais, “não devendo essa decisão ser deixada apenas aos promotores, que a tomam com base, principalmente, em critérios financeiros de curto prazo”.
De momento, encontra-se em consulta pública um estudo pelo LNEG que identifica as zonas em que não há impedimentos à construção de projetos de energias renováveis, concluindo que 12% do território, cerca de 10 mil km2, pode ser utilizado para a instalação de projetos de energia renovável. A mesma entidade publicou um outro estudo onde apresenta o potencial das áreas industriais para produção de energia solar fotovoltaica, destacando que cerca de 60% das áreas industriais podem produzir mais de metade da energia que consomem utilizando apenas 5% das coberturas dos seus edifícios. A utilização das áreas circundantes às zonas industriais poderá aumentar até seis vezes mais a capacidade de geração fotovoltaica do que a total planeada para Portugal em 2050.
O Geota lembra também estudos “que apontam para o potencial de Portugal para produzir energia solar fotovoltaica nos telhados de edifícios que poderiam gerar até 50% do consumo de eletricidade no país, mas as comunidades de energia renovável continuam sem se desenvolver”.
“É possível que seja executada uma estratégia para expandir a energia solar fotovoltaica em Portugal, minimizando os impactos negativos no ambiente e na sociedade, potenciando sinergias com outras atividades económicas e fomentando a participação da população nos projetos.”