Marília Santos, 24 anos, passou um ano a conviver com caranguejos, búzios, mexilhões, cracas e anémonas, entre outros habitantes da zona de maré, para a tese de mestrado em ilustração científica. O seu projecto de ilustração das espécies que habitam esta parte da costa portuguesa, onde o mar se encontra com a praia, revelou-lhe um universo novo de espécies até então desconhecidas.
“Entrei nisto completamente naif, não fazia ideia do que existia”, lembra a ilustradora científica, em entrevista à Wilder. A convivência com este novo mundo foi de tal forma que Marília, licenciada em design de comunicação, conhece agora na ponta dos dedos os nomes científicos e as características de espécies que passou horas a estudar, a observar e a ilustrar, muitas vezes na praia, outras com base em fotografias.
Nas muitas saídas de maré para o mestrado no Instituto Superior de Educação e Ciências, no ano lectivo 2013/2014, Marília aprendeu por exemplo que as poças de maré, na zona rochosa das praias, são autênticos “viveiros” completamente diferentes entre si, dependendo se estão mais junto à areia ou junto ao mar.
Ficou também a saber que alguém persistente a procurar nos buracos das rochas pode dar de caras com um Octopus vulgaris, a única espécie de polvo que ocorre na costa portuguesa – especialmente no Algarve, onde vivem muitos exemplares.
E descobriu ainda muitas outras coisas: o bonito padrão que parece desenhado nas minúsculas conchas das gibbulas – “existem três espécies de gibbulas na zona de maré em Portugal” -, ou “como são bonitas as trívias”, ou que nas praias “viras uma pedra e tens um mundo lá por baixo”.
Marília aprendeu sobretudo que em Portugal existe “uma riqueza imensa” de espécies que habitam a zona de maré, conhecida por pescadores e por alguns turistas estrangeiros que acorrem à zona da Praia da Luz (Algarve), ao Cabo Raso (Cascais) ou à Arrábida, alguns dos melhores locais para quem pretende conhecer melhor este universo.
Em equipa com o ilustrador científico Pedro Salgado e com o biólogo marinho José Paula, que foram os orientadores no âmbito da tese – e aliás quem lhe deu a ideia inicial para o tema – Marília pretende agora completar o trabalho de ilustração das espécies que ocorrem na zona de maré em Portugal. Mais importante ainda, os três querem dar a conhecer esse mundo escondido.
A ilustradora científica explica que no mercado português os guias disponíveis para a zona de maré costumam ser originários do Reino Unido e, por isso, têm espécies que não existem em Portugal e outras que não são exactamente as mesmas. Ou então são demasiado técnicos porque são específicos para estudantes de biologia.
Durante a tese de mestrado, Marília fez 43 ilustrações de identificação de espécies, sobretudo gastrópodes e crustáceos, sem contar com outros trabalhos mais gerais. Mas “são necessárias pelo menos 200, só para a costa portuguesa, para ser uma coisa com pés e cabeça”.
É para conseguir o financiamento necessário para completar as ilustrações que faltam – “que significam entre um ano e um ano e meio de trabalho” – e para produzir material de identificação dirigido ao público, que a equipa está agora a elaborar propostas de financiamento para serem apresentadas a instituições em Portugal e no estrangeiro.
Quase certo é que a primeira edição vai ser em inglês, até porque o projecto está “muito ligado ao turismo”. Já existe um protótipo com fichas de identificação de algumas espécies, os respectivos desenhos científicos e outras informações, com material à prova de água para ser facilmente manuseado na praia. Mais tarde, querem ainda produzir um guia em formato de livro.
Mas acima de tudo, “o objectivo mesmo é chegar ao público”, dar a conhecer o pequeno mundo ainda tão desconhecido mas tão acessível para quem passeia numa praia. “Não queremos ficar fechados numa gaveta de universidade”, resume Marília.
[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.
Marília Santos indica-lhe cinco espécies que pode encontrar na zona de maré, em Portugal.