As 163 espécies de líquenes e as 48 espécies de musgos que vivem nas árvores de Lisboa e da Margem Sul revelaram a uma equipa de investigadores que a qualidade do ar melhorou nos últimos 30 anos. O estudo foi publicado este mês na revista científica Ecological Indicators.
Investigadores do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, do Museu Nacional de História Natural e da Ciência ((MUHNAC) e do Instituto Superior Técnico compararam os dados recolhidos entre 1980-1981 e entre 2010-2011, com base na sensibilidade que os líquenes e musgos têm aos poluentes na atmosfera.
Palmira Carvalho, curadora da coleção de líquenes do MUHNAC, conta que nem sempre foi fácil aceder aos locais descritos no estudo dos anos 80. “Em Lisboa ainda conseguimos replicar o estudo na maioria das zonas, mas na Margem Sul, por vezes, foi complicado. A crescente ocupação do solo fez com que a paisagem se alterasse bastante”, explica. Vários foram os casos em que as árvores, simplesmente, já não estavam lá.
“Em Portugal, as árvores que costumam ser utilizadas são as oliveiras, as tílias e os freixos porque são das espécies mais parecidas e aquelas que oferecem bons substratos a estes organismos”, explica Palmira Carvalho.
Ao contrário do que costumava ser ensinado no curso de agronomia, os musgos e líquenes que vivem sobre as árvores não deverão ser vistos como seus parasitas. “A luz e a água que os musgos e os líquenes precisam são retiradas da atmosfera e não da árvore, e por isso é que estes organismos são bons biomonitores”, esclarece a curadora. “Conseguimos estimar a qualidade do ar através destes seres vivos porque eles acumulam e reagem de modos diferentes aos poluentes atmosféricos”, explica ainda Cecília Sérgio, a coordenadora do estudo e investigadora do cE3c.
Especialista em líquenes, Palmira Carvalho afirma que está cientificamente provado que o número de espécies num dado local está diretamente relacionado com a sua qualidade atmosférica. “A qualidade do ar de Lisboa é bastante razoável porque ainda encontramos várias espécies tolerantes aos poluentes urbanos”, esclarece. Enquanto Monsanto, apelidado de “pulmão” da cidade, e os subúrbios de Setúbal foram as áreas em que se registaram os valores mais baixos de poluição, a Avenida da Liberdade continua a ser a zona mais problemática com o menor número de musgos e líquenes identificados.
Os investigadores explicam a melhoria da qualidade do ar com a alteração à regulamentação europeia sobre a indústria e o tráfego. Cecília Sérgio assegura que as elevadas concentrações de gases poluentes, como o dióxido de enxofre, se alteraram significativamente, chegando a apresentar valores inferiores aos regulamentados. Além disso, constatou-se que a crescente aposta em políticas promotoras de um ar mais limpo surtiu efeito em zonas bastante industrializadas como o Seixal e o Barreiro.
“Foram muitas as espécies que voltaram a aparecer em determinadas áreas, mas este ressurgimento não está necessariamente associado a uma melhoria da qualidade do ar”, adverte Palmira Carvalho. Cecília Sérgio salienta que alguns musgos e líquenes são exclusivos de ambientes “puros” e outros simplesmente se instalam em determinados lugares por se reunirem fatores ecológicos que lhes são favoráveis.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a má qualidade do ar é a principal causa de mortalidade relacionada com o ambiente, à escala europeia. Palmira Carvalho enfatiza que o estudo – financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) – permite ter dados atualizados e tecnologicamente mais refinados do que os da década de 80. E caso seja repetido num futuro próximo, poderá servir para testar a eficácia das novas políticas ambientais.
Texto editado por Helena Geraldes