Garajau-Comum na Graciosa. Foto: D.R.

Oitenta pessoas juntaram-se para conservar aves marinhas nos Açores

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São biólogos, velejadores, vigilantes da natureza mas também professores de ballet e bancários reformados. O amor pelas fantásticas aves marinhas dos Açores juntou-os. A Asas do Mar, associação criada em plena pandemia, tem hoje 80 associados espalhados pelos Açores, continente, Reino Unido, França e Espanha.

Muito da vida de Miriam Cuesta, 32 anos, gira à volta das aves marinhas. Esta bióloga marinha fala de cagarras, paínhos, garajaus e gaivotas com admiração, acentuando o que as torna maravilhosas.

Cagarra-de-barrete. Foto: Kirstin Jones

As cagarras “inundam de assombro e encanto as nossas paisagens sonoras desde a nossa infância”. Os pequenos paínhos são “elusivos e aparentemente frágeis mas, de facto, são verdadeiros lobos-do-mar”. Os garajaus, “as nossas andorinhas-do-mar”, são admiráveis “pela sua tenacidade, elegância e dedicação incondicional à família”. E as “fiéis gaivotas, que aqui nos Açores gostamos de chamar garças ou ganhoas, estão sempre presentes, da terra ao mar, de Janeiro a Dezembro”.

Para proteger estas e outras preciosidades do mundo alado marinho, três colegas criaram a associação Asas do Mar a 24 de Abril de 2020, em plena pandemia. Apenas uma “coincidência”, explica Miriam Cuesta.

Cagarra. Foto: Justin Hart

“A associação foi fruto do sonho de três colegas. A ideia cresceu e a associação contava já com 30 associados fundadores no momento da sua criação. Neste momento somos cerca de 80 associados espalhados por várias ilhas dos Açores, continente, Reino Unido, França e Espanha”, disse a bióloga marinha à Wilder.

Os corpos sociais incluem oito mulheres e quatro homens com idades entre os 32 e os 66 anos. “As nossas formações e interesses são bastante diversos, mas partilhamos o gosto e o fascínio pelas aves marinhas, quer do ponto de vista científico, quer do ponto de vista recreativo, estético e emocional.” 

Recolha de pellets de garajaus. Foto: Verónica Neves

O objectivo da Asas do Mar é “proteger as aves marinhas do Atlântico central e os seus habitats, ao mesmo tempo que inspira as pessoas a apreciar e preservar a ligação à natureza”.

De momento, a associação está a organizar um ciclo de webinares com especialistas em várias áreas, saídas de campo e o 1º Concurso de Fotografia de Aves Marinhas dos Açores, até 30 de Junho, para promover o gosto e interesse pela observação de aves. “As imagens podem incluir os habitats e as ameaças a que as aves estão sujeitas e devem contar uma pequena história”, explica Miriam Cuesta.

Campanha SOS Cagarro. Foto: Miriam Cuesta

Para breve estão previstas acções em escolas, dedicadas às várias espécies de aves marinhas.

Segundo Miriam Cuesta, “os Açores ainda albergam populações importantes de várias espécies de aves marinhas no contexto europeu”.

Mas é preciso agir para conservar estas aves. “Em termos teóricos a legislação existe e é adequada. Em termos práticos e reais, as principais ameaças precisam ser abordadas de uma forma mais pragmática e eficaz, nomeadamente no caso dos predadores introduzidos, da redução gradual do habitat, da contaminação com micro-plásticos, entre outras ameaças. Temos que fazer mais e melhor.”

Cria de gaivota. Foto: Kirstin Jones

A Asas do Mar nasceu para dar esse contributo. Miriam Cuesta explica como as pessoas que gostam de aves marinhas podem juntar-se a esta associação. “De uma forma activa, como voluntárias ou tornando-se associadas e participando nas actividades em curso, bem como contribuindo com novas ideias e propondo novas actividades. O nosso site dispõe de ficha de inscrição e podem também contactar-nos através do email [email protected] ou pela página do Facebook.”

Actualmente, a Asas do Mar “é a única associação em Portugal dedicada exclusivamente ao estudo e conservação das aves marinhas”.

Miriam Cuesta. Foto: D.R.

“Mas, naturalmente, partilhamos ideais e objectivos com muitas outras ONGA dos Açores, como é o caso da associação Amigos dos Açores com mais de 35 anos de existência e que com o Doutor Luís Monteiro esteve intimamente ligada ao surgimento da campanha SOS-Cagarro no final dos anos 80 – início dos anos 90. A biodiversidade de ONGA é sinal de um ecossistema sustentável e resiliente e aumenta o número de sinergias possíveis. Acreditamos que continua a existir no arquipélago bastante espaço para a criação de ainda mais associações com massa crítica e dedicação ao bem comum e à co-criação de um planeta mais equilibrado e feliz.”

Para 2021, a associação espera “despertar o maior número de pessoas para a importância de conservar as aves marinhas e os seus habitats. Passar a mensagem de que todos podemos contribuir com gestos quotidianos, reduzindo a utilização de plásticos e evitando o abandono de animais domésticos, por exemplo.”

Cria de cagarra. Foto: Verónica Neves

De Julho a Novembro, Miriam Cuesta vai estar em trabalho de campo no Faial a estudar o comportamento noturno das crias de cagarros (Calonectris borealis) naquela ilha açoriana, graças a uma bolsa Early Career Grant da National Geographic Society.


Saiba mais.

Explore as espécies de aves marinhas de Portugal neste Atlas da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA).

Agora é a sua vez.

Se quiser participar num projecto relacionado com aves marinhas, por que não ajudar a SPEA a descobrir ninhos de gaivotas nas cidades? Pode participar até 31 de Julho. Saiba mais aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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