Foto: Maria Ana Dionísio

Styela plicata: Esta bisnaga é uma invasora que já chegou a toda a costa portuguesa

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No âmbito de uma série sobre espécies aquáticas invasoras publicada em parceria com o projecto LIFE Invasaqua, Paula Chainho, investigadora do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, explica tudo o que precisamos de saber sobre esta ascídea que se espalhou pelo mundo agarrada às embarcações.

Que espécie é esta?

É uma espécie de ascídia solitária que pertence ao Filo dos Cordados. Possui um corpo ovóide, envolto numa túnica opaca e resistente, de coloração branco-creme a acinzentada. Este animal possui duas aberturas, os sifões, localizados na sua parte anterior, cujos bordos estão decorados com riscas vermelhas ou roxas na superfície interior.

Foto: Paula Chainho

Quando é perturbada, esta ascídea expele água através dos sifões, motivo pelo qual é chamada de seringa ou bisnaga pelos aquicultores. Vive fixa a substratos duros, que podem ser zonas rochosas, mas também substratos artificiais, como ancoradouros, flutuadores e bóias. É muito abundante em portos comerciais e marinas de recreio, mas também em instalações de aquicultura.

A Styela plicata vive menos de um ano mas após o segundo ou quarto mês de vida já consegue reproduzir-se, consoante nasça e cresça durante o período de Verão ou no Inverno. É hermafrodita e já se observaram células reprodutoras masculinas e femininas maduras ao longo de todo o ano na lagoa de Albufeira, assegurando assim uma desova contínua.

Esta invasora é uma espécie cosmopolita presente em todo o globo, que pode ser encontrada em habitats marinhos pouco profundos, em áreas de climas tropicais e temperados. O estudo da variação genética desta espécie a nível mundial permitiu perceber que a região do Noroeste do Pacífico é provavelmente o seu local de origem, sendo a navegação o vetor que terá promovido a sua grande dispersão.

Como chegou a Portugal?

A presença desta ascídea é conhecida em território português desde 2009, ano em que foi observada nas marinas de recreio da Nazaré, Peniche e Albufeira. No entanto, com a realização de monitorizações mais frequentes das espécies não indígenas, esta espécie tem sido avistada em grande parte das marinas de recreio, portos de pesca e áreas limítrofes, por toda a costa portuguesa.

Isso leva a crer que poderá ter chegado ao território nacional incrustada nos cascos das embarcações de recreio e comerciais. Também poderá ter sido introduzida através das espécies trazidas para cultivo em aquicultura, como é o caso da ostra-do-Pacífico, uma vez que se pode fixar nas suas conchas e consegue sobreviver fora de água durante longos períodos.

Por outro lado, as primeiras ascídeas de Styela plicata terão chegado a Portugal através de embarcações provenientes de outros países onde a espécie já estava presente, ou por meio de espécimes trazidos para aquiculturas. A sua dispersão ao longo da costa portuguesa, todavia, pode ter sido facilitada pelas embarcações de recreio e pesca que fazem pequenos percursos ao longo daquela, transportando as espécies de uns locais para os outros.

Foto: Maria Ana Dionísio

E como é que pode ser detectada?

Esta espécie é facilmente identificada, uma vez que apresenta dimensões entre 4 e 7 cm, podendo chegar aos 9 cm. Não se confunde com nenhuma das espécies nativas, mas tem algumas semelhanças com outras espécies introduzidas, nomeadamente a Styela canopus e a Styela clava. Pode distinguir-se da primeira pela coloração e pelos sifões, uma vez que Styela canopus é amarela ou acastanhada e os sifões têm um aspeto verrugoso. Já a Styela clava possui um pedúnculo através do qual se fixa ao substrato e a túnica tem um aspeto coriáceo.

Em Portugal, podemos encontrar Styela plicata nos estuários e lagoas costeiras, nas zonas onde a salinidade é mais elevada (>30), onde pode colonizar substratos artificiais como os flutuadores, cabos e bóias de marinas de recreio, enrocamentos das zonas portuárias e cascos das embarcações, mas também em instalações de aquacultura, onde se fixa em todos os substratos duros disponíveis, incluindo as conchas de bivalves.

Foto: Maria Ana Dionísio

Mas afinal qual é o problema com esta ascídea?

A presença desta espécie passou muito despercebida em Portugal até causar severos impactos nas aquiculturas de mexilhão da lagoa de Albufeira. Em 2017, os aquicultores reportaram elevadas perdas na produção de mexilhão devido à presença destas ascídeas, que colonizaram as conchas dos mexilhões “sufocando” os bivalves, que por sua vez registaram taxas de crescimento bastante inferiores ao normal.

Para além dos impactos económicos associados a estas perdas de produção em aquicultura, a Styela plicata tem impactos sobre o ecossistema que coloniza, uma vez que compete por espaço – quer devido às suas elevadas dimensões, quer pelo facto de inibir a fixação das larvas de outras espécies nativas de ascídeas.

Pode ainda induzir uma diminuição do crescimento das outras espécies por ser um competidor trófico, visto que se alimenta das mesmas coisas que outros organismos filtradores que vivem na mesma área e, por vezes, pode até consumir larvas de outras espécies.

Foto: Paula Chainho

E como é que se conseguem controlar ou erradicar as populações desta espécie? 

A erradicação desta espécie seria possível apenas numa fase muito inicial do processo de colonização, sendo para isso importante ter uma monitorização frequente dos potenciais locais de entrada, como marinas de recreio e estabelecimentos aquícolas.

Para prevenir a introdução desta espécie em locais onde ainda não ocorre é essencial evitar a translocação de organismos entre diferentes sistemas aquáticos. Isto acontece muitas vezes com as ostras e os mexilhões, que são captados em zonas onde são abundantes para serem transportados para outros locais onde se pretende fazer o seu crescimento e exploração. Esses espécimes podem ser a via de transporte de outros organismos que os usam como suporte de fixação, como é o caso das ascídeas, que apanham assim “boleia” para novas localizações onde não estavam presentes.

O controlo das populações de ascídeas tem sido tentado em diversos locais onde se faz a produção aquícola de mexilhão e ostra, como por exemplo nas costas do Canadá, como forma de minimizar as perdas de produção. Algumas das técnicas experimentadas para controlar o crescimento das ascídeas incluíram o controlo biológico, utilizando ouriços-do-mar para predar as ascídeas, o controlo químico, através de banhos em cal hidratada ou vinagre, e o controlo físico, através da remoção manual com utilização de escovas de arame. 

Foto: Paula Chainho

Qual é a situação noutros sítios do mundo onde é invasora?

Esta espécie tem uma distribuição mundial e consegue colonizar meios marinhos, salobros e até com elevados níveis de poluição. No entanto, dentro do grupo de ascídeas consideradas invasoras, que conseguem ter populações bastante abundantes e que causam impactos significativos, não é das que têm causado maior preocupação. Espécies coloniais como Didemnum vexillum e Botrylloides leachi e solitárias como Styela clava têm sido apontadas como causadoras de elevados impactos na produção aquícola de bivalves, mas para a Styela plicata, a Lagoa de Albufeira é o primeiro local onde são reportados impactos relevantes. 

Que cuidados se devem ter para esta invasora estar controlada em Portugal?

Limitar a translocação de exemplares de bivalves entre diferentes locais, ou exigir um tratamento prévio à sua colocação no novo local, que assegure a remoção dos organismos incrustantes, são medidas que ajudam a prevenir a dispersão desta espécie para outros sistemas costeiros. A limpeza frequente dos cascos das embarcações de recreio é outra forma possível de controlo do transporte desta e de outras espécies para novos locais.

Uma curiosidade…

As potencialidades da Styela plicata para o desenvolvimento de aplicações biomédicas tem vindo a ser explorada, devido à presença de moléculas com propriedades anti-cancerígenas e anti-inflamatórias. A potencialidade desta espécie para a biorremediação também já indicou resultados positivos, uma vez que a Styela plicata consegue filtrar elevados volumes de água, retendo alguns poluentes de origem urbana.


Série Espécies Aquáticas Invasoras

Em parceria com o projecto LIFE Invasaqua, a Wilder dá-lhe a conhecer algumas das principais espécies aquáticas invasoras em Portugal. O LIFE Invasaqua é um projecto ibérico co-financiado por fundos comunitários que divulga informação acerca da ocorrência e combate a espécies invasoras.

Recorde o que se passa em Portugal com o siluro, o mexilhão-zebra, a rã-de-unhas-africana, o alburno, a amêijoa asiática, o caranguejo-peludo-chinês, a amêijoa-japonesa, a gambúsia, o lagostim-sinal, a medusa Blackfordia virginica, o lucioperca, o caranguejo-azul, a ludevígia-rastejante, o jacinto-aquático, a íbis-sagrada, o mosquito-tigre-asiático, a pinheirinha-de-água e o visão-americano.

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