Saiba o que fazem os ratinhos de Portugal nos meses mais frios

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Três biólogos explicam como passam o Outono e o Inverno espécies como o rato-das-hortas, o rato-do-campo, o leirão ou o rato-de-Cabrera. Todas elas são importantes “engenheiros dos ecossistemas”.

Em Portugal vivem 14 espécies de roedores. Ao longo dos últimos meses, têm estado na mira da equipa do Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal (2019-2021). O objectivo é saber qual a situação destes animais no nosso país: se estão a perder ou a ganhar terreno ou se estão estáveis.

Rato-dos-lameiros. Foto: Peter Trimming/Wiki Commons

“Os ratinhos ocupam uma posição bastante relevante nas cadeias alimentares”, explica à Wilder Joana Paupério, investigadora do CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos) especializada em pequenos mamíferos.

“Por um lado, são presas importantes de aves de rapina e mamíferos carnívoros, incluindo várias espécies protegidas e por outro, alimentam-se de uma grande diversidade de plantas, podendo contribuir para a dispersão de sementes.”

Mas a sua importância não se fica por aqui. “São também considerados engenheiros dos ecossistemas devido ao seu papel no arejamento e permeabilização dos solos, durante a construção das tocas”, acrescenta a investigadora.

Leirão. Foto: Tiia Monto/WikiCommons

“Ser pequeno não implica ser menor”, sublinha António Mira, coordenador da equipa dos Pequenos Mamíferos, ligado à Universidade de Évora, numa nota do projecto. “Os desafios da sobrevivência associados às pequenas dimensões, onde a manutenção da temperatura corporal implica um gasto energético ímpar, são superados por adaptações comportamentais, sociais, fisiológicas e ecológicas distintas entre as várias espécies, o que lhes confere uma diversidade única.”

Saiba, então, como passam os meses mais frios do ano espécies como o leirão, o rato-do-campo, o rato-das-hortas, o rato-dos-lameiros ou o rato-dos-prados.

Para quem não é esquisito, há sempre alimento disponível:

De uma maneira geral, os roedores têm uma actividade normal nesta época do ano. Alimentam-se do que houver disponível, consoante as dietas de cada espécie, segundo Joana Paupério.

Rato-do-campo. Foto: Hans Hillewaert/WikiCommons

Alguns ratinhos são herbívoros – alimentando-se de folhas, caules ou frutos e sementes – enquanto outros podem ter dietas omnívoras, como por exemplo o rato-caseiro (Mus musculus) em ambientes mais humanizados.

“Normalmente ajustam a sua alimentação ao que está disponível, havendo variação no alimento que ingerem ao longo do ano. Desta forma, mesmo no Inverno, a maioria das espécies consegue recursos suficientes para a sua sobrevivência.”

Reprodução todo o ano, mesmo no Inverno:

Segundo esta bióloga, algumas espécies “reproduzem-se também no Outono, porque têm uma reprodução contínua ao longo do ano ou porque nesta época do ano ainda têm as condições adequadas para se reproduzirem”.

O conforto e a segurança de túneis e tocas:

Ainda que os nossos Invernos sejam amenos e que a maioria das espécies não hiberne, para estes ratinhos é crucial passar as intempéries num abrigo.

Toca do rato-dos-prados. Foto: James Lindsey/WikiCommons

“Para se abrigarem, os ratinhos constroem túneis e tocas. Estes túneis e tocas podem ser subterrâneos ou podem ser construídos à superfície no meio da vegetação”, explica Joana Paupério.

A maioria das espécies usa uma estratégia mista. “Em algumas situações, há espécies que escavam túneis debaixo do solo e noutras usam zonas protegidas debaixo da vegetação”.

“No entanto, algumas espécies, como o rato-cego-mediterrâneo (Microtus duodecimcostatus) e o rato-cego (Microtus lusitanicus) têm hábitos mais subterrâneos.

Estes abrigos são usados ao longo de todo o ano. Além de se protegerem de condições ambientais adversas, servem para se protegerem dos predadores.

Mais actividade diurna no Inverno:

Entre os ratinhos que vivem em Portugal, há algumas espécies com estratégias curiosas durante o Outono e o Inverno.

“O Outono e o Inverno em Portugal não são períodos particularmente difíceis para a maioria dos ratinhos, excepto em regiões onde neva mais frequentemente. O Verão é um período mais limitante para os ratinhos num clima mediterrâneo”, disse Sara Santos, investigador do CIBIO-InBIO.

Rato-cego. Foto: José Ramón Pato Vicente/WikiCommons

“No entanto, no Inverno é mais comum algumas espécies terem atividade mais diurna quando comparado às outras estações do ano.”

Por exemplo, no caso do rato de Cabrera (Microtus cabrerae) – que é uma espécie que habita em zonas húmidas, e para a qual os verões muito secos serão um factor limitante – os indivíduos começam a aumentar a sua atividade no início do Outono, depois das primeiras chuvas, recorda Joana Paupério.

Mas há um ratinho que pode hibernar

Para outras espécies, acontece o oposto. Como o leirão (Eliomys quercinus), espécie prioritária para o trabalho de recolha de dados novos no terreno, no âmbito do Livro Vermelho dos Mamíferos. Isto porque esta espécie está classificada como DD (Informação Insuficiente).

O leirão pode iniciar períodos de hibernação no Outono, dependendo das condições climatéricas de cada ano, explica Ricardo Pita, investigador da Universidade de Évora. Estes períodos de hibernação “são desencadeados pelas baixas temperaturas e escassez de alimentos e podem estender-se durante o Inverno”.

“Nesses períodos de letargia a taxa metabólica e temperatura corporal descem significativamente e a energia que os animais consomem é obtida das reservas de gordura subcutânea acumulada antes destes períodos.”

A ocorrência e duração da hibernação na Península ibérica depende das condições ambientais e tende a ser menor (e de duração mais curta) no sul da Península ibérica.


Agora é a sua vez.

Estes são animais difíceis de observar. Quando é a melhor altura do ano para os tentar ver? Joana Paupério responde.

Estes animais são normalmente difíceis de observar. Por isso é que os métodos de estudo destes animais se baseiam ou na sua captura ou na pesquisa de indícios da sua presença.

A melhor altura do ano para os observar será quando as populações são mais abundantes, ou seja, depois de iniciarem a época de reprodução, e quando há maior disponibilidade de recursos alimentares. Ora, isto varia de acordo com as espécies.

A altura do dia também é importante na observação destes animais, dado que muitas das espécies têm hábitos mais crepusculares ou noturnos, estando mais ativos nessas alturas.


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Marco Nunes Correia é ilustrador científico, especializado no desenho de aves. Tem em mãos dois guias de aves selvagens e é professor de desenho e ilustração.

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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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