PUB

Retrato de um voluntário pela natureza: Luís Venâncio

22.06.2021
Luís Venâncio, numa fotografia captada por uma câmara de foto-armadilhagem.

Luís Venâncio, 51 anos, vive em Arronches, no Alto Alentejo, e trabalha como administrativo na Função Pública. Começou como voluntário pelas aves há 30 anos e hoje dedica-se a inúmeras acções de contagens e monitorização. “Além do saber alcançado, tenho ganho muitos momentos de prazer, tanto pelo simples desfrute das aves e do campo como pelo sentimento de dever cumprido”, disse à Wilder.

O que faz enquanto voluntário?

Relativamente às atividades da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, sou vigilante da IBA (Área Importante para as Aves) da Albufeira do Caia, participo anualmente nos Censos de Aves de Comuns e no Programa NOCTUA e colaboro regularmente noutra iniciativas de caráter mais pontual, como os atlas ou os censos dirigidos.

Sou também responsável pelas contagens de grou-comum no Alto Alentejo e já colaborei em inúmeros projetos promovidos por diversas entidades, como censos de várias espécies, campanhas de anilhagem ou estudo da migração noturna através de ‘moonwatching’, entre outros. A nível pessoal, desde há cerca de 20 anos que monitorizo as colónias de andorinhas-do-mar e perdiz-do-mar da albufeira do Caia, a população reprodutora de cegonha-preta do Sudeste do distrito de Portalegre e um conjunto de dormitórios invernais de alcaravão existentes na mesma região.

Abetarda. Foto: Luís Venâncio

E quais são os maiores desafios de um censo de aves nocturnas como o NOCTUA?

Uma vez que isso é feito quase exclusivamente através das vocalizações das aves, é importante que quem observa tenha alguns conhecimentos sobre os sons emitidos pelas espécies-alvo e pelas outras criaturas ativas neste período. No entanto, desde que haja boas condições de audição – vento fraco e sem perturbação excessiva de trânsito, anfíbios ou outros ruídos – a identificação das espécies tende a ser relativamente fácil.

Quanto ao ‘moonwatching’, como é que se faz e em que circunstâncias é mais útil?

O ‘moonwatching’ consiste em observar a lua cheia com um telescópio e registar as aves que passam contra a claridade do disco lunar. Embora seja possível observar espécies de diferentes ordens, os pequenos passeriformes são os mais numerosos e este método permite estudar as suas migrações, que ocorrem em grande medida durante a noite.

No que respeita à sua actividade como voluntário pela natureza, como é que começou a participar?

Sou voluntário há cerca de 30 anos e comecei depois de me associar em diversas associações de defesa do ambiente e de ter conhecimento das atividades que estas realizavam, pois sentia curiosidade e prazer e julgava ser importante contribuir para o estudo e conservação das aves e dos seus habitats.

Cegonha-preta. Foto: Luís Venâncio

E quando começou o seu interesse pelas aves?

Começou muito cedo, ainda antes da adolescência, mas de forma nada recomendável, uma vez que as procurava para as caçar, que era o que via o meu pai fazer. Quando comecei a trabalhar conheci um colega que possuía guias de aves e desde então o meu interesse aumentou exponencialmente. Durante bastantes anos fui observador e caçador em simultâneo, mas acabei por abandonar esta última atividade.

Pisco-de-peito-ruivo (em cima) e guarda-rios. Fotos: Luís Venâncio

Porque considera as aves tão especiais?

Confesso que não sei bem porquê… Mas a beleza, os cantos, a diversidade de espécies, a capacidade de voar e as migrações são características fascinantes.

Como aprendeu a identificar estas espécies?

Como estava bastante familiarizado com o campo e com muitos dos seus habitantes, a simples consulta dos guias permitiu-me por nomes a muitas espécies que já conhecia, mas trata-se de um tema vasto e ainda hoje recorro às opiniões de amigos e às diversas fontes disponíveis para continuar a aprender algo novo todos os dias.

Águia-de-bonelli. Foto: Luís Venâncio

O que tem aprendido e o que tem ganhado com esta experiência de voluntariado?

Tenho aprendido muito sobre as aves e a sua identificação, porque o trabalho de campo é fundamental para adquirir conhecimento e a necessidade de estudar as espécies-alvo leva-nos a progredir. Além do saber alcançado, tenho ganho muitos momentos de prazer, tanto pelo simples desfrute das aves e do campo como pelo sentimento de dever cumprido.

Chapim-azul. Foto: Luís Venâncio

Costuma participar nos censos sozinho, acompanhado ou em grupo?

Costumo participar sobretudo sozinho, principalmente porque continua a haver poucos interessados pela observação de aves na minha região, embora algumas espécies mais apelativas, como o grou, já comecem a despertar mais interesse na comunidade.


Saiba mais.

Descubra alguns dos censos em que Luís Venâncio participa, como o Censo de Aves Comuns e o NOCTUA, e ainda outras acções de monitorização de aves abertas a voluntários, aqui.


Conte as Aves que Contam Consigo

A série Conte as Aves que Contam Consigo insere-se no projeto “Ciência Cidadã – envolver voluntários na monitorização das populações de aves”, dinamizado pela SPEA em parceria com a Wilder – Rewilding your days e o Norwegian Institute for Nature Research (NINA) e financiado pelo Programa Cidadãos Ativos/Active Citizens Fund (EEAGrants), um fundo constituído por recursos públicos da Islândia, Liechtenstein e Noruega e gerido em Portugal pela Fundação Calouste Gulbenkian, em consórcio com a Fundação Bissaya Barreto.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

Don't Miss