Ouriços-do-mar (Paracentrotus lividus). Foto: Cláudia Moreira

Conheça oito espécies fascinantes que todos podemos encontrar numa praia

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Gastrópodes, peixes, crustáceos, algas e muitas outros organismos curiosos fazem parte das praias portuguesas. Da próxima vez que passear à beira-mar procure estas espécies sugeridas pela equipa do bLueTIDE, projecto do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, que explica também porque é que merecem ser descobertas.

Desde Janeiro de 2021 que o projecto bLueTIDE trabalha com alunos e professores de 12 escolas do primeiro ciclo para lhes dar a conhecer a diversidade e a riqueza da vida na zona entremarés rochosa, a parte das praias rochosas que fica a descoberto na maré baixa e submersa no resto do tempo.

Fique a conhecer algumas das espécies mais interessantes e o porquê, nas palavras dos investigadores do projecto. E se encontrar algumas, não se esqueça de ter todos os cuidados para que continuem à sua espera, numa próxima ida à praia.

1. Sargacinha-das-lapas ou botelho-preto (Osmundea pinnatifida)

A sargacinha-das-lapas (Osmundea pinnatifida) é usada em várias cozinhas, incluindo nos Açores. Foto: Teresa Moura

Também chamada de erva-malagueta, esta alga vermelha na realidade pode ter cores muito diferentes, desde o amarelo ao quase preto. Destacamos esta espécie por ter uma característica única e bastante curiosa: é uma alga que cheira e sabe a pimenta.

Por ser bastante aromática, é interessante enquanto recurso alimentar, por exemplo como ingrediente num arroz de passas e pinhões com algas. Pode ser usada fresca ou seca. Na Escócia e Irlanda é utilizada por possuir sabor semelhante ao caril e à pimenta e nos Açores é conservada em vinagre, para ser mais tarde incorporada em fritos.

Tal como muitas outras algas, tem potenciais atividades antitumoral, antibacteriana, antifúngica e antioxidante. 

2. Barroeira (Sabellaria alveolata)

A barroeira (Sabellaria alveolata) constrói preciosas estruturas, que são frágeis e que é importante não pisar. Foto: Cláudia Moreira

A Sabellaria alveolata é um anelídeo, ou seja, uma espécie de minhoca muito fininha. Também conhecida por barroeira, vive numas estruturas que se assemelham a casulos.

Cada um desses casulos alberga um destes organismos no interior. Estas estruturas vão sendo construídas pelas Sabellaria através da mistura de uma espécie de muco/ranho que vão libertando com areia e pequenos restos de conchas em suspensão na água, até formarem verdadeiros recifes de areia.

Na maré baixa, a barroeira fica dentro dos casulos para se proteger do sol e da falta de água. Já quando estes ficam submersos, sai do seu casulo, parecendo esparguete. Quando por fim ficam vazios, são por vezes utilizados por outras espécies para refúgio e alimentação.

Atenção: é importante consciencializar as pessoas para a fragilidade e importância destes recifes de areia. Estes recifes são rígidos, e por vezes atingem dimensões tão grandes, que é o suficiente para se confundirem com rochas. É importante que as pessoas os evitem pisar e destruir quando visitam a zona entremarés rochosa.

3. Ouriço-do-mar (Paracentrotus lividus)

Os ouriços-do-mar (Paracentrotus lividus) usam um “chapéu” por causa do sol. Foto: Cláudia Moreira

O ouriço-do-mar é outra espécie destacada pelos investigadores do bLue TIDE, por três motivos.

Primeiro, porque gostamos sempre da reação das crianças e adultos quando dizem que os ouriços-do-mar usam “chapéu”! Na realidade são pedrinhas, conchas ou algas que os ouriços vão buscar para se protegerem do sol, pois tal como as suas parentes, as estrelas-do-mar, os ouriços não possuem olhos, mas têm umas células sensíveis à luz no corpo, como se fossem uns sensores. Então, quando está muito sol usam essas pedrinhas, conchas ou algas para se protegerem da luz, como se se tratasse de um chapéu de sol.

Por outro lado, frequentemente as crianças também se divertem com o nome “pés ambulacrários”, recordam. Esses pés especiais são utilizados pelos ouriços para se moverem.

Além do mais, também os “buracos” onde os ouriços se protegem geram curiosidade: nas poças de maré, estes rodam e rodam na rocha, raspando os seus cinco dentes e os espinhos, fazendo um círculo profundo onde se encaixam para se protegerem. 

4. Lebre do mar ou vinagreira (Aplysia sp.)

A intrigante lebre do mar (Aplysia sp.) parece que voa quando se desloca na água. Vídeo: Cláudia Moreira

Este curioso animal é conhecido como lebre do mar ou vinagreira porque, em stress, liberta um líquido roxo que faz lembrar vinagre tinto.

Existem três espécies de lebres do mar em Portugal. Por serem moluscos, têm o corpo mole, tal como a lapa (gastrópode), o mexilhão (bivalve) ou o polvo (cefalópode). Os moluscos podem ter uma concha, duas conchas, ou mesmo nenhuma a proteger o seu corpo. No caso da lebre do mar, que é um molusco gastrópode, tem uma concha vestigial, que por vezes pode ser vista quando ela se desloca. Ao deslocar-se parece também que voa, devido aos seus parapódios que parecem asas.

A lebre do mar vive à base de algas e tem um ciclo anual, ou seja, nasce, cresce, reproduz-se e morre em pouco menos de um ano, mais ou menos entre Fevereiro e Setembro. Coloca as suas posturas – ou seja, liberta os seus “ovos” – nas rochas das poças de marés. As posturas podem apresentar diversas cores, como o amarelo, verde, rosa e castanho, assemelhando-se a um emaranhado de fios ou esparguete, e essas cores estão relacionadas com a fase de desenvolvimento (estado de maturação dos ovos).

5. Tomate-do-mar e morango-do-mar (Actinia spp.)

Na maré baixa, os tentáculos retraem-se/encolhem e a anémona fica com este aspeto de bolinha. Foto: Cláudia Moreira

Existem diversas espécies de anémonas ao longo da nossa costa. Para percebermos melhor o que são, podemos pensar nas anémonas do famoso filme “À Procura de Nemo”, uma vez que o Nemo vivia numa. Escolhemos as anémonas porque muitos alunos ficam surpreendidos quando descobrem que também são animais, embora não tenham as características que visualmente as crianças estão habituadas a atribuir aos animais.

Estes organismos são “primos” das medusas, também conhecidas por alforrecas. Mas enquanto que as anémonas vivem fixas a um substrato quando são adultas, por exemplo agarradas às rochas, as medusas vivem livremente na água. 

O corpo das anémonas está dividido em três partes: os tentáculos, a coluna do corpo e a base, esta última contendo o pé pelo qual a anémona se liga a uma superfície sólida (rocha). Na maré baixa, os tentáculos retraem-se/encolhem e a anémona fica com este aspeto de bolinha. Isto acontece para evitar que percam água.

Alguns destes animais podem apresentar uma cor vermelha, verde ou castanha, o que os torna parecidos com um tomate – daí essas anémonas serem chamadas de tomate-do-mar. Outras são conhecidas como morango-do-mar, porque quando retraem os tentáculos na maré baixa apresentam uma coloração vermelha com diversos pontos verdes, parecendo um morango.

6. Caranguejo Carcinus maenas

O caranguejo da espécie Carcinus maenas necessita de fazer a muda à medida que cresce. Foto: Luis Miguel Bugallo Sánchez/Wiki Commons

Os caranguejos são animais algo cómicos e os alunos divertem-se sempre quando os vêem, daí que é sempre uma espécie que vale a pena recordar. Além disso, há duas curiosidades que os tornam ainda mais interessantes:

Primeiro, os machos e fêmeas são facilmente distinguíveis, pois o abdómen do macho é retangular e bicudo e o da fêmea é arredondado.

Em segundo lugar, esta espécie de caranguejo (Carcinus maenas) necessita de fazer a muda, isto é, para crescer precisa de se libertar do seu exoesqueleto rígido, a carapaça. Depois, gradualmente, a epiderme vai segregando um novo exoesqueleto. Assim, muitas das carapaças que encontramos na areia não são na realidade de caranguejos que morreram, mas sim o resultado da muda.

7. Cracas (Chthamalus montagui)

As cracas (Chthamalus montagui) são animais muito curiosos para quem as fica a conhecer melhor. Foto: Cláudia Moreira

As crianças ficam frequentemente surpreendidas quando descobrem que este organismo, com uma forma cónica que lembra um vulcão, é afinal um crustáceo, tal como o caranguejo ou os camarões, apesar de não parecer nada disso à primeira vista.

A parte externa das cracas é formada por camadas de placas calcárias que protegem os órgãos internos. Estes crustáceos têm também placas na parte superior que fecham durante a maré baixa para evitar a perda de água. Pelo contrário, quando ficam submersos, as placas abrem e parte das cracas sai para fora, expondo os seus cirros – apêndices pelos quais filtram a água e assim se conseguem alimentar.

Estes crustáceos existem agregados às rochas das poças de marés, mas também se podem ver nos cascos de navios e na pele das baleias. Parecidos com as cracas, uma vez que também são crustáceos cirrípede, temos também os famosos percebes.

8. Cabelo-de-velha (Gracilaria gracilis)

Cabelo-de-velha (Gracilaria gracilis). Foto: Cláudia Moreira

Frequentemente basta mencionar o nome comum desta espécie para captar a atenção das crianças e adultos, daí ser uma das que mais gostamos de mencionar nas visitas. O nome – cabelo-de-velha – vem do facto de ser uma alga com um talo geralmente vermelho-acastanhado e de consistência cartilaginosa, que pode atingir 60 centímetros, e que por isso se assemelha a longos cabelos.

Outra curiosidade é o seu odor. Quando fresca, possui um odor marinho e terroso que lembra levemente cogumelos. Já quando seca tem um aroma muito pouco agradável, semelhante a peixe em decomposição. No entanto, com bom ou mau cheiro, fresca ou seca, esta alga é utilizada em saladas ou vinagretes e a sua farinha é empregue no preparo de pão e bolachas.

Desta alga podemos também extrair o agar. O agar é um substituto de gelatina, ou seja, é uma gelatina vegetal, e é muito utilizado no sector alimentar em gelatinas, gelados, salsichas e outros produtos, mas também na produção de medicamentos e de produtos de cosmética.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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