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Erva-das-Pampas (Cortaderia selloana). Foto: Forest & Kim Starr/Wiki Commons

O que está a acontecer no Outono: cada erva-das-Pampas dispersa milhões de sementes

21.10.2020

A erva-das-Pampas, uma das mais conhecidas plantas invasoras em Portugal, está “numa altura crítica” entre fins de Setembro e início de Novembro. Mónica Almeida e Hélia Marchante, ligadas ao projecto LIFE Stop Cortaderia, explicam-lhe porquê.

Originária da Argentina e do Chile, a erva-das-Pampas chegou a Portugal como planta decorativa de jardins e quintais, mas hoje o seu crescimento no território está a ser alarmante. De tal modo que em 2018 foi lançado um projecto luso-espanhol na busca de soluções para este problema, o LIFE Stop Cortaderia, co-financiado pela União Europeia.

É que a erva-das-Pampas é exímia no poder da multiplicação. Em meados de Outubro, já se deu a floração da maioria das plantas, com a formação das flores que “estão reunidas em inflorescências, geralmente designadas ‘plumas'”, descrevem Mónica Almeida e Hélia Marchante, ligadas ao LIFE Stop Cortaderia e à Escola Superior Agrária de Coimbra (ESAC). Ora, “cada uma destas plumas pode conter milhares de flores minúsculas.”

É normalmente de Junho ou Julho até fins de Setembro ou inícios de Outubro – durante a floração – que se formam estas plumas novas, uma vez que as anteriores já se degradaram. E é no início dessa época, quando as flores ainda não evoluíram para frutos, que é mais seguro remover as plumas das ervas-das-Pampas, adiantam as duas investigadoras. Essa é uma das principais formas de controlar o crescimento desta invasora.

Foto: Hélia Marchante

Mas passadas algumas semanas, é preciso muito mais cuidado, avisam. “Com o fim do Verão e início de Outono, começam a formar-se os frutos, cada um com apenas uma semente, e esta é a altura crítica para a remoção das plumas ou das plantas: com acções de remoção poderemos estar simultaneamente a ajudar a dispersar as sementes.”

Com efeito, de fins de Setembro ao começo de Novembro, “as sementes com origem nas flores femininas estão prontas a dispersar, pelo que as plumas ganham um aspeto ainda mais “fofo” e macio, onde os seus pêlos se “abrem” para serem levadas pelo vento.”

Em cada pluma de uma planta feminina, ou seja, de um indivíduo desta espécie, concentram-se agora milhares de pequenas sementes. Resultado? “Cada indivíduo pode dispersar sementes que potencialmente germinam e originam milhares de novos indivíduos em cada época, traduzindo-se numa enorme capacidade de invasão”, explicam Mónica Almeida e Hélia Marchante, professora na ESAC. “Isto multiplica-se pelo número de indivíduos existentes numa determinada área que, por vezes, é muito elevado.”

Paisagem invadida por erva-das-pampas. Foto: LIFE Stop Cortaderia

Qualquer um pode ser dispersor

Nem todas as sementes ou novas plantas sobrevivem, mas isso não impede “uma ‘explosão’ de sementes de erva-das-Pampas todos os anos no nosso território”, alertam. Por serem leves e muito pequenas, o vento transporta facilmente as sementes por vários quilómetros, “por exemplo junto a vias de comunicação”. No espaço de poucos anos, “um terreno livre de erva-das-Pampas rapidamente é colonizado e invadido.”

A juntar a isso, qualquer pessoa pode transformar-se em ajudante destas plantas – ainda que involuntário. “Os pêlos que rodeiam as flores femininas e as sementes facilmente aderem a qualquer estrutura, veículo, roupa ou pêlo de animais, pelo que qualquer ser vivo ou objecto pode ser um potencial dispersor de sementes de erva-das-Pampas.”

Além de rapidamente se espalharem, ocupando manchas de território apenas com a sua espécie, estas plantas desenvolvem-se muito depressa. Chegam a atingir quatro metros de altura e também de largura, com efeitos bem visíveis na natureza: “À medida que vão crescendo competem com as plantas nativas pelos recursos; impedem a passagem dos animais, pessoas incluídas; alteram a paisagem, com consequências negativas não só a nível da biodiversidade, mas também dos serviços dos ecossistemas”, apontam as duas responsáveis.

Pormenor das folhas de erva-das-Pampas com as margens cortantes. Foto: LIFE Stop Cortaderia

Mas não só, pois também as folhas podem provocar cortes. Quanto ao pólen é alérgico, o que traz “problemas em termos de saúde pública”. “Em Espanha, foi mesmo associada ao surgir de um novo pico de alergias no Outono.”

Nem todas são iguais

Os botânicos dizem que a erva-das-pampas é uma espécie ginodióica, lembram também Mónica Almeida e Hélia Marchante.

O que significa isso? Que tem plantas femininas e plantas hermafroditas. As primeiras “têm apenas flores com ovários, produtoras de sementes”, enquanto as hermafroditas “têm flores com ambos os sexos, ou seja, com ovários e estames produtores de pólen.”

Quando estão ambas presentes num território, a capacidade de invasão torna-se maior. Como as plantas hermafroditas produzem poucas sementes, e essas são menos viáveis do que as plantas femininas, “na prática são essencialmente dadoras de pólen.”

E é nesta altura do ano que se torna mais possível distinguir umas de outras. Enquanto as plumas das plantas femininas estão com um “aspecto fofo e macio”, prontas a dispersar as sementes, as plumas das hermafroditas “perdem os seus estames e ficam com um aspecto vazio e apodrecido.” As flores, muito pequenas e leves nos dois casos, também são diferentes: nas plantas femininas “estão cobertas por pêlos, ao contrário das plantas hermafroditas.”


Agora é a sua vez.

Qual é a maneira mais eficaz de controlar a erva-das-Pampas nesta altura do ano? Mónica Almeida e Hélia Marchante explicam e falam sobre o desafio “Município Livre de Cortaderia”:

“Nesta fase em que a maioria das flores já tem sementes, é necessário remover as plumas com bastante cuidado para aquelas não se dispersarem; as plumas são geralmente colocadas em sacos bem fechados e levadas para tratamento adequado: podem ser deixadas a apodrecer ao sol, queimadas em fornos fechados ou levadas para compostagem a temperaturas elevadas (pelo menos 60ºC).

Em alternativa, e com a ajuda de maquinaria, podem ser abertas valas no local e enterradas as plumas a profundidade suficiente para que não retornem à superfície nem apanhem luz do sol. A remoção das plumas é importante para conter a expansão da espécie quando a remoção completa das plantas não é uma alternativa rápida/ fácil de implementar.

No entanto, a maneira mais eficaz de controlo desta espécie consiste na remoção das plantas pela raíz; se as raízes forem deixadas no local, devem ser viradas para cima até secarem, para evitar que voltem a enraizar; os restos vegetais (sem as plumas) podem ser triturados e deixados no local como camada de ‘mulching’, podem ser cobertos por mantas anti-ervas ou plásticos biodegradáveis até apodrecerem ou levados para um centro de tratamentos de resíduos vegetais.

Apesar de desaconselhado ou mesmo proibido em várias situações, pode também ser utilizado herbicida; neste caso, a planta deve ser desbastada e aplicado o herbicida apenas quando começam a aparecer as folhas novas e estas atingem cerca de 50cm de altura.

Estrategicamente seria muito importante apostar em remover os indivíduos que ainda ocorrem isolados ou em pequenos grupos, de forma a evitar que essas áreas sejam invadidas a curto prazo. Nesse sentido, o LIFE STOP Cortaderia lançou a todos os municípios do país o desafio para conseguirem a distinção “Município Livre de Cortaderia”, obviamente mais razoável de atingir para os municípios onde ainda há menos invasão. Outros territórios (por exemplo, campus escolares, freguesias) também podem aderir! Mais informação em [email protected].”   


Aprenda a identificar (e como ajudar a mapear) estas plantas invasoras em Portugal. E aprenda mais sobre o que são afinal espécies invasoras nesta entrevista.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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