O correspondente da Wilder António Heitor guia-nos por um passeio na região de Sintra e leva-nos a descobrir aves fascinantes. E no fim, claro, temos direito às tradicionais queijadas!
Além dos palácios, dos jardins e do Castelo dos Mouros, na Serra de Sintra há várias espécies da fauna e flora para descobrirmos.
As minhas visitas a Sintra começam junto à costa, pela marginal, praias e marinas. Procuro gaivotas, ostraceiros (Haematopus ostralegus) e outras “marítimas”.
Depois de Cascais, o Cabo Raso, o Guicho e o Cabo da Roca, são excelentes locais para continuar à procura de aves pelágicas (que vivem a maior parte da sua vida em alto mar), como o ganso-patola (Morus bassanus), e outras, como o corvo-marinho-de-faces-brancas (Phalacrocorax carbo), com alguma sorte uma galheta (Phalacrocorax aristotelis) e mesmo o “vizinho” falcão peregrino (Falco peregrinus), que de marinho apenas tem o facto de fazer ninho nas arribas costeiras das redondezas.
Nesta época do ano gosto sempre de chegar cedo ao Cabo da Roca, antes das excursões de turistas, e procurar a ferreirinha-serrana (Prunella collaris). Este passeriforme invernante é fácil de encontrar pois apresenta uma elevada fidelidade a estes locais e, se a confusão não for muita, deixa-se fotografar facilmente.
Daqui subo à Peninha e aproveito a “floresta mais adulta” para encontrar alguns passeriformes florestais: o chapim-carvoeiro (Periparus ater), a estrelinha-real (Regulus ignicapilla), o chapim-de-crista (Lophophanes cristatus) e a “rainha dos céus”, uma águia-de-Bonelli (Aquila fasciata) ali residente. Desta vez não apareceu, mas num dos postes à beira da estrada estava uma águia-de-asa-redonda (Buteo buteo) a aproveitar os primeiros raios de sol.
Chegado a Sintra, deixo para trás as tentações das queijadas e concentro-me no objectivo da viagem: as aves. São vários os jardins e bosquetes na Serra e numa visita a estes locais podemos encontrar espécies de animais muito interessantes. No entanto, como a maioria dos contactos serão auditivos, é fundamental aproveitar o sossego das primeiras horas da manhã.
No primeiro jardim um melro (Turdus merula) aparece, empoleirando-se nas pedras e muros que ladeiam estes espaços verdes, emitindo um pio de alarme característico. Serei eu a ameaça ou anda mais alguma coisa no ar? Um pequeno vulto chama-me a atenção. Um olhar mais atento mostram-me uma estrutura singular. Uma pequena rapina, de grande cauda a voar com rapidez por entre a copa das árvores. Só pode ser um gavião (Accipiter nisus). Era esta a razão do alarme do melro.
Na copa das árvores a agitação é muita. Chapins, trepadeiras e tentilhões (Fringila coelebs) voam de ramo em ramo à procura de alimento. Mais longe um pio singular, seguido de um tamborilar desperta a minha atenção. O principal suspeito, um pica-pau-malhado-grande (Dendrocopus major), que tamborila no tronco em busca de alimento. Volta a piar e a minha suspeita é confirmada.
Nas clareiras destes jardins, em especial aqueles com flores, borboletas aproveitam os raios de sol para aquecer as asas. A chegada de um gaio (Garrulus glandarius) afugenta-as. Ao longe, um pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula) exibe com orgulho a cor que lhe dá o nome.
Nas árvores em volta decorre um estranho bailado nos troncos e ramos de maiores dimensões. As trepadeiras, a comum (Certhia brachydactyla) e a azul (Sitta europea) sobem e descem ao longo do tronco pondo em causa o próprio princípio da gravidade.
O rabirruivo (Phoenicurus ochruros) vai aparecendo empoleirando-se nos muros chamando o resto da família. Um “riso” estridente ecoa por entre as árvores. Um peto-verde (Picus viridis) aparece e faz uma entrada triunfal, pousando no relvado do jardim, facto que pode parecer estranho, uma vez que se trata do maior dos nossos pica-paus. Atrás, nos arbustos, reparo num pequeno vulto acastanhado com a “cauda apontada para cima”. Assim que pia facilmente percebo que se trata de uma carriça (Troglodytes troglodytes), habitante comum de zonas florestais com arbustos densos. Aqui também os chapins-reais (Parus major), chapins-azuis (Cyanistes caeruleus) e toutinegras-de-barrete-preto (Sylvia atricapilla) são comuns, podendo ser facilmente ser encontrados, bastando para tal alguma atenção aos seus constantes pios.
De regresso a Sintra podemos ouvir o diversificado repertório de pios dos estorninhos, quer do preto (Sturnus unicolor) quer do malhado (Sturnus vulgaris). Distinguir as duas espécies começa a ser mais fácil nesta altura do ano, uma vez que o “padrão malhado” começa a ficar bem mais visível.
Depois de uma manhã cheia de aves e com o aproximar da hora de almoço é mais difícil resistir às queijadas. Mas todos concordamos que é a melhor maneira de terminar um passeio pelo campo.
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