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Uma história de bufos-reais

24.11.2015

Foi nos passeios que dava com o avô, quando tinha uns 12 anos de idade, que Pedro Miguel Pereira fez os primeiros contactos com a natureza e com a observação das aves. Desde então, não parou de tentar saber mais, e os bufos-reais transformaram-se numa paixão, aliados à fotografia.

 

“Costumávamos passear os dois no campo e ver a passarada”, lembra o arquitecto algarvio sobre os passeios que dava com o avô pelos arredores de Faro – cidade onde continua a residir.

Agora com 38 anos, Pedro continua a dar passeios na natureza sempre que tem tempo livre, inspirado por esses tempos de infância com o avô. Apesar de ser citadino, vive numa cidade diferente de muitas outras, sublinha. “Faro tem uma geografia muito própria, porque existe um grande contacto com a natureza. Estamos sempre ao pé da praia, mas andamos uns quilómetros e já estamos na serra”, descreve à Wilder.

Mas foi há três ou quatro anos, quando na arquitectura “começou a haver um bocadinho menos de trabalho”, que finalmente ganhou algum tempo livre para dedicar a um animal que desde sempre o fascinava: o bufo-real (Bubo bubo).

 

 

“Comecei a ter mais tempo e a fazer pesquisas e fui para o campo à procura.” “De início não foi fácil”, admite, até perceber que os hábitos dos bufos-reais andam desalinhados das rotinas dos humanos. É durante a noite, aliás, quando há silêncio, que estes animais ficam mais activos.

 

Um bufo-real em voo, durante a noite

 

Teve de aprender a “pensar” como uma dessas aves que admira, recorrendo a muitas horas de leitura e de observação por binóculos, escondido. A essa capacidade de estar imóvel, aliou uma outra ligada ao gosto pela imagem e pela arquitectura – a fotografia, que apesar de mais difícil quando trabalha com pouca luz, lhe dá um gozo imenso se alcança bons resultados.

Como o casal de bufos-reais que fotografou há dois anos, apanhados “em pleno romance”, depois de lhes descobrir o território e de andar a observá-los às escondidas, “devidamente camuflado e mantidas as devidas distâncias”, durante cinco semanas.

 

Hoje em dia Pedro já distingue quais são os territórios onde os bufos-reais preferem nidificar. “Costumam fazer ninho em zonas com rochas, em pequenas escarpas que rompem a vegetação na serra, porque normalmente procuram áreas onde conseguem estar mais altos”, descreve.

Foi assim que nos últimos anos conseguiu identificar nove territórios de bufos-reais – cada um pertencente a um casal diferente, que quase sempre ali regressa para acasalar, no início de cada Inverno.

Aprendeu muitos outros hábitos desta ave, que quase sempre “acasala para a vida toda” e que “se reproduz no Inverno e início da Primavera”. É também um predador de topo, que se alimenta de pequenas aves, de coelhos e de ratos, ou até mesmo de mamíferos maiores.

 

O coelho-bravo é um dos alimentos preferidos dos bufos-reais

 

Já sabe, por exemplo, que o chamamento do bufo é mais comum logo depois do pôr-do-sol, quando começam os dias frios em Outubro ou Novembro. É a “bufar” que o macho marca o seu território e chama a fêmea, que por sua vez responde num som mais agudo, nota.

E nas muitas horas de observação a que não resiste, no campo às primeiras horas da noite, tem assistido a cenas fascinantes quando os bufos estão a caçar ou marcam território, ou depois do nascimento das crias, mas também durante a corte.

Como ver um bufo-real macho a chamar a fêmea, com um ratinho no bico, tentando-a “seduzir” para vir para o ninho. “Os machos propõem vários locais para ninhos e depois a fêmea decide onde vai ser.”

Ou então, o que se passou com o casal da foto (mais acima), que caçaram uma raposa e “a devoraram com a maior das facilidades”. Ou numa cena que nunca antes viu descrita, um bufo-real a guardar comida numa pequena caverna, em vez de a dar logo toda à fêmea e às crias, que o aguardavam no ninho.

“São aves incríveis. Poderosas mas subtis, pois dominam a arte da camuflagem e deslocam-se como fantasmas na escuridão”, descreve este arquitecto apaixonado pelos bufos-reais, que promete continuar. “São lindos”, resume.

 

Pedro Miguel Pereira, durante uma observação

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez

Se ficou curioso sobre os bufos-reais, pode procurar mais informação sobre esta espécie no portal das Aves de Portugal, aqui.

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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