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Quercus diz que Governo vai resolver falta de alimento para aves necrófagas

29.11.2016

Ainda não há datas definidas mas estará para breve a resolução do problema da falta de alimento para as aves necrófagas protegidas – como o abutre-do-egipto, o grifo ou o abutre-preto – em Portugal, avançou a Quercus, depois de uma reunião com o secretário de Estado da Agricultura e Alimentação.

 

Na sexta-feira passada, o secretário de Estado Luís Medeiros Viana garantiu à Quercus que vai existir uma mudança no Sirca – Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos na Exploração, nomeadamente quanto “à obrigatoriedade de recolha de animais mortos em locais remotos e nos parques naturais”, segundo a Quercus.

“Esta tem sido uma reivindicação nossa há anos. Parece que agora vai mesmo acontecer”, disse hoje à Wilder Samuel Infante, coordenador nacional do Grupo de Trabalho da Conservação da Natureza e da Biodiversidade da Quercus.

Espécies como o abutre-do-egipto, abutre-preto, grifo, milhafre-real e águia-imperial-ibérica alimentam-se de cadáveres de animais, ajudando a fazer um controlo sanitário na natureza. Mas, em 2009, o Estado criou o Sirca para permitir a despistagem da encefalopatia espongiforme bovina (doença das vacas loucas). Segundo a Quercus, através do Sirca são recolhidos das explorações pecuárias cerca de 1.000 cadáveres de ovinos, bovinos, equídeos e caprinos por dia.

E, de repente, aquelas aves deixaram de ter disponível alimento suficiente.

Para tentar minimizar o problema foram sendo instalados alguns alimentadores de abutres, espaços vedados com, pelo menos, um hectare, certificados pelas autoridades veterinárias. Ali, de semana a semana, ou de 15 em 15 dias, depositam-se carcaças de animais. “Estes alimentadores são uma espécie de penso rápido. A falta de alimento tornou-se numa das maiores ameaças à sobrevivência destas aves”, acrescentou Samuel Infante. Acima de tudo, são insuficientes. “No mínimo, estimamos serem necessárias 900.000 toneladas de carne por ano para alimentar os abutres reprodutores em Portugal”, acrescentou o responsável.

Há cerca de um ano, um dos alimentadores de abutres do Tejo Internacional, no Monte Barata, atingiu um recorde preocupante. Num só dia passaram por ali quase 300 abutres e outras espécies. “Nunca tínhamos visto uma concentração tão grande destas aves. Já temos visto muitos bandos grandes, com 40, 50 ou até mesmo 100 indivíduos, até porque no Tejo Internacional temos das mais importantes populações de aves necrófagas, mas nunca tínhamos assistido a algo com esta dimensão”, disse Samuel Infante à Wilder, em Novembro do ano passado.

Esta falta de alimento está a ter consequências para estas espécies, com populações já de si vulneráveis. “Por exemplo, na zona do Tejo Internacional, 2014 e 2015 foram os anos piores”, notou Samuel Infante. “Havia crias a morrer de fome nos ninhos e colónias de abutres a desaparecerem completamente, partindo para zonas com maior disponibilidade de alimento”.

Cada casal de abutre só tem uma cria por ano e apenas se começam a reproduzir com quatro ou cinco anos de idade. Samuel Infante acredita que a verdadeira dimensão do problema só será visível dentro dos próximos anos. “O impacto vai ser terrível”, especialmente no Sul do país, onde há menos presas naturais, como veados, corços e javalis.

Desde 2012, a Comissão Europeia permite o levantamento da obrigação de recolher carcaças de animais, quando não se verifiquem problemas sanitários. Mas Portugal ainda não alterou o Sirca, sistema que custa 12 milhões de euros por ano (oito milhões do Orçamento de Estado e quatro milhões pagos pelos consumidores e produtores).

Agora, o panorama poderá estar prestes a mudar. “A informação que temos é que esta mudança será relativamente célere”, adiantou Samuel Infante, depois da reunião com o secretário de Estado.

Nas zonas mais remotas e nas áreas protegidas será acautelada a saúde pública, de acordo com normas a estabelecer pela Direção Geral de Alimentação e Veterinária, adianta a associação de conservação de natureza.

Segundo a Quercus, esta medida será benéfica para as aves necrófagas e para a economia e para o Ambiente, dado que“vai permitir poupanças significativas ao Estado e ganhos ambientais na redução de CO2 associado ao transporte das carcaças”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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