Euphorbia flavicoma. Foto: Miguel Porto

Portugal terá perdido 24 espécies de plantas nativas, alertam botânicos

28.11.2018

Vinte e quatro espécies de plantas nativas ter-se-ão extinguido em Portugal, alertam os responsáveis que estão a ultimar a Lista Vermelha da Flora Vascular de Portugal Continental. Perto de outras 380 estão ameaçadas.

 

Duas espécies endémicas de Portugal, que apenas existiam no Baixo Alentejo – Armeria neglecta e Armeria arcuata – foram agora dadas como extintas a nível mundial, segundo os resultados preliminares deste projecto, conhecidos hoje.

Outras 22 espécies extinguiram-se em Portugal mas ainda podem ser encontradas em outras partes do mundo. Tal é o caso da Ononis hirta, que existiu nos arredores de Lisboa até 1946. Muitas delas eram plantas aquáticas ou ocorriam exclusivamente associadas a zonas húmidas.

A equipa de botânicos da Lista Vermelha acredita que estas espécies desapareceram do nosso território “devido a pressões como a poluição da água, a drenagem e a invasão por espécies exóticas”, explica um comunicado enviado à Wilder. Assim terá acontecido com a orquídea Epipactis palustris, que outrora habitava prados húmidos nas regiões do Douro e Beira Litoral.

 

Onosma tricerosperma. Foto: Miguel Porto

 

“As profundas alterações no uso do solo que se verificaram ao longo do século XX, associadas à expansão urbanística das principais cidades e à intensificação agrícola, poderão ter estado na origem da extinção de grande parte das 24 espécies avaliadas como extintas no projeto.”

Ao todo, a equipa da Lista Vermelha – com a ajuda de mais de 90 colaboradores da comunidade botânica portuguesa – avaliou o risco de extinção de cerca de 630 plantas nativas da nossa flora. Isto foi feito de acordo com os critérios e as categorias da Lista Vermelha das Espécies Ameaçadas da UICN (União Internacional para a Conservação da Natureza). Os trabalhos começaram em Outubro de 2016 e deveriam terminar em Setembro deste ano, mas foram prolongados até Junho de 2019.

Além das 24 extintas, 381 espécies foram classificadas numa categoria de ameaça.

Das 381 espécies ameaçadas, 157 estão na categoria Vulnerável, 142 estão na categoria Em Perigo e 87 estão Criticamente Em Perigo (estando 14 delas sinalizadas como potencialmente extintas em Portugal continental).

Entre as 87 plantas em risco de extinção extremamente elevado destaca-se, por exemplo, a Onosma tricerosperma subsp. tricerosperma, “uma planta que existe exclusivamente na região sul da Península Ibérica e que só recentemente foi descoberta em Portugal, na região de Beja, onde ocorre num habitat muito específico, associado a solos de gabro, uma rocha bastante rara no país”, explica o comunicado. Actualmente existe apenas um único núcleo populacional desta planta em Portugal que contém somente 20 indivíduos e que se encontra sujeito a ameaças relacionadas com a atividade agrícola.

“O segundo núcleo conhecido foi destruído recentemente devido à instalação de um pomar, que provocou a destruição de uma grande área de habitat favorável à planta.”

Na verdade, a expansão e intensificação agrícola é uma ameaça para cerca de um terço das plantas avaliadas no projeto. As zonas de Portugal mais afectadas são o Baixo Alentejo – onde os olivais tradicionais e outras culturas extensivas de sequeiro, habitat exclusivo de muitas plantas, estão a ser substituídos por culturas intensivas de regadio -, o litoral sudoeste (onde prolifera a instalação de estufas) e o oeste estremenho e do Algarve, onde tem aumentado o número de pomares em larga escala.

 

Reseda alba. Foto: A. Carapeto

 

A Lista Vermelha assinala também 81 espécies de plantas Quase Ameaçadas (NT), estando próximas de poder enquadrar-se numa categoria de ameaça a curto ou médio prazo.

Mas nem tudo são más novidades. “No âmbito dos trabalhos de campo realizados no segundo ano do projeto foram descobertas três espécies novas para a flora de Portugal e algumas populações numerosas de plantas que se julgavam muito raras ou mesmo extintas no nosso país.”

A Lista Vermelha da Flora Vascular de Portugal Continental está a ser realizado sob a coordenação da Sociedade Portuguesa de Botânica e da Associação Portuguesa de Ciência da Vegetação (PHYTOS), em parceria com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Os trabalhos de campo e em herbários de todo o país, para recolher informação sobre as plantas, já terminaram. Mas ainda decorrem as tarefas de revisão das fichas de avaliação das plantas, “prevendo-se que estejam concluídas durante o primeiro trimestre de 2019”.

O projecto culminará na publicação, em livro e suporte digital, da Lista Vermelha da Flora Vascular de Portugal Continental, prevista até meados de 2019. Este documento “ajudará a definir as prioridades de conservação” e “servirá de suporte às decisões políticas no âmbito da gestão e conservação da biodiversidade da flora em Portugal”.

Este projecto é cofinanciado pelo Fundo de Coesão da União Europeia através do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR-03-2215-FC-000013), pelo Fundo Ambiental e por fundos angariados pela Sociedade Portuguesa de Botânica, entidade beneficiária e responsável pela execução do projeto.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Acompanhe o projecto aqui e na página de Facebook https://www.facebook.com/ListaVermelhaFloraPT/.

Em Fevereiro, a Wilder foi até ao Herbário da Universidade de Lisboa para ver de perto os trabalhos para a Lista Vermelha.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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