Identificadas novas espécies de tentilhões nos Açores, Madeira e Canárias

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O trabalho, publicado na revista Molecular Phylogenetics and Evolution, revela que o tentilhão escondia, na verdade, cinco espécies diferentes e que esta ave colonizou primeiro os Açores, depois a Madeira e depois as Canárias.

A equipa de investigadores quis saber como os tentilhões (Fringilla coelebs) colonizaram a Macaronésia a partir do Continente (Portugal e Espanha) e se esta colonização dos diferentes arquipélagos resultou, ou não, no aparecimento de novas espécies.  

Tentilhão (Fringilla coelebs). Foto: Andreas Trepte/WikiCommons

Juan Carlos Illera, professor na Universidade de Oviedo e investigador no Instituto Mixto de Investigación en Biodiversidad, explica que o estudo do tentilhão é cientificamente relevante porque esta é uma ave “muito interessante para entender os processos evolutivos”. Na verdade, o mais conhecido é o tentilhão de Darwin, que Charles Darwin descobriu nas ilhas Galápagos.

Até agora, a ciência que estuda as aves, a Ornitologia, considerava o tentilhão (Fringilla coelebs) como uma única espécie, com 16 subespécies (10 delas na Macaronésia). Mas este estatuto terá de mudar muito em breve depois de uma equipa de investigadores da Universidade de Oviedo e do Conselho Superior de Investigações Científicas (CSIC) de Espanha ter descoberto que o tentilhão esconde, na realidade, até cinco espécies distintas localizadas nos Açores, Madeira, Canárias, Eurásia e Norte de África.

“Propomos que o tentilhão comum seja dividido em cinco espécies diferentes, correspondendo à Eurásia (Fringilla coelebs), Norte de África (Fringilla spodiogenys/africana), Açores (Fringilla moreletti), Madeira (Fringilla maderensis) e Ilhas Canárias (Fringilla canariensis)”, escrevem os autores no artigo científico.

Para chegar às suas conclusões, os investigadores fizeram trabalho de campo nos diferentes arquipélagos.

“Capturámos mais de 80 exemplares de cada uma das populações para extrair uma amostra mínima de sangue para estudar o seu ADN, e a seguir libertámo-los nos mesmos sítios onde os capturámos. De cada um destes exemplares analisámos mais de 100.000 genes, o que nos permitiu concluir que estamos perante espécies diferentes”, destacou.

“As implicações desta reclassificação são muito importantes porque a singularidade taxonómica dos tentilhões é muito mais relevante do que se pensava até agora. Por isso, a nossa responsabilidade para a proteger é também maior. Se, por exemplo, o tentilhão endémico das Canárias se extinguir, estaríamos perante um drama ecológico porque o mundo perderia uma espécie animal”, comentou o investigador.

Os investigadores descobriram ainda uma rota de colonização a partir do Continente em direcção primeiro aos Açores e depois dali para a Madeira e, finalmente, para as ilhas Canárias. 

Os trabalhos feitos por esta equipa de cientistas concluíram que a primeira diferenciação do tentilhão-comum aconteceu há cerca de 830 mil anos quando o antepassado dos tentilhões vulgares actuais colonizou o arquipélago dos Açores. Populações de tentilhões saltaram dos Açores para a Madeira (há 700 mil anos) e daí para as Canárias, onde chegaram há cerca de 500 mil anos.

Neste salto entre ilhas, os tentilhões foram perdendo diversidade genética. As aves dos Açores mostram uma diversidade genética surpreendentemente alta, semelhante às do Continente (a cerca de 1.300 quilómetros de distância), enquanto que as de outros arquipélagos macaronésios revelam uma perda de diversidade. Porquê? Juan Carlos Illera explica que esta perda de diversidade é esperada porque cada novo espaço é colonizado por um subconjunto de exemplares do grupo populacional anterior. Daí que a diversidade genética do tentilhão endémico das Canárias seja menor do que a dos Açores.

A investigação permitiu ainda descobrir algumas curiosidades. Uma delas é que os tentilhões dos Açores se deslocam entre as ilhas do arquipélago, enquanto que os das Canárias – que ocorrem em cinco ilhas (El Hierro, La Palma, La Gomera, Tenerife e Gran Canaria) – não se movem entre ilhas. “E não sabemos porquê”.

A equipa acredita que o processo de reconhecimento destas novas espécies seja rápido. “Fizemos uma proposta taxonómica; depois, a comunidade científica pode aceitá-la, o que sinceramente esperamos. Finalmente, serão as sociedades científicas ornitológicas que deverão reconhecer esta nova classificação”, comentou, em comunicado, Juan Carlos Illera.

O trabalho dos investigadores não acaba aqui porque o tentilhão continua a levantar novas perguntas. “Falta entender melhor todo o processo de diferenciação e o próximo passo será identificar as regiões genómicas que o explicam. Para isso será necessário estudar o seu genoma completo”.


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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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