Cogumelos Armillaria ostoyae no Sul da Alemanha. Foto: Holger Krisp/Wikimedia Commons

“Estado das plantas e fungos 2023”: Mais de dois milhões de espécies de fungos ainda estão por descobrir

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Novo relatório sobre o estado das plantas e dos fungos em 2023 diz que plantas agora descobertas para a Ciência deveriam ser listadas, por defeito, como ameaçadas.

Mais de dois milhões de espécies de fungos estão à espera de serem identificadas em todo o mundo, segundo o 5º relatório dos Reais Jardins Botânicos de Kew (Royal Botanical Gardens, RBG), no Reino Unido, revelado ontem. Este relatório, “State of the World’s Plants and Fungi 2023 – Tackling the Nature Emergency: Evidence, gaps and priorities“, foi feito por 200 investigadores de 30 países, a trabalhar em mais de 100 instituições.

Na verdade, apenas 155.000 espécies de fungos foram formalmente descritas para a Ciência.

Cogumelos Armillaria ostoyae no Sul da Alemanha. Foto: Holger Krisp/Wikimedia Commons

Até agora, as estimativas sobre o número total de fungos têm variado bastante. Mas os investigadores conseguiram chegar à estimativa mais rigorosa até à data, graças, por exemplo, a técnicas de análise de ADN do solo.

Assim, esta nova estimativa diz que o mundo alberga 2,5 milhões de espécies de fungos. Isto quer dizer que o trabalho de identificação ainda mal começou. Segundo Kew, são descritas anualmente, em média, 2.500 espécies, o que significa que levaríamos mil anos para as descrever a todas. Por isso, os cientistas sugerem usar bases de dados de ADN para transformar a forma como identificamos novas espécies.

Desde o início de 2020, mais de 8.600 espécies de plantas e mais de 10.200 espécies de fungos foram descritas para a Ciência. Algumas já estão extintas, como a orquídea Saxicolella deniseae, cujo habitat foi devastado pela construção de uma barragem.

Mas também há descobertas mais perto de casa. Uma nova espécie de nenúfar gigante, Victoria boliviana, esteve “escondida” no Herbário de Kew durante mais de 100 anos e apenas foi reconhecida como espécie diferente em 2022.

Calculando riscos

O relatório alerta, numa das mais chocantes estatísticas, que 45% das espécies de plantas com flor estão em risco de extinção.

Mas há mais. Três em cada quatro espécies de plantas ainda desconhecidas já deverão estar ameaçadas, segundo um modelo que usou dados de plantas com estatuto de conservação desconhecido para prever o risco de extinção para espécies ainda não avaliadas.

Uma orquídea Ansellia africana a crescer numa árvore. Foto: Bernard DuPont/Wikimedia Commons

Segundo o relatório, as epífitas – plantas que crescem em cima de outras plantas, como as bromélias e orquídeas – são as mais ameaçadas das plantas.

Os cientistas descobriram ainda que as plantas que apenas existem num único país e em mais nenhuma parte do mundo, chamadas endémicas, são as que têm um risco mais elevado de desaparecer.

Por isso, à luz destas conclusões, os investigadores de Kew pedem para que todas as novas espécies de plantas descritas sejam declaradas ameaçadas de extinção, por defeito, até prova em contrário.

Quanto aos fungos, apenas 0,4% das espécies conhecidas foram avaliadas para o seu estado de conservação, no âmbito da Lista Vermelha da União Internacional de Conservação da Natureza (UICN), ou seja, apenas 0,02% de todas as previstas 2,5 milhões de espécies.

“Daquilo de sabemos, os fungos estão hoje ameaçados tanto pelo uso do solo como pelas alterações climáticas”, segundo um comunicado de Kew. 

Os investigadores defendem que devemos preservar os fungos tanto no seu habitat natural como em colecções em museus de História Natural, “para lhes darmos as melhores hipóteses de sobrevivência”.

O relatório defende que identificar e descrever novas espécies de plantas e de fungos é um desafio crucial para a Ciência da Biodiversidade. Os investigadores identificaram 32 “zonas negras” da diversidade de plantas onde há grandes lacunas de conhecimento, em especial na Ásia, América do Sul e Norte e África, em países como a Colômbia, Nova Guiné, Equador, Turquia, Irão, Madagáscar e México.

Lucy Smith e o especialista em nenúfares de Kew Carlos Magdalena trabalharam juntos para identificar a Victoria boliviana. Foto: RBG Kew

“As espécies de plantas e de fungos que os cientistas ainda nem sabem que existem estão em risco de desaparecer”, segundo Kew. “Há regiões do nosso planeta que são mistérios botânicos completos. E o ritmo da descoberta desses mistérios é, talvez, demasiado lento para fazer a diferença.”

Mas os investigadores também trazem uma mensagem de esperança. “Ao sublinhar aquilo que não sabemos, isso dá-nos metas melhores para trabalhar. Ao colaborar de forma mais eficiente com cientistas por todo o mundo podemos partilhar objectivos e aprender o quê, onde e como proteger a frágil biodiversidade do nosso planeta.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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