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Cientistas seguem voos de abelharucos de Portugal e de outros dois países

12.07.2019

Equipa em que participam investigadores portugueses seguiu abelharucos de três países diferentes na Europa, incluindo Portugal, e descobriu que algumas destas aves estão a criar as suas próprias tradições. 

Desde 2015 que Joana Costa, investigadora com 30 anos ligada à Universidade de Aveiro, procura saber para onde voam os abelharucos (Merops apiaster) nas suas rotas migratórias

Estas pequenas aves coloridas fazem todos os anos milhares de quilómetros entre África e os territórios de nidificação na Europa e em parte da Ásia, incluindo Portugal, e em sentido contrário poucos meses depois. Mas até há pouco tempo, ninguém sabia muito bem onde passam os meses mais frios.

Abelharucos no concelho da Moita, distrito de Setúbal

Em 2015, Joana Costa e um grupo de voluntários começaram a colocar minúsculos geo-localizadores em abelharucos que nidificavam nas zonas de Barrancos e Idanha-a-Nova, com o objectivo de recuperarem a informação registada quando estas aves regressassem de África.

Abelharuco com geo-localizador

Foi assim possível perceber que estes abelharucos migram para a África Ocidental. “Os abelharucos que se reproduzem em Portugal, pelo menos aqueles que eu segui, invernam na faixa entre a Guiné-Bissau e a Nigéria, sendo que a maior parte prefere ficar logo perto da Guiné-Bissau ou do Senegal”, explicou Joana Costa à Wilder.

Na verdade, estas aves “dirigiram-se inicialmente para sul, atravessando o estreito de Gibraltar e a orla ocidental do deserto, no Sahara Ocidental, Mauritânia e ocidente da Argélia”, nota um artigo publicado em Maio na revista IBIS – Internacional Journal of Avian Science por uma equipa internacional de cientistas – incluindo Joana Costa e outro investigador da Universidade de Aveiro, José Alves.

Neste artigo coordenado pelo Swiss Ornithological Institute, comparou-se a rota migratória dos abelharucos portugueses com dados semelhantes obtidos com a mesma espécie noutros dois pontos da Europa.

Um dos locais de estudo ficava na outra ponta do continente europeu, no Leste da Bulgária. Foi possível concluir que as aves ali estudadas optam por uma rota migratória completamente diferente, com destino ao Sudeste Africano, sem nunca se encontrarem com aqueles que saem de Portugal.

Abelharucos junto dos ninhos, em Portugal

Já na região Centro-Leste da Alemanha, só há poucas décadas os abelharucos começaram a nidificar, influenciados pelas alterações climáticas e aproveitando a existência de minas abandonadas. Os cientistas descobriram que essas aves romperam com a tradição das outras populações europeias de que eram descendentes, seguindo caminhos diferentes para novos destinos em África.

Assim, deixam a Alemanha atravessando o Mediterrâneo junto às Ilhas Baleares, fazem uma paragem na Nigéria, e seguem depois para o sul da República do Congo e para o norte de Angola.

Por vezes, descobriram também os cientistas, alguns dos abelharucos deste grupo seguem rotas que se poderiam sobrepor às dos abelharucos portugueses, mas é pouco provável que se encontrem. Porquê? É que estes últimos “partiram dos territórios de nidificação cerca de 2,4 semanas mais cedo” do que os abelharucos da Bulgária e da Alemanha, entre meados de Julho e Agosto, e começaram a chegar aos territórios a sul do Sahara “cerca de 4,4 semanas mais cedo” do que as outras duas populações.

E esta diferença de datas acontece também quando regressam à Europa: os abelharucos costumam chegar a Portugal entre o final de Março e o início de Abril, mas só começam a ser vistos nos outros dois países cerca de um mês depois.

Abelharuco em que se nota o geo-localizador, incluindo a antena receptora de luz

O que estão a fazer em Portugal?

Neste momento, os abelharucos nascidos no final de Maio começam a migrar para África, tal como os progenitores. Durante 30 dias, as crias foram alimentadas pelos pais, ainda nos ninhos, e mesmo depois durante algum tempo quando começaram a voar, explicou à Wilder Joana Costa, que está a terminar a tese de doutoramento sobre a rota migratória e a dieta e biologia reprodutora destas aves em Portugal.

“Quando as crias estão prontas para voar, com a plumagem completamente desenvolvida, os pais começam a ‘chamá-las’, vocalizando do lado de fora do ninho para as encorajar a deixá-lo”.

Ninhos de abelharucos

É então que os pais continuam a levar-lhes alimento, até as crias conseguirem elas próprias caçar os insectos enquanto voam, adianta a investigadora portuguesa. Em Portugal, estas aves preferem insectos grandes, de preferência escaravelhos e abelhas – daí o nome comum destas aves, “sendo a abelha-do-mel (Apis mellifera) e outras abelhas da família Apidae os seus preferidos.”

Mas como é que uns e outros se encontram depois de deixarem o ninho? “Desde cedo que as crias reconhecem a vocalização dos progenitores, e vice versa, e é através deste método que pais e crias se reconhecem mutuamente”, adianta Joana.

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 Os abelharucos podem ver-se mais facilmente no Sul e Interior Centro do país. São mais fáceis de observar enquanto constroem os ninhos e na fase em que alimentam as crias, mas é necessário ter muito cuidado para não os perturbar na época de reprodução, alerta Joana Costa.

“É comum observá-los perto de barreiras de areia, barro ou argila, situadas à beira de rios ou ribeiras, ou até em barreiras junto à estrada ou areeiros abandonados. Podemos observá-los a perseguir insectos em áreas abertas ou pousados nos fios eléctricos ou ramos de árvores.”

Também pode encontrá-los através das vocalizações.


Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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