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Aves estão a pôr os ovos mais cedo e as alterações climáticas são a razão

13.04.2022
Ovos das colecções do Field Museum. Foto: Bill Strausberger

Colecções centenárias de museu de História Natural ajudam a mostrar que as aves estão a fazer os ninhos e a pôr os ovos mais cedo na Primavera.

A Primavera já chegou. As aves cantam e começam a fazer os seus ninhos. É algo que acontece todos os anos, como um relógio. 

Mas um novo estudo publicado recentemente na revista Journal of Animal Ecology mostra que muitas espécies de aves estão a fazer os seus ninhos e a pôr os ovos quase um mês mais cedo do que há cem anos atrás. Ao comparar observações recentes com ovos preservados há 100 anos nas colecções de museu, cientistas conseguiram determinar que cerca de um terço das espécies de aves nidificantes na cidade de Chicago, nos Estados Unidos, anteciparam a postura dos ovos em 25 dias, em média. E tanto quanto os cientistas podem dizer, a culpa é das alterações climáticas.

“As colecções de ovos são uma ferramenta fascinante para aprendermos sobre a ecologia das aves ao longo do tempo”, comentou, em comunicado, John Bates, curador das aves no Field Museum e principal autor do estudo. Por exemplo, esta investigação olhou para bases de dados modernas e para outras com 120 anos, o que “ajudou a responder a questões verdadeiramente cruciais sobre como as alterações climáticas estão a afectar as aves”, acrescentou.

John Bates ficou interessado em estudar as colecções de ovos de aves do museu depois de ter editado um livro sobre ovos. Estas colecções ocupam uma sala pequena e cheia de armários do chão ao tecto, repletas de centenas de ovos, a maioria deles recolhidos há cem anos. Os ovos estão cuidadosamente guardados em pequenas caixas e com etiquetas que indicam a que espécie pertencem e onde e quando foram recolhidos.

Foto: John Bates/Field Museum

Para este estudo, os investigadores analisaram duas bases de dados, uma entre 1880 e 1920 e outra de 1990 a 2015. Para o período em falta foi desenvolvido um modelo estatístico de análise de dados para extrapolar resultados.

A análise revelou uma tendência surpreendente: entre as 72 espécies para as quais há dados históricos e modernos na região de Chicago, cerca de um terço estão a fazer os ninhos cada vez mais cedo em relação ao que acontecia há 100 anos.

Quanto às razões, os investigadores analisaram os níveis de dióxido de carbono na atmosfera, reveladores das tendências de temperatura.

As alterações na temperatura ao longo dos anos parecem pequenas, de apenas alguns graus, mas mesmo essas traduzem-se em alterações nas épocas de floração de plantas e do surgimento de insectos, coisas que afectam a disponibilidade de alimento para as aves. “A maioria das aves que estudámos comem insectos e o comportamento dos insectos ao longo das estações do ano também é afectado pelo clima. As aves têm de alterar as datas da postura dos ovos para se adaptarem”, comentou John Bates.

À partida, o facto de as aves estarem a pôr ovos mais cedo pode parecer coisa pouca no esquema geral das coisas. Mas John Bates sublinha que isso faz parte de uma história maior. “As aves na nossa área de estudo, mais de 150 espécies, todas têm histórias evolutivas diferentes e biologias reprodutivas diferentes por isso tudo está nos detalhes. Estas alterações nas datas da nidificação podem levar a que tenham de competir por alimento e recursos de uma forma inteiramente nova, que desconhecem”, sublinhou. 

Ovos das colecções do Field Museum. Foto: Bill Strausberger

O investigador acredita que este estudo é um aviso quanto às alterações climáticas. Mas não só. A investigação salienta a importância das colecções de História Natural, em especial das colecções de ovos, que são tantas vezes subestimadas. “Existem cerca de cinco milhões de ovos nas colecções de todo o mundo e ainda assim são poucas as publicações que as usam”, disse Bates. “São uma arca do tesouro do passado e podem ajudar-nos a responder a perguntas importantes sobre o nosso mundo de hoje.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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