Fernanda. Foto: Xavier Castro/Galápagos Conservancy

Afinal a tartaruga-gigante da Fernandina, nas Galápagos, não está extinta, confirmam cientistas

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Cientistas sequenciaram os genomas dos únicos dois animais conhecidos da espécie tartaruga-gigante da Fernandina (Chelonoidis phantasticus), descobertos com mais de 100 anos de intervalo, nas Galápagos, no Equador. Concluíram que se trata da mesma espécie. Mas será que existem mais indivíduos ou esta será a última da sua espécie, um “endling”?

Durante décadas, o estatuto da tartaruga-gigante da Fernandina (Chelonoidis phantasticus) tem sido um mistério, com apenas um espécime conhecido desta espécie, colhido em 1906 na ilha Fernandina pelo explorador Rollo Beck, no âmbito de uma expedição da Academia de Ciências da Califórnia, São Francisco. Este macho está guardado nas colecções deste museu norte-americano.

Mais de 100 anos depois, em 2019, a descoberta de uma tartaruga solitária naquela mesma ilha, uma das mais inacessíveis das Galápagos, isolada na periferia ocidental do icónico arquipélago, deixou perplexos os biólogos evolutivos. Chamaram-lhe Fernanda, por ter sido encontrada na ilha Fernandina, e acreditaram ser apenas o segundo indivíduo conhecido a pertencer àquela espécie. Será uma fêmea com cerca de 50 anos de idade que vive no Centro de Tartarugas do Parque Nacional das Galápagos.

Fernanda. Foto: Xavier Castro/Galápagos Conservancy

Mas seria da mesma espécie?

Agora, a 9 de Junho, uma equipa de cientistas da Universidade de Yale publicou um artigo científico na revista Communications Biology, muito aguardado, com a comparação dos genomas de Fernanda e do espécime encontrado em 1906.

Este artigo revela que os dois animais são da mesma linhagem e que estão intimamente relacionados, duplicando assim o número de membros conhecidos da espécie Chelonoidis phantasticus. Os investigadores compararam ainda os seus genomas com os genomas de cada uma das 12 linhagens vivas de tartarugas-gigantes das Galápagos e de uma já extinta. E descobriram que aqueles dois indivíduos são diferentes de todas as outras espécies.

“Estes resultados sugerem a existência de uma linhagem que se acreditava há muito extinta, com uma população actual de apenas um único indivíduo”, escrevem os autores no artigo.

Acredita-se que existam 14 espécies diferentes de tartarugas-gigantes nas Ilhas Galápagos, segundo a organização não governamental Galápagos Conservancy. Todas evoluíram de um único antepassado que colonizou o arquipélago vulcânico nos últimos três milhões de anos. Desde o século XIX, estes répteis terão registado declínios entre 85 e 90%, muito por causa da chegada de baleeiros e piratas que os caçavam para comer.

Mas o mistério não acaba aqui

“A descoberta de um espécime vivo dá esperança mas também abre a porta a novas questões”, comentou, em comunicado, Adalgisa Caccone, investigadora do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da Universidade de Yale e coordenadora do estudo. “Existem outras tartarugas na Fernandina que possam ser levadas para cativeiro para começar um programa de reprodução? Como é que as tartarugas colonizaram Fernandina e qual é a sua relação evolutiva com outras tartarugas gigantes das Galápagos?”

Fernanda. Foto: Xavier Castro/Galápagos Conservancy

As tartarugas da ilha Fernandina ter-se-ão extinguido por causa de erupções vulcânicas na ilha, incluindo as 25 registadas nos últimos 200 anos. Rios de lava terão reduzido muitas áreas de vegetação.

O Parque Nacional das Galápagos e a Galápagos Conservancy pretendem agora fazer novas expedições na ilha Fernandina para procurar outras tartarugas, na esperança de recuperar esta espécie.

“Nos próximos meses, a Galápagos Conservancy e o Parque Nacional das Galápagos vão regressar à ilha Fernandina e, com o apoio de um helicóptero, explorar áreas inacessíveis a pé, na última tentativa de procurar um parceiro para Fernanda“, avança a organização em comunicado.

Na verdade, expedições recentes à ilha já encontraram vestígios que sugerem a existência de, pelo menos, mais dois a três animais na ilha, avançou Caccone. Se forem encontradas mais tartarugas, disse a investigadora, os conservacionistas poderão iniciar um programa de reprodução em cativeiro.

Estas tartarugas “têm um papel ecológico muito importante”, lembrou Caccone. “Por isso, protegê-las é importante não apenas por causa do seu estatuto icónico mas também porque são um agente crucial de estabilidade do ecossistema das Galápagos.”

“Ainda há muitas coisas que não sabemos e aquilo que aprendermos vai orientar-nos e ajudar-nos a proteger estes animais e com eles o lugar frágil e único na Terra a que chamam casa.”

Para a organização Galápagos Conservancy, “Fernanda é um símbolo de esperança e um apelo à acção pela conservação nas Galápagos. A sua mera existência, depois de mais de 100 anos de uma presumível extinção, é incrível. A sua história vai tornar-se numa tragédia se seguir o mesmo caminho do Lonesome George, a última tartaruga-gigante-das-Galápagos-de-pinta (Chelonoidis niger abingdonii) que morreu em 2012.”

“Mesmo que Fernanda seja o “endling” da sua espécie, ela representa uma descoberta entusiasmante que dá esperança de que mesmo uma espécie há muito desaparecida possa, ainda assim, sobreviver”, escrevem os autores no artigo.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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