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Borboleta azulinha-comum. Foto: Charles J. Sharp/Wiki Commons

Como criar um jardim para borboletas?

22.03.2024

Na série “Abra espaço para a natureza”, Carine Azevedo responde às dúvidas que temos quando pensamos em tornar um espaço mais amigo do mundo natural. Desta vez, Carine fala-nos da experiência que tem tido com o seu próprio jardim, no que respeita a estes insetos coloridos.

Com a chegada da primavera, chegam também muitas borboletas, marcando o reinício de um ciclo. É importante destacar o papel significativo que as borboletas desempenham nos ecossistemas, pois a sua participação na polinização das plantas é imprescindível para a reprodução de muitas espécies vegetais. Além disso, servem de fonte de alimento para várias espécies de aves, insetos e outros animais, contribuindo diretamente para o equilíbrio ecológico dos ambientes em que habitam. 

As borboletas, encantadoras e efémeras, conferem uma atmosfera mágica e uma beleza singular aos jardins. No meu jardim tive o cuidado de escolher espécies que atraem estas criaturas de cores vibrantes e movimentos graciosos, que são um verdadeiro espetáculo da natureza.

Atrair estes visitantes é fácil, basta seguir algumas dicas simples. Saiba como o pode fazer.

Escolha das plantas certas

Escolher as plantas adequadas é fundamental para criar um jardim acolhedor para estes insetos polinizadores, também chamados de lepidópteros. As borboletas são atraídas por plantas com flores ricas em néctar e que lhes fornecem proteção e refúgio durante as diferentes fases de vida.

As plantas nativas são essenciais para atrair e sustentar as borboletas nos jardins, desde logo porque estão bem-adaptadas às condições ecológicas da região e são menos exigentes em manutenção. Ao incluirmos plantas autóctones no jardim estamos a criar um habitat mais autêntico e favorável às borboletas nativas, promovendo a biodiversidade e contribuindo para a conservação das espécies.

Em Portugal, é vasta a riqueza florística que pode embelezar os jardins e atrair estes delicados visitantes. Plantas como o rosmaninho (Lavandula stoechas), o alecrim (Salvia rosmarinus), a erva-cidreira (Melissa officinalis), o milefólio (Achillea millefolium), a sálvia (Salvia spp.), o tomilho (Thymus spp.), a estevinha (Cistus salviifolius), as malvas (Lavatera trimestris), os suspiros-roxos (Scabiosa atropurpurea), a margaça-de-inverno (Chamaemelum fuscatum), a santolina (Santolina rosmarinifolia) e a esteva (Cistus ladanifer), são apenas algumas das muitas plantas nativas de Portugal que podem compor um jardim florido e atrair e apoiar as borboletas.

Criar um ambiente acolhedor

Pedras e flores, num recanto de jardim. Foto: Carine Azevedo

Além de escolher as plantas certas, é essencial fornecer condições para o descanso e a reprodução das borboletas. Estas apreciam áreas ensolaradas para se aquecerem e recarregar “baterias”, mas também precisam de áreas sombreadas com vegetação densa, para se abrigarem em dias de mau tempo.

É importante incluir zonas com exposição solar plena, onde as borboletas possam pousar e absorver o calor e contemplar áreas de sombra que lhes servirão de abrigo em dias quentes, de vento ou de chuva. Elementos como pedras e pequenos troncos podem ser incorporados para criar refúgios naturais, enquanto pequenas poças de água ou fontes oferecem locais onde podem beber e refrescar-se.

Ao seguir estas orientações simples, estará a criar um jardim florido e atrativo e a proporcionar um ambiente acolhedor e diversificado a estes preciosos polinizadores, contribuindo para a preservação da biodiversidade e para a beleza natural do seu próprio jardim.

Um jardim amigo das borboletas

No meu pequeno jardim tenho trabalhado nesse sentido. Quando desenvolvi o seu design tive em consideração alguns aspetos que me parecem fundamentais para integrar harmoniosamente todos estes elementos e criar um ambiente verdadeiramente acolhedor.

Tenho dedicado especial atenção à diversidade vegetal, procurando incluir uma ampla diversidade de plantas nativas que florescem em diferentes épocas do ano. Esta diversidade tem atraído uma multiplicidade de borboletas, cada uma com padrões e cores únicas, transformando o jardim num verdadeiro espetáculo de cores e movimento.

Um espaço aberto é outra condição ideal para atrair uma grande variedade de espécies deste grupo, uma vez que as áreas ensolaradas tornam-se verdadeiros pontos de encontro de borboletas que ali se aquecem ao sol e se alimentam do néctar das flores. Já as zonas de sombra, com vegetação densa, oferecem refúgio nos dias mais quentes.

Borboleta-das-couves. Foto: Willfried Wende/Pixabay

As pedras com formatos irregulares, que coloquei estrategicamente por todo o jardim, têm sido locais privilegiados de abrigo, além de permitirem a acumulação de água nas suas aberturas – um convite irresistível para as borboletas se hidratarem, descansarem e se reproduzirem.

Como acontece com qualquer espaço verde, se quisermos mantê-lo atrativo para estes insetos, é fundamental cuidar adequadamente de todas as plantas. Regar, limpar e fertilizar ajudam a promover o crescimento saudável e estimulam a floração.

Por outro lado, muitas das “ervas daninhas” são plantas silvestres importantes e podem ser hospedeiras de algumas espécies de borboletas que aí depositam os seus ovos ou servirem de alimento na fase larvar (lagarta), por isso, é necessário algum cuidado na sua remoção. Idealmente, devemos mantê-las até que floresçam e desde que não compitam pelo espaço e pelos nutrientes do solo com as restantes plantas que servirão de alimento a muitas borboletas na fase adulta.

Manter o jardim limpo é também importante para criarmos um ambiente acolhedor para as borboletas adultas. No entanto, é igualmente lembrar que o ciclo de vida dos lepidópteros começa muito antes e estes podem estar no nosso jardim mesmo quando não vemos as suas belas asas coloridas: desde a fase dos ovos até às larvas e pupas, as borboletas passam uma série de estágios de desenvolvimento antes de emergirem como os seres alados que tanto gostamos de ver.

Outro aspecto importante, a que dou especial atenção, está relacionado com o uso de pesticidas e de fertilizantes químicos, já que estes são prejudiciais a todos os insetos polinizadores que visitam o meu jardim. Assim, para promover a saúde do solo, uso composto orgânico ou produtos biológicos que não sejam nocivos. Já para controlar pragas, opto sempre que possível por métodos de controlo naturais, usando plantas repelentes, por exemplo.

Borboletas do meu jardim

Foto: Carine Azevedo

É por isso que o meu jardim tem atraído uma variedade encantadora de borboletas, cada uma com as suas preferências específicas. Por entre as flores dos tomilhos (Thymus spp.), do alecrim (Salvia rosmarinus), do rosmaninho (Lavandula stoechas), da estevinha (Cistus salviifolius), do rosmaninho-maior (Lavandula pedunculata), da relva-do-olimpo (Armeria maritima), da arméria-das-praias (Armeria pungens), da murta (Myrtus communis), a carvalhinha (Teucrium chamaedrys), a roselha (Cistus crispus), a esteva (Cistus ladanifer), as boninas (Bellis perennis), os suspiros-roxos (Scabiosa atropurpurea), a margaça-de-inverno (Chamaemelum fuscatum), a flor-de-mel (Lobularia maritima), a erva-cidreira (Melissa officinalis), a arruda (Ruta chalepensis), o funcho (Foeniculum vulgare), entre outras, das espécies de borboletas que tenho observado, destacam-se:

– a borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon),

borboleta cauda-de-andorinha vista de cima, pousada numa flor
Borboleta-cauda-de-andorinha. Foto: Uoaei1/Wiki Commons

– a borboleta-das-couves (Pieris rapae e Pieris brassicae),

– a borboleta-maravilha (Colias croceus),

– a almirante-vermelho (Vanessa atalanta),

– a borboleta-limão (Gonepteryx rhamni),

Borboleta almirante-vermelho. Foto: Kristian Peters/Wiki Commons

– a azulinha-comum (Polyommatus icarus),

– a borboleta-loba (Maniola jurtina).

Muitas destas espécies são apenas viajantes de passagem, mas outras já aqui habitam todo o ano, uma vez que já encontrei ovos, larvas e pupas de algumas.

A borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon), por exemplo, coloca ovos na arruda (Ruta chalepensis) e no funcho (Foeniculum vulgare). E é destas plantas que também se alimentam as lagartas. Já a borboleta-da-couve (Pieris rapae e Pieris brassicae) coloca ovos na página inferior das couves do quintal, das quais também se alimentam na fase larvar.

Para que as restantes se tornem “residentes” tenho de ter em conta quais são as suas plantas hospedeiras, já que aí depositarão os seus ovos e se alimentarão na fase larvar:

– Borboleta-maravilha (Colias croceus) – plantas da família Fabaceae (Leguminosae), como a luzerna (Medicago spp.) e o trevo (Trifolium spp.).

Borboleta-maravilha (fêmea). Foto: Jean-Pol-Grandmont/Wiki Commons

– Almirante-vermelho (Vanessa atalanta) – plantas da família Urticaceae, tais como a urtiga (Urtica spp.) e a parietaria (Parietaria spp.).

– Borboleta-limão (Gonepteryx rhamni) – plantas da família Rhamnaceae, por exemplo, sanguinho-das-sebes (Rhamnus alaternus) e sanguinho-de-água (Frangula alnus). 

– Azulinha-comum (Polyommatus icarus) – plantas da família Fabaceae (Leguminosae) como o trevo-branco (Trifolium repens), o trevinho (Trifolium dubium), o cornichão-comum (Lotus corniculatus), a luzerna-preta (Medicago lupulina) e muitas outras.

Borboleta azulinha-comum. Foto: Charles J. Sharp/Wiki Commons

– Borboleta-loba (Maniola jurtina) – as suas lagartas alimentam-se de várias espécies da família Poaceae como cabelo-de-cão-comum (Poa trivialis), cabelo-de-cão-dos-prados (Poa pratensis), panasco (Dactylis glomerata), braquipódio-do-bosque (Brachypodium sylvaticum), entre outras.

Observar as borboletas entre as flores do meu jardim é uma experiência verdadeiramente gratificante e inspiradora. Cada uma traz consigo uma beleza única e a certeza de que tenho contribuído para a conservação da biodiversidade.

O meu pequeno jardim é um espaço natural e acolhedor para estes pequenos seres e muitos outros polinizadores que o visitam.

Na série “Abra espaço para a natureza” encontrará mais alguma informação que ajudará na escolha das espécies e nos cuidados a ter com as suas plantas. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas”, irá encontrar um vasto leque de espécies nativas que se poderão adequar às diferentes condições do seu jardim.

Aproveite para partilhar as fotos do seu jardim nas redes sociais com #jardimtemático e no Instagram, comigo (@biodiversityinportuguese) e com a Wilder (@wilder_mag).


Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

Para acções de consultoria, pode contactá-la no email [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.


A SPEA-Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves patrocina a secção “Seja um Naturalista”.

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