Foto: Opuntia/Wiki Commons

O que procurar no Verão: nenúfar-amarelo e nenúfar-branco

Início

Quando pensamos em nenúfares somos transportados, na maioria das vezes, para ambientes exóticos e tropicais. Mas estas plantas aquáticas estão presentes em ambientes de água doce, tanto em regiões tropicais como temperadas. 

Os nenúfares são plantas que crescem em ecossistemas lênticos, ou seja, ambientes aquáticos de águas paradas ou lentas, nomeadamente mangais, pântanos, ribeiras e margens de lagos.

Estas plantas, para além de belas, têm diversas funções biológicas úteis para os lagos, para tanques e para qualquer lençol de água onde habitam.

Em Portugal existem duas espécies nativas lindíssimas, que precisam de cuidado e atenção. O nenúfar-amarelo (Nuphar lutea subsp. luteum) e o nenúfar-branco (Nymphaea alba), espécies da família Nymphaeaceae.

O Nenúfar-amarelo

O nenúfar-amarelo (Nuphar lutea subsp. luteum), também conhecido de boleira-amarela, figos-de-rio-amarelos, golfão-amarelo, é o maior dos nenúfares nativos. É uma planta aquática, com rizoma horizontal, carnudo e grosso. As folhas e flores emergem acima da água cerca de 30 centímetros, em pecíolos longos e separados. 

Foto: Anglia/Wiki Commons

As folhas são grandes, inteiras, planas, elípticas a obtusas, em forma de coração. De cor verde-escuro, levemente coriáceas, apresentam margem inteira, por vezes ondulada e com um recorte basal, bastante marcado e profundo. Geralmente flutuam na água ou então ficam eretas ligeiramente acima da mesma. 

As flores são flutuantes, solitárias, globulares e perfumadas, e podem ter entre 4 a 6 centímetros de diâmetro. A corola possui numerosas pétalas, cerca de 20, dispostas em espiral. As pétalas são obovadas, amarelas e brilhantes, geralmente mais pequenas do que as sépalas que as envolvem. As sépalas são cinco, glabras e verdes na parte exterior e amarelas internamente. 

O período de floração do nenúfar-amarelo é longo, podendo ocorrer a partir de março até setembro. No entanto, a maior profusão de flores ocorre nos meses de verão, de julho a setembro.

O fruto é ovóide a cónico, em forma de garrafa ou de pêra e, geralmente, mantém-se a flutuar na água até libertar as suas pequenas sementes.

Foto: Kristian Peters/Wiki Commons

Ao contrário da maioria dos nenúfares, esta espécie pode manter as folhas flutuantes durante todo o inverno. 

A designação científica do nenúfar-amarelo está muito relacionada com as suas características morfológicas. O nome do género Nuphar é o nome latino, de origem árabe, dado ao nenúfar ou ao lírio-de-água, nome comum pelo qual é conhecido em outras regiões do mundo. O restritivo específico lutea deriva do latim e deve-se à cor amarela das pétalas.

O Nenúfar-branco

O nenúfar-branco (Nymphaea alba), conhecido por golfão-branco, boleira-branca, figos-de-rio e adargas-de-rio, possui também caule subterrâneo (rizoma), horizontal e aquático, e folhas e flores flutuantes sustentadas por longos pecíolos.

Foto: Opuntia/Wiki Commons

As folhas são carnudas, cerosas, verde-escuras na página superior e avermelhadas na página inferior. As folhas inferiores encontram-se geralmente submersas e as folhas superiores surgem flutuantes ou por vezes emergidas, em pecíolos longos. 

Ao contrário do nenúfar-amarelo, esta espécie perde as folhas durante o inverno.

As flores são hermafroditas, ligeiramente perfumadas, flutuantes, e podem ter entre 5 a 12 centímetros de diâmetro. A corola é composta por pétalas brancas, oblongas a ovais. O cálice é composto por quatro sépalas ligeiramente coriáceas, lanceoladas e glabras, verdes externamente e brancas interiormente.

Foto: DaniKauf/Wiki Commons

A floração do nenúfar-branco ocorre geralmente durante a primavera, entre os meses de abril e maio, mas pode prolongar-se até ao final do verão.

O fruto é ovóide a esférico e amadurece debaixo de água, libertando as sementes lisas e flutuantes.  

A designação científica desta espécie é também bastante particular. O nome genérico Nymphaea deriva do grego nymphaia que significa ninfa – divindade associada a corpos de água, nome grego dado aos nenúfares e aos lírios-de-água, das águas. O termo alba deriva do latim albus, que significa albo, branco.

Reis dos lagos

O nenúfar-amarelo e o nenúfar-branco possuem uma distribuição nativa muito próxima. São espécies nativas da Europa, Oeste da Ásia e Norte de África. Em Portugal, surgem espontaneamente um pouco por todo o território continental, sendo mais comuns na faixa do litoral, em ambientes de água doce estagnada ou de corrente fraca, habitualmente em locais de meia sombra ou pleno sol e em solos arenosos e pobres. O nenúfar-branco também ocorre no arquipélago dos Açores, onde foi introduzido.

Ambas as espécies são muito ornamentais. No entanto, as populações nativas do nenúfar-amarelo encontram-se em declínio em Portugal, tendo já desaparecido de várias zonas húmidas. O nenúfar-branco é mais comum, sendo muito usado como elemento decorativo de jardins aquáticos, em tanques e pequenos lagos.

Os nenúfares e as plantas aquáticas, em geral, possuem uma elevada importância ecológica. Têm a função de absorver nutrientes em demasia e oxigenar a água, ao mesmo tempo que autorregulam a temperatura daquela e sustentam a vida aquática.

Foto: Francisco M. Marzoa Alonso/Wiki Commons

Estas plantas fornecem sombra, abrigo e alimento a muitos animais aquáticos. Durante o inverno a área foliar destas espécies é reduzida, o que facilita a entrada de luz no lençol de água onde habitam. No verão, a vasta camada de folhas flutuantes que formam à superfície da água evita que esta aqueça excessivamente, além de reduzir a incidência de raios UV. 

Além destes benefícios, os nenúfares também servem de suporte para rãs, sapos e outros animais que vivem em ambiente aquático e que gostam de permanecer à superfície da água por algum tempo.

Propriedades terapêuticas 

Além do interesse ornamental e ecológico, estas espécies também possuem propriedades terapêuticas muito interessantes, sendo-lhes apontadas propriedades anódinas, antiespasmódicas, adstringentes, cardiotónicas, emolientes, hipotensores, entre outras.

As flores são anafrodisíacas e sedativas, muito devido à presença de nupharine e nympaeine, substâncias com efeito calmante e sedativo sobre o sistema nervoso e que supostamente reduzem o impulso sexual. Também são usadas no tratamento de insónias, ansiedade e outros distúrbios semelhantes. 

Estudos recentes revelam que o nenúfar-amarelo possui um papel importante no tratamento de inúmeras doenças, muito devido a um vasto leque de compostos químicos (em particular alcalóides) capazes de “morte celular programada”, uma nova abordagem para o tratamento de doenças como o cancro, Alzheimer, Parkinson, entre outras.

Foto: H. Zell/Wiki Commons

Já o nenúfar-branco pode ser usado externamente para o tratamento de queimaduras, inflamação da pele, úlceras e abcessos. Também pode ser usado no tratamento de catarro, dores renais, disenteria e diarreia. Também lhe foi conferido um papel importante no tratamento do cancro uterino.

Estes nenúfares também foram durante muitos anos conhecidos como uma valiosa fonte de alimento. Alguns povos e tribos de várias regiões do mundo, onde estas espécies são nativas, colhiam os rizomas e sementes para a confecção de farinhas ricas em amido e proteína. As sementes eram torradas e usadas como substituto do café ou então, depois de cozinhadas, davam origem a uma “pipoca” crocante (Kershaw).

Por todas estas razões, numa próxima saída junto a lagos, lagoas ou outros cursos de água, explore a beleza destes nenúfares e lembre-se de que, além da beleza das suas flores, possuem um papel muito importante na conservação da fauna e flora aquática, bem como da qualidade da água. Por isso é muito importante a sua conservação. 


Dicionário informal do mundo vegetal:

Pecíolo – pé da folha que liga o limbo ao caule.

Elíptica – folha com forma que lembra uma elipse, mais larga no meio e com um comprimento que é duas vezes a largura.

Obtusa – folha cuja forma termina em ângulo obtuso.

Coriácea – que tem uma textura semelhante à casca da castanha ou do couro.

Obovada – pétala com a forma de um ovo invertido, mais estreita na base do que no ápice.

Oblonga – pétala com forma alongada e estreita e com os polos arredondados.

Lanceolada – sépala com a forma semelhante a uma lança.

Glabra – sem pelos.


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

Para acções de consultoria, pode contactá-la no mail [email protected]. E pode segui-la também no Instagram.

Don't Miss