Uma jovem fêmea de lince-ibérico (Lynx pardinus) percorreu cerca de 150 quilómetros entre Doñana (Espanha) onde nasceu e o Parque Natural do Vale do Guadiana, em Portugal. Este é o quarto caso conhecido de linces que, partindo de Doñana, conseguiram chegar a Mértola.
Nairobi é uma fêmea de ano e meio que nasceu no núcleo oriental da população de linces de Doñana, mais concretamente na zona de Puebla del Río (Sevilla). Segundo o último censo de lince-ibérico vivem em Doñana 76 animais desta espécie Em Perigo de extinção, com uma população mundial de 483 animais.
Em meados de Setembro, a equipa de seguimento do programa de conservação Iberlince em Doñana recebeu uma fotografia de um lince, captada a 15 de Agosto na área de reintrodução de linces do Parque Natural do Vale do Guadiana.
O animal foi identificado como sendo Nairobi. Esta fêmea foi fotografada pela última vez no território da sua progenitora em finais de Maio. Voltou a ser detectada dois meses e meio depois em Mértola, a cerca de 150 quilómetros de distância em linha recta, revelou ontem em comunicado o Iberlince.
O mais curioso é que Nairobi é irmã do macho Mundo, um lince de Doñana localizado também em Portugal (mais concretamente em Serpa) em Abril. Já foi confirmada a sua reprodução, com sucesso, nesta temporada.
“Tudo aponta para que esta família de Doñana tenha um ‘gene viajante’ que facilita estas deslocações de dispersão a longas distâncias, muito importantes para a comunicação entre as diferentes populações e que aumentam em muito a viabilidade da espécie a longo prazo”, explica o Iberlince.
Com esta nova dispersão, de Nairobi, já são quatro os linces conhecidos que, partindo de Doñana, conseguiram chegar a Portugal.
A viagem de Nairobi mostra que há uma ligação real entre duas populações selvagens de lince-ibérico, com um corredor natural entre Portugal e Espanha. Até agora pensava-se que a população do Parque Nacional de Doñana “estava perigosamente isolada de outras áreas de ocorrência de lince e muitos animais, aí nascidos, não conseguiam uma dispersão bem sucedida”, comentou anteriormente o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
A população de Doñana, com uma baixa variabilidade genética, tem recebido especial atenção do projecto Iberlince, que quer recuperar a distribuição histórica do lince-ibérico. Trabalhar para ligar as novas populações de linces às populações estáveis da Andaluzia tem sido uma das prioridades na conservação da espécie para 2017.
Tanto mais que o lince-ibérico tem uma das menores diversidades genéticas do mundo, foi revelado em Dezembro passado por uma equipa de 50 cientistas que conseguiu sequenciar o genoma da espécie. A investigação, publicada na revista Genome Biology, concluiu que o ADN do lince-ibérico sofre de uma “erosão extrema”. Na verdade, o genoma do felino das barbas tem menos diversidade genética do que outros mamíferos ameaçados, como o diabo-da-Tasmânia, ou de aves, como o íbis-japonês.