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Descoberta nova espécie de escaravelho na Serra da Estrela

17.09.2015

Há um pequeno escaravelho subterrâneo, de cor avermelhada e com menos de nove milímetros, que vive numa gruta natural na encosta da Serra Estrela. Foi descoberto agora para a Ciência e, que se saiba, não existe em mais lugar nenhum do planeta. O Buraco da Moura é todo o seu território.

 

Diz quem o descobriu que é um predador veloz. Com as suas antenas e corpo alongado, este escaravelho subterrâneo detecta e caça as suas presas, como minúsculos ácaros, por entre as fissuras das rochas no Buraco da Moura, perto da Lapa dos Dinheiros (Seia).

Chama-se Domene viriatoi – em homenagem a Viriato, considerado o maior líder militar dos Lusitanos e que terá vivido nos Montes Hermínios, hoje a Serra da Estrela – e foi descoberto por investigadores do cE3c (Centre for Ecology, Evolution and Environmental Changes) das Universidades de Lisboa e dos Açores, em colaboração com o CISE (Centro de Interpretação da Serra da Estrela).

“Esta é uma espécie nova para todo o mundo, como qualquer espécie nova para a ciência o deve ser. Até alguém a encontrar em qualquer outro lugar que não o Buraco da Moura, podemos afirmar que apenas se encontra neste local do concelho de Seia”, disse à Wilder Artur Serrano, entomólogo daquele centro e coordenador do estudo, publicado agora na revista Zootaxa.

Entre Abril e Outubro de 2013 e 2014, investigadores estudaram a diversidade de artrópodes terrestres do Buraco da Moura, cavidade natural formada por grandes blocos de granito e túneis escavados pela passagem de águas interiores. Esta gruta tem reconhecida importância para a natureza, sendo abrigo para espécies protegidas de morcegos e para a salamandra lusitânica.

“Tendo em consideração a entrada do Buraco da Moura, e apesar de se terem prospectado várias câmaras do mesmo, apenas foi encontrado nas pequenas câmaras situadas mais ou menos a 50 m e a 60 m da entrada”, acrescentou Artur Serrano.

A equipa de investigadores encontrou indivíduos adultos e larvas, em duas galerias do Buraco da Moura. “A espécie desenvolveu-se para se adaptar às condições subterrâneas, nomeadamente à pouca luz”, descreve Mário Boieiro, investigador do mesmo centro que participou no estudo. “Não tem olhos desenvolvidos, não tem asas de voo, tem o corpo e os apêndices alongados para detectar presas e predadores”, acrescenta.

 

Vivemos num hotspot de biodiversidade para os escaravelhos subterrâneos

 

Na última década foram descritas cerca de 40 espécies de escaravelhos, tornando a Península Ibérica num hotspot de biodiversidade para os escaravelhos subterrâneos, segundo o artigo científico publicado na Zootaxa.

O pequeno escaravelho descrito agora pertence ao género Domene, que tem 20 espécies conhecidas na Península Ibérica. Todas menos uma só existem aqui e têm distribuições muito limitadas.

“A distinção entre a nova espécie e as outras do mesmo género faz-se através de diversos caracteres morfológicos externos da cabeça, tórax e abdómen, com ênfase para aquilo que os entomólogos designam por genitália ou aparelho reprodutor externo”, explica Artur Serrano. “A certeza de que estávamos perante uma espécie nova de Domene só foi confirmada ao fim de alguns meses, após a aquisição e consulta de toda a bibliografia relacionada com este grupo de coleópteros. Após esta fase, que requer muito trabalho de prospecção e análise bibliográfica, chegámos então à conclusão definitiva que estávamos perante uma espécie nova para a ciência.”

Nas últimas décadas tem-se reforçado o estudo dos artrópodes terrestres que vivem em habitats subterrâneos na Península Ibérica. “Mas ainda se sabe pouco sobre estes micro-habitats”, diz Mário Boieiro à Wilder.

O trabalho no Buraco da Moura só mostra que há muitas surpresas ainda por descobrir.

Segundo Artur Serrano, “o conhecimento dos artrópodes em Portugal é ainda, de um modo geral, deficitário. Para uma boa parte dos grupos desconhecem-se aspectos relacionados com a sua biodiversidade, abundância, distribuição e ecologia”, acrescenta.

Para o futuro, este investigador gostava de ver “mais financiamento para projectos sobre biodiversidade de artrópodes, maior incentivo e aposta na formação de entomologistas, assim como numa maior divulgação da sua importância”. Isto porque, apesar de pequenos, estes escaravelhos têm um papel muito relevante nos ecossistemas. Por exemplo, ajudam a fazer a reciclagem de nutrientes e a polinização de pomares e de plantas hortícolas.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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