Daniel Veríssimo, um economista fascinado pela natureza, dá-nos a conhecer estas algas que são a base de uma rica biodiversidade e também de actividades económicas, que hoje sobrevivem em poucos locais da costa portuguesa.
Florestas de algas gigantes, espalhadas por um quarto das zonas costeiras do mundo, são peças chave em ecossistemas marinhos, suportam uma grande diversidade e abundância de vida mas são incrivelmente esquecidas. No mar português existem sete espécies de algas gigantes, que também podem dar pelo nome de laminárias, sargaço, ou ainda limo-correia.
Em águas marinhas portuguesas, existem as seguintes espécies nativas: Laminaria hyperborean, Laminaria ochroleuca, Saccorhiza polyschides, Saccharina latissima, Phyllariopsis brevipes e Phyllariopsis purpurascens. De vários tamanhos, formatos e longevidades, estas algas criam ecossistemas altamente produtivos, ricos e dinâmicos. Já a espécie Undaria pinnatifida é natural do Japão e foi introduzida na Europa, sendo uma alga invasora.
No passado, a apanha de sargaço, como são conhecidas estas algas no Norte do país, era a base de uma valiosa indústria. Foi legislada por D. Dinis em 1308 e no século XX recorria-se ao sargaço para fazer agar, uma substância gelatinosa que era exportada para o Japão. Ainda hoje, em partes do Norte e da Galiza, estas algas são usadas como fertilizante para os campos agrícolas.
Contudo, as florestas de laminárias enfrentam várias ameaças: a pesca de arrasto que destrói o fundo marinho, a poluição química, por plásticos, e ainda o aumento de carbono na atmosfera e a consequente acidificação dos oceanos, que altera as condições para as algas se desenvolverem. Além disso, o aumento da temperatura média da água do mar, devido às alterações climáticas, coloca um fator extra de stress nas florestas de kelp.
Apesar de ainda haver algumas zonas com algas gigantes na zona de Caminha, que fica a Norte, ao largo de Cascais e no Cabo Espichel, ao longo da Costa Vicentina e ainda no extremo oriental dos Açores, essas são áreas pequenas comparadas com a distribuição histórica ou potencial dessas espécies. Zonas de afloramento costeiro (‘upwhelling systems‘), como a costa portuguesa, têm condições ideais para florestas de algas gigantes. As florestas de laminárias precisam de áreas com alguma luminosidade e que sejam algo rochosas para se fixarem, e também de uma água rica em nutrientes.
É o que acontece nos afloramentos costeiros: quando a água fria das profundezas, onde abundam os nutrientes, encontra a água quente da superfície, desencadeia-se uma explosão de vida. São por isso zonas que oferecem as condições ideais.
Existem várias medidas que podem ser tomadas para recuperar as florestas de algas gigantes em Portugal, incluindo proteger zonas marinhas costeiras e criar mais áreas protegidas marinhas, diminuir as ameaças, como a pesca de arrasto ou as redes de pesca abandonadas, e promover a regeneração de florestas de kelp, por exemplo através da criação de recifes artificiais ou repovoamentos. É urgente restaurar as florestas de algas gigantes no mar português, com escala, de uma maneira duradoura e com participação de comunidades locais, como pescadores e ONGs. Existem bons exemplos práticos em várias partes do mundo, como no caso da Coreia do Sul, dos Estados Unidos ou do Japão, literatura científica desenvolvida, e todos podemos contribuir de alguma forma.
O financiamento para o restauro das florestas de algas gigantes pode ser feito através de subsídios para a pesca, uma vez que o restauro de zonas marinhas aumenta o tamanho das pescarias e ajuda a recuperar stocks de peixes, sendo por isso um bom investimento para essa indústria. Florestas de algas gigantes, saudáveis, funcionais e em escala garantem vários benefícios económicos: além do aumento das populações de peixes, são berçários para várias espécies, asseguram o sequestro de carbono, uma vez que as florestas de laminárias armazenam grandes quantidades de carbono, filtram o excesso de nutrientes e ainda oxigenam a água. Estes serviços ecossistémicos representam vários milhares de milhões de euros ao ano.
Mas não se trata apenas de uma espécie, mas sim de um conjunto de espécies, que estão interligadas de várias e surpreendentes maneiras na teia da vida. A este nível, existem várias interações ecológicas perdidas que podem ser recuperadas. Focas-monge a caçar polvos entre algas gigantes na costa portuguesa. Recifes de ostras a criar as condições para as algas gigantes crescerem. Cardumes de peixes a passar entre algas gigantes. Águias-rabalva a pescar na linha de água, no topo de florestas de algas gigantes. Cabras montesas a comer laminárias arrojadas nas praias escarpadas da Arrábida, veados e gamos a alimentarem-se de algas arrojadas nas praias quase desertas do Litoral Norte.
Fazer um mergulho guiado, junto à costa, para ver uma floresta de algas gigantes restaurada e ser maravilhado com a complexidade de um ecossistema vivo, vendo um manto verde com cardumes de peixes cintilantes e com lulas e polvos. Quiçá até provar algas gigantes com sabor forte a mar, ricas em nutrientes e vitaminas. No fim, na viagem de regresso ao porto, com o sol a cintilar na ondulação do mar, ouvir histórias de cabras montesas, gamos e veados a deliciarem-se com algas marinhas à noite nas praias.
As zonas marinhas são algumas das áreas com maior potencial para restauro ecológico, para recuperar a abundância e variedade de vida, para restabelecer o esplendor da natureza, mas continuam surpreendentemente esquecidas. Numa altura em que o ser humano precisa de aprender a viver dentro dos limites do planeta, o restauro de zonas marinhas não pode continuar esquecido.
As florestas de algas gigantes podem voltar ao mar de Portugal.
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