Foto: Helena Geraldes

Uma visita ao novo Jardim Gulbenkian

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O espaço verde da Fundação Gulbenkian, em Lisboa, cresceu quase um hectare. Após vários meses de obras, juntamente com um Centro de Arte Moderna renovado, este pedaço novo do jardim abre ao público este sábado, 21 de setembro. Fomos conhecer.

A poucos dias da abertura ao público, a azáfama dos últimos momentos de obra ainda se sente na nova zona sul do Jardim Gulbenkian, junto à Marquês Sá da Bandeira e à avenida Duque de Ávila. Operários de capacete tiram dúvidas com membros da equipa de projeto, atarefados, mas por ali também anda uma comitiva de visitantes, por baixo da nova pala de inspiração japonesa do Centro de Arte Moderna, também ele renovado, e uma equipa técnica e de produção da RTP, que dali a poucas horas vai transmitir o noticiário em direto.

Vista parcial dos limites do novo espaço do jardim. Foto: Helena Geraldes

Mas basta virarmos costas e rapidamente nos sentimos longe do burburinho. Agora que a confusão e o barulho das grandes obras de muitos meses já não se fazem sentir, a vida silvestre tem vindo a reabitar este espaço do jardim, com pouco mais de 8000 metros quadrados. Junto a dois novos pontos de água – um lago onde despontam folhas de nenúfar e um pequeno charco bordejado por grandes pedras trazidas da aldeia de Prazeres, no Alentejo – voam libélulas e libelinhas que aproveitam a água neste dia de calor. Uma das libélulas saltita calmamente na vertical, sobre o lago, a depositar os ovos.

A bordejar o pequeno charco, veem-se vários pedregulhos vindos da aldeia alentejana de Prazeres. Foto: Helena Geraldes

“Já encontrámos aqui estorninhos a nidificar”, diz Paula Corte Real, que colaborou com a implementação do novo projeto e nos guia na visita. Até agora, explica entusiasmada, só se conheciam estorninhos invernantes no espaço verde da fundação. Enquanto passeamos, uma toutinegra-de-barrete e um chapim saltitam nos arbustos e árvores em redor, que incluem várias espécies novas. “Tudo o que foi plantado foram espécies autóctones”, sublinha a arquiteta paisagista ligada ao Jardim Gulbenkian, enquanto vai apontando amieiros, sobreiros, medronheiros, carrascos e carvalhiças. Hipericão-do-gerez, murtas, sanguíneos-dos-ribeiros e alfarrobeiras também encontraram aqui lugar.

Lisimáquia-branca. Foto: Helena Geraldes

“A ideia, tal como já acontecia no restante espaço do jardim, é recriar os ecossistemas, neste caso demos preferência à região de Lisboa e às áreas próximas”, acrescenta. Uma das espécies espontâneas selecionadas por Pedro Arsénio, ligado ao projeto paisagístico desta parte do jardim, foi por exemplo o selo-de-salomão, uma pequena planta que nasce em sítios húmidos e sombrios no Norte e Centro do país. Difícil de encontrar, apesar de a terem procurado em várias saídas de campo, foi finalmente identificada e reproduzida e já se vê nos novos canteiros, que na primavera irá enfeitar de flores brancas em forma de sino. Outra das recém-chegadas escolhidas a dedo chama-se lisimáquia-branca e é uma espécie de prados húmidos, ameaçada de extinção em Portugal.

Mas nem tudo são novidades. Apesar de “muito velhinhas”, permanecem neste espaço várias árvores que já pertenciam ao terreno dos antigos proprietários, a família Vilalva: um grande plátano, pitósporos, lódãos, dois enormes eucaliptos, ciprestes de várias espécies e ainda um conjunto de pinheiros-das-canárias, entre outros, são “muito importantes” pois ajudam a dar corpo a esta parte do jardim, onde as plantas novas ainda precisam de tempo para crescer.

Vista do arvoredo na nova zona do jardim, que inclui árvores do tempo do Parque de Santa Gertrudes, construído no século XIX. Foto: Helena Geraldes

A arquiteta paisagista adianta que várias das árvores que aqui ficaram serão do tempo do antigo Parque de Santa Gertrudes, mandado construir no século XIX pelo Visconde de Vilalva, nas terras que tinha adquirido e onde antes ficava a Quinta do Provedor dos Armazéns – uma das quintas de recreio conhecidas no limiar da cidade, durante o século XVIII. Em 1957, uma parte grande deste parque antigo foi vendida para acolher o jardim e os edifícios da Fundação Gulbenkian. Agora, graças à junção desta nova área, que tinha permanecido nas mãos da família do visconde até ser comprada há alguns anos, “é como se o antigo espaço do Parque de Santa Gertrudes, que tinha sido dividido, voltasse às origens”.

Numa altura em que as alterações climáticas e a seca estão no centro das preocupações, o projeto agora inaugurado inclui também o encaminhamento das águas das chuvas desta zona para o lago grande, na área mais antiga, através de diferentes linhas de drenagem cobertas de cascalho. A água desse lago é depois utilizada na rega de todo o jardim.

Com a abertura ao público, as visitas e atividades ao ar livre vão passar a abarcar esta nova área verde, diz Paula Corte Real. Conheça o que está previsto para a festa deste fim-de-semana, que será dedicada principalmente à reabertura do Centro de Arte Moderna, e o que já está agendado para os próximos tempos no jardim.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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