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Tetyana e Pedro foram para o museu e desenharam 100 borboletas nocturnas

02.11.2015

Um ano foi o tempo que Tetyana Chkyrya, 25 anos, e Pedro Araújo, 23 anos, precisaram para fazerem as ilustrações científicas de 100 espécies de borboletas nocturnas, ou traças, guardadas nas colecções do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa. Este projecto de ilustração científica – que quer divulgar a importância destes insectos, das colecções e do desenho – está pronto para se transformar em livro.

 

Wilder: O projecto “Cem Traças” surge no âmbito do vosso Mestrado em Desenho pela Faculdade de Belas-Artes. Por que escolheram um tema de História Natural?

Pedro e Tetyana: Quando entrámos para o Mestrado nas Belas-Artes não sabíamos que existia uma área do Desenho que é a Ilustração Científica. Com a ajuda de Pedro Salgado, nosso professor que, mais tarde, se tornou no nosso orientador, pouco a pouco entrámos neste caminho e apaixonámo-nos por esta área.

 

W: E porquê as traças?

Pedro e Tetyana: Ambos queríamos desenvolver trabalho neste campo. Inicialmente tínhamos a ideia de ilustrar as borboletas diurnas. Planeámos uma visita ao Museu de História Natural e da Ciência da Universidade de Lisboa, com o Filipe Lopes – curador da colecção e nosso co-orientador – que se mostrou disponível a receber-nos e mostrar a colecção. Mas o Filipe trocou-nos as voltas e decidiu mostrar-nos, antes de qualquer coisa, uma caixa de borboletas nocturnas de São Tomé, mais especificamente com a espécie Euchloron megaera! Foi amor à primeira vista. A partir daí começámos a explorar o mundo das traças e o projecto foi crescendo até agora.

 

 

W: Nas 100 ilustrações que fizeram estão representadas 16 famílias de borboletas noturnas. De onde são estas borboletas?

Pedro e Tetyana: As ilustrações vão desde borboletas que ocorrem em território africano – como São Tomé e Príncipe, Guiné e Moçambique –, até espécies presentes na Índia, no México e também em Portugal Continental e Ilhas. Preferimos basear o nosso trabalho na colecção do museu e nas espécies com maior impacto visual e não em zonas específicas.

 

W: Como foi o processo que usaram para ilustrar as borboletas?

Pedro e Tetyana: Desenvolvemos uma técnica específica para este projecto. Trabalhámos sempre com exemplares e fotografia. Começámos por escolher as borboletas no melhor estado possível de conservação e depois fotografá-las, em estúdio, com dois flashes, a 50mm com uma lente Macro, e uma Canon 7D. A partir dessas fotografias, investigámos o nome científico das borboletas. Em muitos casos foi necessário identificar a espécie, porque esse trabalho não estava feito pelo Museu. Para isso procurámos referências exteriores à colecção em bases de dados online. A partir do momento em que tínhamos tudo confirmado, partimos para a Ilustração.

 

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W: E que técnicas utilizaram?

Pedro e Tetyana: Cada um de nós desenhou 50 espécies. Dividimos a fase do Desenho em duas partes. Primeiro fizemos sempre uma base com grafite em folha de polyester, trabalhando com vários materiais para alcançar o máximo detalhe. A segunda parte, que considerámos igualmente importante, foi o trabalho em técnica digital. Aqui, pudemos colorir os desenhos e acrescentar ainda mais detalhes relevantes.

 

W: Quanto tempo demoraram a fazer as 100 ilustrações?

Pedro e Tetyana: As ilustrações foram feitas ao longo de mais de um ano de trabalho, com fases em que estávamos mais focados no Desenho e outras em que a investigação científica ocupava a maior parte das horas de trabalho. Em média, cada ilustração levou-nos cerca de sete horas.

 

W: Quais as maiores dificuldades que sentiram neste projecto?

Pedro e Tetyana: Sentimos que não houve dificuldades, mas sim desafios que conseguimos superar. Um dos maiores desafios foi a parte da Biologia / Zoologia. Como temos formação artística e não científica, houve algumas traças que tivemos muito trabalho em conseguir identificar para podermos ilustrar.

 


W: Este era um trabalho que ainda não estava feito?

Pedro e Tetyana: Ainda não existia um trabalho com esta dimensão, nem a ilustração científica como base, pelo menos ligado ao Museu. Existem trabalhos que são guias de espécies de borboletas, mas diurnas. Além disso têm como base a fotografia e são muito mais vocacionados para o público científico.

 

W: Por que consideram a ilustração científica importante?

Pedro e Tetyana: A Ilustração Científica cobre falhas que a fotografia apresenta. Por exemplo, neste projecto usámos a fotografia como base para ilustração e investigação. Há inúmeros exemplos de casos em que a fotografia, por si só, não é capaz de transmitir toda a informação que é preciso para compreender a espécie. Seja pelo exemplar em mau estado, ou pelas condições de luz, ou outros factores, a fotografia falha. A Ilustração, em conjunto com a investigação, reconstrói tudo o que estiver em falta e destaca elementos.

 

W: O que mais vos surpreendeu sobre as traças?

Pedro e Tatyana: Passámos a olhar para as traças de uma maneira completamente diferente. Em vez de tentarmos matar o bicho assim que entra pela janela, temos uma nova maneira de pensar – apanhar e estudar a traça. A enorme diversidade que há entre estas borboletas foi o mais surpreendente, porque há traças que podem ser confundidas com borboletas diurnas.

 

 

W: Qual é, para vocês, a importância destes insectos?

Pedro e Tetyana: Estes insectos, assim como outros seres vivos, fazem parte do ecossistema. Polinizam as plantas; são alimento para outros animais, como algumas aves. Têm a sua importância, como todos os outros, e infelizmente algumas espécies também sofrem de perigo de extinção, seja por incêndios ou destruição de florestas.

 

W: E agora, quais os vossos projectos para o futuro?

Pedro e Tetyana: Depois de lançarmos o projecto “Cem Traças”, já recebemos propostas para outros trabalhos de Ilustração Científica. Gostaríamos de continuar a trabalhar nesta área, mas não temos planos muito definidos para breve, enquanto não terminarmos as nossas dissertações de Mestrado.

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

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Até 16 de Novembro está a decorrer uma campanha de crowdfunding para ajudar a publicação do livro “Cem Traças”, projecto ao qual se associou o Museu. O livro terá ilustrações das espécies, acompanhadas pelo número de catálogo de cada espécime, usado como base para cada ilustração. Além disso, as imagens são acompanhadas por um mapa assinalando o do local 
de colheita e escala de cada exemplar.

Saiba como pode participar através da página de Facebook, blog e YouTube.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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