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Pegadas de aves na Austrália. Foto: Ruth Schowalter

Investigadores descobrem importantes pegadas de aves com 125 milhões de anos

21.11.2023

Uma equipa de investigadores descobriu na Austrália aqueles que serão os vestígios mais antigos de aves do Hemisfério Sul, há cerca de 125 milhões de anos, perto do Pólo Sul.

A descoberta de 27 pegadas de aves na costa Sul da Austrália – datando do início do Cretáceo, quando a Austrália estava ligada à Antárctida – abre uma nova janela para a evolução das aves e para as suas migrações.

Pegadas descobertas no âmbito da investigação. Foto: Anthony Martin

A investigação, referente aos vestígios datados de há entre 120 a 128 milhões de anos, foi publicada na revista científica PLOS ONE.

“A maioria das pegadas e de fósseis de aves do Cretáceo é do Hemisfério Norte, em especial da Ásia”, explicou, em comunicado, Anthony Martin, principal autor do estudo e professor na Universidade de Emory (Georgia, Estados Unidos). Agora, “a nossa descoberta mostra que existiam muitas aves, e uma grande variedade delas, perto do Pólo Sul há cerca de 125 milhões de anos atrás.”

Martin é geólogo e paleontólogo dedicado à Icnologia, o ramo da geologia que lida com traços e rastos do comportamento dos organismos, tais como tocas, ninhos, marcas de dentes e pegadas.

Uma possível rota migratória

As 27 pegadas de aves variam na forma e no tamanho e estão entre as maiores conhecidas do início do Cretáceo. Variam entre os sete e os 14 centímetros, o que é semelhante às pegadas das nossas actuais garças mais pequenas e ostraceiros.

Os rastos das aves foram encontrados na Formação Wonthaggi, a Sul de Melbourne. Esta zona marca o local onde o antigo supercontinente Gondwana começou a quebrar-se há cerca de 100 milhões de anos, quando a Austrália se separou da Antárctida.

Naquela altura, a região era um vale com uma rede de rios separados por ilhas pequenas e temporárias. Apesar de a temperatura anual média do ar ser mais alta durante o Cretáceo do que é hoje, durante os Invernos polares, os ecossistemas registavam temperaturas muito baixas e meses de escuridão.

Anthony Martin toma notas à medida que a maré sobe e cobre as pegadas. Foto: Ruth Schowalter

Os rastos das aves encontrados em Wonthaggi foram feitos em vários níveis de profundidade, indicando uma presença recorrente de várias aves. Também sugere uma formação sazonal de marcas durante os Verões polares, talvez numa rota migratória.

“As aves terão, provavelmente, pisado areia fina ou lama”, disse Martin. “Depois, as pegadas podem ter sido enterradas por um rio de baixa corrente que depositou mais areia ou lama em cima delas.”

Uma escassez de fósseis de aves

A Formação Wonthaggi é famosa pela sua variedade de ossos de dinossauros. Mas os fósseis de aves são extremamente raros. Naquela formação foi encontrado apenas um pequeno osso de ave e poucas penas.

“As aves têm ossos tão finos e pequenos”, comentou Martin. “Pensem na probabilidade de um pardal ser preservado em registos geológicos em comparação com um elefante.”

Além disso, acrescentou, as aves são muito leves e não deixam grandes pegadas.

Em 2013, Martin e os colegas descobriram dois rastos de aves com 105 milhões de anos na Formação australiana de Eumeralla. Na altura, eram as marcas mais antigas da Austrália.

Olho de águia

Melissa Lowery, co-autora do artigo e uma caçadora de fósseis voluntária local, foi quem descobriu pela primeira vez algumas das pegadas, em 2020.

“A Melissa é incrivelmente competente a encontrar marcas de fósseis”, disse Martin. “Algumas destas marcas são subtis mesmo para mim e tenho muita experiência e formação.”

A maioria das pegadas apenas está exposta na maré baixa e algumas delas tinham vida marinha incrustada, como algas e moluscos.

Anthony Martin e Melissa Lowery. Foto: Ruth Schowalter

Em 2022, Martin visitou o local onde foram encontradas as pegadas para as analisar. Esteve acompanhado pelos co-autores do artigo Patricia Vickers-Rich, da Universidade Monash, e Thomas Rich, curador no Instituto de Investigação dos Museus Victoria. Desde os anos 1970 que ambos estão dedicados a encontrar fósseis no estado australiano de Victoria e interpretar a biota da Gondwana.

A equipa ficou completa com os co-autores Mike Hall, geólogo da Universidade Monash, e Peter Swinkels, taxidermista no Instituto de Investigação dos Museus Victoria e especialista em preservação de espécimes em moldes.

Este criou moldes de resina das pegadas que evidenciaram algumas nuances importantes e que servirão para futuras investigações, além de preservar a descoberta. O solo contendo as pegadas está em rápido processo de erosão por causa das marés e da força das ondas.

“Sete das pegadas que Melissa encontrou em 2020 já não estão lá”, disse Martin. “Alguns fósseis, incluindo pegadas, estão expostos apenas por um curto período de tempo depois de terem estado enterrados durante milhões de anos. Temos de nos apressar a registá-los antes que desapareçam de novo.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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