Galo-das-rochas-andino. Foto: Bill Bouton/WikiCommons

Equipa de peritos portugueses traduz nomes de mais de 11.000 espécies de aves do mundo para Português

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Lançado a 1 de Janeiro, o site Aves do Mundo PT tem nomes portugueses (de Portugal) para todas as espécies de aves do mundo, organizadas pelas 252 famílias. A equipa de peritos responsável pela iniciativa explicou à Wilder qual o objectivo e como tudo foi feito.

WILDER: Qual a importância de dar nomes portugueses às espécies de aves do mundo?

Gonçalo Elias: Vivemos num mundo cada vez mais globalizado, onde muitas pessoas viajam para outros continentes com o objectivo de observar aves selvagens. No caso dos portugueses, deparavam-se frequentemente com esta dificuldade: estavam a observar uma ave e não sabiam que nome lhe dar, pois elas só tinham nomes noutros idiomas (por exemplo inglês, francês ou espanhol). A nossa lista veio, assim, colmatar uma lacuna que existia neste domínio e a partir de agora todas as espécies dispõem de um nome que faz sentido na perspectiva do observador português.

Galo-das-rochas-andino. Foto: Bill Bouton/WikiCommons

W: Quais os principais objectivos que querem alcançar?

Gonçalo Elias: Acima de tudo, tivemos como objectivo criar uma lista de nomes coerente das aves de todo o mundo, feita em português de Portugal, a pensar nos observadores portugueses. As compilações que existiam antes de avançarmos com este desafio estavam incompletas e misturavam nomes oriundos de diferentes países da lusofonia e feitos com diferentes critérios e o resultado era uma salada de nomes difícil de entender.

W: Como e quando surgiu a ideia desta lista e deste site?

Gonçalo Elias: A nossa ideia inicial foi a de criar uma lista de nomes em Português. Essa ideia surgiu em 2019, de forma quase acidental, numa troca de mensagens no Facebook, em que constatámos que certas aves não tinham nome em Português de Portugal. A partir daí, formou-se um grupo de pessoas interessadas em elaborar uma lista que resolvesse esse problema. Mais tarde, já em 2021 e com a lista quase terminada, ocorreu-nos que seria interessante disponibilizar a informação num site criado especificamente para o efeito, que tornasse a informação mais acessível a qualquer pessoa.

W: Quem está por detrás desta iniciativa? Quem fez a lista, as traduções e o site, por exemplo?

Gonçalo Elias: A nossa equipa é composta por cinco elementos: Paulo Alves, José Frade, Pedro Nicolau, João Pereira e eu próprio. Inicialmente contámos ainda com a colaboração de mais um elemento (Rui Caratão) que, entretanto, deixou de ter disponibilidade para continuar. A lista, os nomes, os PDF e o site são o resultado do trabalho conjunto de toda a equipa. Claro que houve divisão de tarefas mas procurámos sempre trabalhar de forma coordenada, de modo a garantir que todos se reviam no rumo que estava a ser seguido.

Tódi-jamaicano. Foto: Susanne Bollinger/WikiCommons

W: Pode descrever o processo pelo qual chegaram ao nome comum em Português para as espécies?

Gonçalo Elias: Por um acaso feliz, cada um de nós tinha experiência numa região diferente do globo. Assim, o que fizemos foi dividir o mundo em grandes regiões e cada um de nós ficou responsável por propor nomes para essa região. Definimos um conjunto de critérios técnicos para os nomes (critérios esses que estão explicados em detalhe no site e também na publicação). Quando já havia nomes portugueses para essas espécies, fizemos uma análise para decidir se esse nome fazia sentido dentro dos nossos critérios e da nossa filosofia de elaborar uma lista coerente em Português de Portugal. Assim, nuns casos os nomes existentes foram aproveitados e noutros casos foram alterados. Adicionalmente, tivemos em atenção o nome científico e os nomes noutros idiomas, assim como o aspecto da ave, o seu comportamento, as suas preferências de habitat e a sua área de distribuição.

Ao longo de todo o processo fomos trocando inúmeras mensagens sobre os casos ou critérios que nos suscitavam dúvidas, de modo a que, em conjunto, pudéssemos encontrar soluções para esses casos e garantir que todos concordavam com o resultado final.

Por fim, quando já tínhamos nomes para todas as espécies, foi necessário fazer alguns acertos, tanto para eliminar duplicados, como para uniformizar a aplicação de determinados critérios.

W: Quantas espécies têm nomes comuns neste site?

Gonçalo Elias: São cerca de 11 mil espécies. O número total de espécies tem vindo a aumentar gradualmente ao longo dos anos, sobretudo devido a alterações taxonómicas que resultam na divisão de uma espécie em duas ou mais (os chamados splits), ou seja, em que uma população que tinha o estatuto de subespécie é ‘promovida’ a espécie. Adicionalmente, de vez em quando são descobertas novas espécies que nunca tinha sido descritas.

Garça-tigre-mexicana. Foto: Hans Hillewaert/WikiCommons

W: Há algumas espécies para as quais não tenham conseguido encontrar um nome em Português?

Gonçalo Elias: Nós escolhemos nomes em Português para todas as espécies. Nos casos em que não existia qualquer nome, foi necessário inventar um, e para isso tivemos em conta vários elementos: o significado do nome científico, a designação da espécie noutros idiomas, as características morfológicas ou os hábitos da ave e a sua distribuição geográfica (este último aspecto é relevante no caso de aves que ocorrem apenas em certas ilhas, por exemplo).

W: Esta lista tem também espécies que ocorrem em Portugal ou são só as que ocorrem em outros países?

Gonçalo Elias: É uma lista global, que inclui todas as espécies do mundo, incluindo as que podem ser vistas em Portugal.

Secretário. Foto: Thomas Fuhrmann/WikiCommons

W: Como fizeram para conseguir as fotografias das espécies?

Gonçalo Elias: Numa primeira fase, reunimos as fotos tiradas pelos membros da equipa. Depois ocorreu-nos que seria interessante incluir pelo menos uma fotografia para todas as famílias, no entanto muitas delas não estavam representadas no nosso portefólio. Assim, numa segunda fase decidimos divulgar a nossa ideia e a nossa intenção de fazer uma lista ilustrada e fizemos alguns apelos em grupos e contactos directos, com vista a obter as fotos que não tínhamos. A receptividade foi muito boa e houve pessoas de muitos países com vontade de colaborar, dos Estados Unidos ao Equador, do Quénia à África do Sul e até da Austrália e da Nova Zelândia.

W: Para quem é este site? A quem poderá interessar?

Gonçalo Elias: A lista e o site foram feitos a pensar em qualquer pessoa que pretenda consultar ou usar o nome em Português para qualquer espécie de ave do mundo. Mas também pode ter interesse para as pessoas que desejem aprender mais sobre as aves e as famílias que ocorrem noutros continentes e foi por isso que decidimos incluir um pequeno texto explicativo em todas as famílias.

Além disso, acreditamos que a lista e site poderão ser úteis para entidades de vários tipos (como por exemplo jornais, editoras, escolas, zoos, ONG, etc.) que estejam interessadas em utilizar uma nomenclatura consistente em Português para se referirem a espécies de aves de todo o mundo.

Este projecto é um contributo que quisemos dar para tornar mais acessível a informação em Português sobre as aves que existem no planeta.

W: Esta lista será actualizada regularmente?

Gonçalo Elias: Sim, temos planos para actualizar a lista e o site uma ou duas vezes por ano, sempre que houver um número relevante de alterações que o justifique.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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