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Lince-ibérico, cria. Foto: Programa Ex-situ (arquivo)

Em oito anos já nasceram mais de 100 linces-ibéricos no centro de Silves

23.03.2018

O Centro Nacional de Reprodução do Lince-ibérico (CNRLI), em Silves, já viu nascer mais de 100 crias desta espécie de felino Em Perigo de extinção. Três delas nasceram nesta semana.

 

Esta é a nona temporada reprodutora do CNRLI, centro que, a 26 de Outubro de 2009, recebeu o seu primeiro lince, a fêmea Azahar, vinda do Zoobotânico de Jerez de la Frontera. Durante esse ano foram chegando os primeiros 15 linces reprodutores. Esta era uma solução de fim de linha para tentar evitar a extinção da espécie.

O lince-ibérico (Lynx pardinus) tem tido uma história atribulada. No século XIX a população mundial da espécie estava estimada em cerca de 100.000 animais, distribuídos por Portugal e Espanha; mas no início do século XXI restavam menos de 100. Então, os dois países juntaram-se para recuperar habitats e reproduzir animais. O CNRLI é uma das peças deste quebra-cabeças conservacionista que ainda hoje não está resolvido.

 

Lince-ibérico. Foto: Programa ibérico de Conservação Ex-Situ

 

Este ano, a época de cria foi inaugurada a 19 de Março com as três crias de Flora e Madagáscar. “O parto decorreu de forma normal para uma fêmea tão experiente como a Flora, que desta vez escolheu a caixa ninho do seu campeio para parir”, segundo uma nota do Programa de Conservação Ex-situ.

Estas três crias juntam-se às 100 que já tinham nascido em Silves, na Herdade das Santinhas, desde a primeira temporada reprodutora, que aconteceu em 2009/2010 e que resultou em três crias que não conseguiram sobreviver.

Em oito anos, 74 das 103 crias conseguiram sobreviver. Dessas 74, 11 continuam no programa ibérico de reprodução em cativeiro, distribuídas pelos cinco centros de Portugal e Espanha. As outras 63 foram reintroduzidas na natureza, como reforço das populações selvagens, quase uma média de 11 por ano.

 

Rodrigo Serra e parte da equipa do CNRLI. Foto: Joana Bourgard/Wilder

 

“Depois da primeira reintrodução em 2015 já temos mais de 40 animais no campo, em Mértola, no espaço pequeníssimo de três anos. Não só correu bem do ponto de vista técnico da reprodução em cativeiro como Portugal é contribuinte líquido positivo para a conservação a nível ibérico.”

Para esta temporada de cria – que começou em Dezembro de 2017 e só terminará em Abril de 2018 -, Silves tem um total de cinco casais formados: Jabaluna e Enebro, Artemisa e Drago, Flora e Madagáscar, Juncia e Fado e Kalda e Fresco.

Estes cinco casais fazem parte dos 23 constituídos a nível ibérico. No total é esperado um número de crias entre as 29 e as 41.

 

Inseminação artificial ao serviço da conservação

Rodrigo Serra adiantou que este ano a equipa trabalhou com técnicos portugueses e alemães para tentar ter sucesso com um método ainda pouco utilizado em lince: a inseminação artificial. “O procedimento está a ser feito com a Fruta com o esperma do Drago“, explicou. “Estamos à espera para ver o que vai acontecer. Ainda é muito cedo para sabermos, só teremos notícias em Abril.” Rodrigo Serra considera que esta é uma técnica “prometedora. São passos tecnológicos que estamos a dar com uma espécie onde tal nunca foi feito. Portanto não vai ser da noite para o dia que vamos ter sucesso, é preciso insistir.”

 

Lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-situ do Lince Ibérico

 

As técnicas de reprodução assistida podem assumir um papel na conservação do lince-ibérico, uma espécie com uma baixíssima variabilidade genética. “São mais uma rede contra a extinção da espécie. Temos esperma congelado de vários machos, temos ovócitos congelados de várias fêmeas, temos esperma congelado de vários machos que já morreram e que não deixaram descendência e que eram fundadores do programa. Isto ajudará a acrescentar mais genética à conservação da espécie.”

Segundo o responsável, outro factor importante é que com estas técnicas “a distância deixa de ser um limite à reprodução dos animais”. “No limite será possível obter sémen de um animal selvagem, que vive por exemplo numa população como Doñana, sem ser preciso pô-lo em cativeiro. Podemos recolher o esperma e inseminar fêmeas de cativeiro, ou seja, isto permite-nos gerir geneticamente a população como se fosse uma só.”

Actualmente vivem em Silves 18 animais. E o espaço em cativeiro é finito. “Não podemos acrescentar mais reprodutores. Mas ao mesmo tempo há mais genética que nos interessaria conservar. Agora, se estas técnicas tiverem sucesso, já o poderemos fazer”.

 

CNRLI em Silves. Foto: Joana Bourgard/Wilder

 

Rodrigo Serra lembrou ainda que, no caso de ocorrer algum incidente com uma população de linces na natureza, como um incêndio ou doença, este banco de ovócitos e de esperma deixa de ser só um repositório e passa a ser, de facto, uma ferramenta.

Em jeito de balanço, o responsável acredita que Silves “Está a conseguir cumprir a sua tarefa que é gerar linces para garantir a sobrevivência da espécie em cativeiro, do ponto de vista genético, demográfico e comportamental”.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Leia aqui a entrevista que fizemos a Pedro Rocha, director do Departamento de Conservação da Natureza e Florestas do Alentejo, sobre as prioridades deste ano para o lince-ibérico no Vale do Guadiana.

Saiba como se liberta um lince na natureza.

Saiba como é cuidar dos linces no Vale do Guadiana.

Leia a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do CNRLI em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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