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Musgo-luminoso (Schistostega pennata). Foto: Alpsdake/Wikimedia Commons

Cientistas desvendam mistérios do musgo que brilha na escuridão

19.10.2023

Uma equipa científica liderada por um investigador da Estação Biológica de Doñana-CSIC compilou toda a informação disponível sobre o musgo luminoso (Schistostega pennata) e modelou a sua distribuição na Península Ibérica. O maior número de populações foi encontrado em Portugal.

Esta planta tão singular distribui-se por poucas zonas da Península Ibérica, incluindo em Portugal, especialmente pelo Norte e Noroeste e ainda pouco se sabe sobre a sua ecologia. O que é certo é que as suas populações estão ameaçadas pela actividade humana.

Chamado musgo-luminoso ou ouro-dos-duendes, a Schistostega pennata é uma espécie muito singular. Cresce em zonas sombrias, principalmente na entrada de grutas, minas ou cavidades naturais ou artificiais.

É fácil de o reconhecer porque reflecte a pouca luz que recebe, o que lhe dá um aspecto de um verde brilhante.

Apesar da sua singularidade, ainda se sabe pouco sobre ele. Para tentar descobrir mais sobre esta espécie, uma equipa liderada pela Estação Biológica de Doñana-CSIC compilou toda a informação disponível sobre ela, modelou a sua distribuição na Península Ibérica e propôs medidas de conservação. “Como muitas outras espécies, está em declínio e poderá estar a desaparecer”, alerta a Estação Biológica. Em Portugal está considerada como Quase Ameaçada.

Por exemplo, uma das populações localizadas em Beade (Vigo) está prestes a desaparecer por causa da construção de uma estrada projectada no âmbito de um novo plano urbanístico.

“Constatámos que muitas das suas populações estão ameaçadas”, alertou o investigador Jairo Robla, principal autor do estudo, publicado este mês na revista Journal of Bryology. “Enfrentam pisoteio constante, construção de infraestructuras, vandalismo, extração de água… O seu habitat é tão específico que qualquer perturbação mínima o pode afectar gravemente”, acrescentou.

A equipa de investigadores localizou 26 novas populações de Schistostega pennata na Península Ibérica, graças aos registos feitos em várias plataformas de observação de biodiversidade – como o Observation.org, o iNaturalist e o Global Biodiversiy Information Facility (GBIF) – e aos seus próprios censos e expedições botânicas, o que totaliza 73 populações conhecidas na Península.

Quanto à sua distribuição geográfica, o maior número de populações (34) foi encontrado em Portugal – nos distritos de Braga, Coimbra, Guarda, Porto, Viseu, Viana do Castelo e Vila Real -, seguido de Espanha (33) e Pirinéus franceses (6). Além disso, a espécie foi registada pela primeira vez em Ourense (Galiza, Espanha) e Zamora (Castela e Leão, Espanha).

(A, B) Pormenor da Schistostega pennata em Oviedo (Astúrias, Espanha); (C) S. pennata numa cavidade em Oviedo (Astúrias); (D) S. pennata numa gruta em Fornelos de Montes em Pontevedra (Galiza, Espanha). Fotos: Omar Sánchez (A–C) e J. Eiroa (D)

A maioria encontra-se em áreas com chuva abundante, temperaturas amenas e influência oceânica e sempre em zonas sombrias.

Os investigadores criaram um modelo de distribuição para saber que áreas poderão ser adequadas para que este musgo-luminoso prolifere. Segundo os resultados, ainda que a sua distribuição esteja concentrada na zona litoral do Norte e Noroeste da Península Ibérica, algumas zonas mediterrânicas do Centro-Sul e do Nordeste da Península Ibérica também poderão ser adequadas para esta espécie, em micro-habitats, caso se verifiquem as condições climáticas essenciais para o seu desenvolvimento.

O estudo indica também que o Parque Nacional da Peneda-Gerês e o Parque Natural da Serra da Estrela terão “grandes áreas contínuas com condições muito adequadas para a Schistostega pennata“. 

“Esta é a primeira vez que se realiza um modelo para este tipo de musgo, não apenas para a Península Ibérica, mas também para todo o mundo. Por isso, estes resultados são essenciais para fazer amostragens que permitam conhecer mais sobre a espécie e para identificar futuras populações”, comentou a Estação Biológica em comunicado.

Segundo Jairo Robla, “dado que é uma espécie rara no nosso território, saber aonde está e onde poderemos encontrar novas populações é muito importante para continuar a estudá-la no futuro”.

Além das ameaças de origem humana, as alterações climáticas, o aumento das temperaturas e a escassez de chuva estão também a afectar a espécie. Acredita-se que as populações deste musgo luminoso estão em declínio e, por isso, esta espécie está classificada como Vulnerável da Lista Vermelha de Briófitas de Espanha, ainda que não tenha protecção legal efectiva.

“Esta espécie faz-nos ver a necessidade de voltarmos a estudar e a conhecer aquela diversidade que temos perto de nós e que é surpreendente mas que nos passa desapercebida”, acrescentou o investigador.

Jairo Robla garantiu que vão “continuar a lutar por conseguir uma protecção legal adequada ao seu estatuto vulnerável e à sua singularidade biológica e ecológica”.

A localização das novas populações de Schistostega pennata teria sido impossível sem a ajuda desinteressada de várias pessoas que submeteram os seus registos nas plataformas como o iNaturalist. A equipa de cientistas desafia qualquer pessoa que veja esta espécie a submeter a sua observação nestas plataformas de Ciência Cidadã e que entre em contacto com eles para continuar a aumentar a informação sobre este musgo. “Toda a ajuda é bem vinda”, concluiu.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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