Com folhas que podem crescer até aos três metros, a nova Victoria boliviana tinha um espécime guardado no herbário dos Kew Gardens desde há 177 anos, que anunciaram esta segunda-feira a novidade. É possível observá-la também nestes jardins, lado a lado com as outras duas plantas do género Victoria.
A pesquisa foi liderada por Carlos Magdalena, cientista e investigador da área botânica ligado aos Kew Gardens, Lucy Smith, artista botânica, e ainda Natalia Przelomska, investigadora em genómica da biodiversidade.
Depois de vários anos de pesquisa, a equipa publicou a descrição sa nova espécie para a Ciência na revista Frontiers in Plant Science, em colaboração também com o Herbário Nacional da Bolívia, o Jardim de Santa Cruz de la Sierra e os Jardins La Rinconada.
A nova planta pertence ao género Victoria, baptizado em 1852 em honra daquela rainha britânica. Já o nome específico, boliviana, é dedicado aos parceiros bolivianos deste estudo e também ao país onde cresce o nenúfar, nos ecossistemas aquáticos de Llanos de Moxos, nas terras baixas do norte da Bolívia.
Uma das características que identificam este nenúfar gigante são as flores, que passam do branco ao cor-de-rosa, e também os pecíolos (parte das folhas que as liga ao caule) espinhosos.
“Tendo em conta a rapidez com que a biodiversidade se está a perder, descrever novas espécies é uma tarefa de importância fundamental; esperamos que o nosso trabalho multidisciplinar inspire outros investigadores que procuram formas de identificar novas espécies de maneira rápida e rigorosa”, afirmou Natalia Przelomska.
Juntamente com Oscar A. Pérez-Escobar, esta cientista analisou o ADN da Victoria boliviana e confirmou que há realmente três espécies de nenúfares deste género: Victoria amazonica, Victoria cruziana e Victoria boliviana.
Durante décadas, a tarefa de estudar nenúfares gigantes tornou-se complicada porque estas plantas são difíceis de recolher na natureza e há por isso há falta de espécimes-tipo nas colecções mundiais de herbário. Os espécimes-tipo são a planta original usada para descrever uma espécie.
Assim, os botânicos não tinham forma de comparar facilmente uma espécie com outra, o que levou a que durante muito tempo este novo nenúfar não fosse identificado. A Victoria amazonica foi a primeira a ser descrita para a Ciência, em 1832.
Com o objectivo de ter mais informação sobre os nenúfares do género Victoria, a equipa dedicou-se à tarefa de juntar toda a informação disponível e recorreu à ajuda dos cidadãos para que identificassem estas plantas sempre que as vissem na natureza ou em herbários e jardins botânicos por todo o mundo.
Mas foi em 2016, quando receberam sementes vindas da Bolívia e observaram as novas plantas junto das outras duas espécies de nenúfares gigantes, enquanto cresciam nos Kew Gardens, que Carlos Magdalena percebeu que havia diferenças. Três anos depois visitou a Bolívia e teve a certeza.
“Desde que vi uma foto online desta planta em 2006 que estava convencido da existência de uma nova espécie”, explica o investigador, que classificou a descoberta como “o maior feito” dos seus 20 anos de carreira em Kew.
“Os horticultores conhecem as suas plantas muito bem; conseguimos muitas vezes reconhecê-las apenas com um olhar. Era claro para mim que esta planta não se enquadrava em nenhuma das descrições das espécies conhecidas de Victoria e por isso tinha de haver uma terceira.”
Por seu turno Lucy Smith, que faz parte da equipa de artistas botânicos freelance que trabalham com os Kew Gardens, estava a trabalhar num projecto para ilustrar as duas espécies já conhecidas, deslocando-se às estufas durante a noite, quando as flores destes nenúfares abrem.
Quando viu as flores do novo nenúfar abrirem, em Julho de 2018, percebeu que era uma planta nova e partilhou as suas suspeitas com Carlos Magdalena, dedicando-se a ilustrar as diferenças encontradas. Lucy percebeu também que o nenúfar era idêntico a um espécime colectado em 1845 na Bolívia pelo artista Walter Hood Fitch, que trabalhava para os Kew Gardens, e que estava guardado nas colecções de herbário. De facto, comprovou-se agora que se trata da mesma espécie.