Na minha última caminhada pela mata que fica junto a casa, fiquei maravilhada pelos inúmeros arbustos de Murta (Myrtus communis) cheios de pequenas bagas carnudas, azul-escuras.
Pois é, o inverno aproxima-se, os dias são cada vez mais curtos e o frio chegou com força. Muitos são os que pensam que nesta altura do ano as plantas simplesmente adormecem e que só voltam a desabrochar na primavera. Mas isso não é totalmente verdade. São inúmeras as espécies que continuam a deliciar-nos com a sua beleza nesta época do ano.
A paisagem está em constante transformação, enquanto algumas plantas já estão despidas, e as suas folhas cobrem o chão com tapetes de cores características desta época. Muitas são as espécies de uma beleza inigualável que só agora começam a florir e a frutificar, colorindo e perfumando os jardins, as matas e as florestas.
A murta
Da mesma família do Eucalipto, a murta é a única espécie da família das Myrtaceae nativa da Europa. Está amplamente distribuída pela bacia do Mediterrâneo, nas zonas costeiras da Europa até ao norte de África.
Em Portugal, este arbusto é comum no centro e sul do país, em zonas de matos xerófitos, orlas ou subcobertos de bosques de pinheiro, carvalho ou sobreiro. Também é muito frequente encontrar-se junto aos cursos de água. Não é muito exigentes em cuidados, mas tem preferência por ambientes quentes e secos, exposição solar plena ou de meia-sombra e solos bem drenados e pobres em matéria orgânica.
A murta é uma planta de porte erecto, geralmente arbustivo e muito ramificado, que pode atingir até 5 metros de altura. Forma moitas densas, muito frondosas e irregulares, quase impenetráveis. As suas folhas perenes, levemente coriáceas, verde-escuras na página superior e verde-claras na inferior, são muito lustrosas e aromáticas. Quando pisadas, libertam um aroma semelhante ao da flor de laranjeira.
As flores solitárias, geralmente brancas ou rosadas, são delicadas e perfumadas. Surgem na primavera, em abril/maio, estendendo a época de floração até a agosto/setembro. Os frutos são pequenas bagas elipsoides, que quando maduras são de cor azul-escura, cobertas por um pó esbranquiçado e ligeiramente carnudas. Amadurecem no final do verão e no outono.
Mastruços ou murtinhos
São raras as plantas que têm tantas aplicações como a murta. Todas as partes da planta têm utilizações diversas na medicina, culinária, aromaterapia, perfumaria, cosmética, etc.
Os frutos da murta, designados por mastruços ou murtinhos, são comestíveis e apresentam um sabor amargo e resinoso. Na culinária são utilizados em saladas de fruta, para aromatizar guisados e molhos, para realçar carnes de sabor forte e na elaboração de compotas e licores. Também há quem utilize as flores frescas em saladas ou em guarnições e as folhas são utilizadas para envolver os queijos durante o processo de cura.
Os botões florais, as flores e os frutos, devidamente secos, podem ser conservados em vinagre para uso culinário ou em óleo de amêndoas doces, por exemplo, para fins cosméticos. Os óleos essenciais, extraídos na maceração das folhas, entram na composição de vários perfumes e de outros produtos de cosmética. A casca, os ramos, as raízes, as folhas e outras partes da planta são também utilizados na indústria farmacêutica e na indústria dos curtumes.
A madeira de murta é considerada uma madeira nobre. Apesar das suas dimensões muito reduzidas, o seu grão fino, dureza e elasticidade tornam-na muito interessante em tornearia e marcenaria. É aplicada no fabrico de bengalas, cabos de ferramentas e pequenas peças de mobiliário de valor.
É uma espécie muito ornamental, sempre-verde e já muito comum em jardins, na composição de sebes, isolada ou em pequenos grupos arbustivos. Além disso, é muito importante do ponto de vista ecológico. A sua presença atrai os insetos, aves e outros animais, que se alimentam das suas bagas, numa época do ano em que o alimento é escasso.
Murta-das-noivas
O aroma perfumado das suas flores e folhas dá origem à sua designação científica, uma vez que o nome genérico Myrtus vem do grego myrtos, que significa perfume.
São inúmeras as lendas e as histórias sobre a murta. Os gregos e os romanos consideravam-na símbolo de amor e de paz, consagrando-a a Afrodite e a Vénus – deusas do Amor, divindades na mitologia grega e romana, respetivamente.
Daí, ainda hoje, esta planta ser tradicionalmente utilizada no arranjo de coroas e ramos de noiva em várias partes da Europa, sendo por isso vulgarmente conhecida como a murta-das-noivas. O perfume e a brancura das suas flores não deixam ninguém indiferente à sua beleza única. Não é por acaso que os bouquets das noivas da família real inglesa tinham uns raminhos de uma murta plantada pela rainha Victória em 1845.
São tantas as outras histórias que podemos descobrir em cada caminhada que fazemos. As plantas não estão só nos jardins, podemos encontrá-las em qualquer lado. E, seja na primavera ou no outono e até no inverno, todas elas têm algo para contar.
Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos da autora.