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Andorinha. Foto: George Wietschorke/Pixabay

Como é que o calor em excesso afecta as aves selvagens?

01.08.2018

Ricardo Brandão, coordenador e director clínico do CERVAS (Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens), na Serra da Estrela, explica de que forma as aves serão, ou não, afectadas pelo aumento das temperaturas nos próximos dias.

 

O mês de Agosto começa com temperaturas acima dos valores normais, com uma “variação muito acentuada da temperatura do ar”, segundo uma nota do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).

Ricardo Brandão, à frente do CERVAS – centro que de momento cuida de cerca de 120 animais selvagens, principalmente corujas-do-mato, mochos-galegos, mochos-d´orelhas, cegonhas-brancas, andorinhas-dos-beirais e ouriços – explica o que isto significa para as aves selvagens portuguesas.

WILDER: De que formas o excesso de calor, como este que aí vem, pode ser um problema para as aves?
Ricardo Brandão: O calor em si não será um problema muito grave. As aves, e a maior parte dos animais selvagens, estão habituados a lidar com este tipo de situações, principalmente se tivermos em conta que estamos em pleno Verão. Uma onda de calor extremo fora de época poderia causar alterações mais graves. Ainda assim, as aves têm que reagir à situação e cada espécie tem as suas estratégias. O grande problema são as situações causadas pelo calor, como é o caso dos incêndios ou a falta de água. Estas podem afectar muitas espécies.

 

Foto: Gellinger/Pixabay

 

W: Quais as espécies que podem ser mais afectadas?
Ricardo Brandão: As espécies que ainda estão na época de reprodução poderão ser as que sofrem mais com o calor extremo, principalmente as crias que ainda estejam no ninho. Por vezes, estas saem precocemente ou são empurradas por outras crias devido ao calor no local do ninho. Esta situação verifica-se com os andorinhões, pode exemplo. Algumas aves de rapina ainda terão crias no ninho, prestes a sair. Esses indivíduos jovens também podem sofrer com o calor porque poderão ter mais dificuldades em conseguir alimento devido ao maior esforço físico que é necessário.

 

W: O tamanho, o tipo de alimentação ou o local onde ocorrem podem tornar as aves mais vulneráveis?

Ricardo Brandão: Sim. As aves que estejam em locais mais secos poderão sofrer mais caso o calor provoque uma diminuição súbita da disponibilidade de água. As aves mais pequenas, de metabolismo mais rápido, poderão também ter maior dificuldade em lidar com as temperaturas elevadas. O tipo de alimentação pode influenciar pois há recursos alimentares que podem diminuir com o calor. Mas é de referir que algumas espécies podem beneficiar com o calor, como as que se alimentam de répteis, que possam estar mais activos e disponíveis em dias de temperaturas mais elevadas.

 

W: Quais as aves que chegam em maior número aos centros de recuperação quando há mais calor?

Ricardo Brandão: Normalmente, os grupos que ingressam em maior número são andorinhões, andorinhas e outras aves com ninhos mais pequenos e fechados.

 

Crias de andorinhões em recuperação no CERVAS. Foto: CERVAS/arquivo

 

W: O que podemos fazer para ajudar as aves?

Ricardo Brandão: A criação de charcos é sempre uma acção importante para a fauna selvagem, não só pelo acesso à água mas também, e principalmente, por aumentar a biodiversidade do local, o que irá sempre beneficiar vários grupos de animais. A disponibilização de água de uma forma mais artificial, com recipientes, terá um feito positivo muito residual e por vezes até pode causar acidentes, como por exemplo o afogamento de aves. Por isso é preferível criar zonas naturais com água, como os charcos. As acções humanas de maior importância serão sempre não provocar incêndios, não destruir linhas de água e não cortar vegetação ribeirinha.

 

W: Normalmente, quais as estratégias das aves para baixar a temperatura corporal?
Ricardo Brandão: De uma forma geral, as aves procuram diminuir a sua actividade e aumentar o número de horas de repouso. Tentam concentrar a maior actividade em busca de alimento nas horas mais frescas do dia. Além disso, procuram locais frescos, com sombra, próximos de linhas de água, e usam locais com água para beber e tomar banho. Os adultos podem também tentar proteger as suas crias ficando ao pé delas de forma a criar sombra.

 

W: O CERVAS tem recebido casos de aves vítimas do calor em excesso?
Ricardo Brandão: É muito raro o calor por si só ser uma causa de ingresso. Pode é causar situações como quedas ou saídas precoces do ninho em algumas aves de rapina e andorinhões, ou dificuldade em obter alimento, principalmente em animais mais jovens. Nestes casos, a causa de ingresso é a debilidade. Por isso, prevê-se que nos próximos dias haja alguns ingressos devido a este tipo de situações.

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

Saiba como ajudar as crias de andorinhões no Verão.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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