Banner

Há hotspots de biodiversidade marinha em Portugal a precisar de protecção

26.07.2018

Uma equipa liderada por uma investigadora da Universidade de Aveiro cruzou diferentes informações sobre a biodiversidade na plataforma continental portuguesa, a partir de monitorizações já feitas, e concluiu que uma parte dos locais mais importantes não têm protecção assegurada. A Wilder falou com Inês Gomes e explica-lhe o que está em causa.

 

A partir dos dados disponíveis, Inês Gomes e a restante equipa identificaram quatro grandes áreas ‘hotspot’ de biodiversidade marinha na plataforma continental portuguesa: uma na região de Aveiro, outra próxima do Cabo Carvoeiro (zona de Peniche), outra a sul do Cabo Raso (Cascais) e a última cobrindo a maior parte da costa sul.

Para isso, analisaram informação de várias entidades, como a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), relativa à distribuição e abundância de grupos de animais ao longo de toda a costa: aves e tartarugas marinhas, mamíferos marinhos, peixes demersais (que vivem no fundo do mar) e macrobentos (organismos associados aos sedimentos no fundo do mar, como os caranguejos).

Os resultados do estudo, que cobre uma área total de 41.866 quilómetros quadrados – 13% da zona económica exclusiva portuguesa – foram publicados na revista Ecological Indicators, em Maio.

A equipa também comparou as áreas marinhas mais ricas com as áreas de Rede Natura 2000 – tanto as que já existem como as que estão à espera de aprovação. Analisaram sete Zonas de Protecção Especial (ZPE), criadas tendo em vista a protecção de aves marinhas, e quatro propostas para a criação ou expansão de Sítios de Importância Comunitária, neste caso com vista à protecção de cetáceos.

“Os resultados da nossa análise confirmaram áreas valiosas que já tinham sido identificadas para protecção [através da Rede Natura], mas também fazem sobressair o valor de sítios que neste momento estão desprotegidos, na sua maioria na região sul”, disse Inês Gomes à Wilder.

Na costa sul do Algarve, “obtiveram resultados com alto valor biológico, de Sagres até Espanha”, detalhou a investigadora. Todavia, com excepção da área em volta do Cabo de São Vicente, em Sagres, onde há uma ZPE, a restante costa está fora da Rede Natura 2000.

 

Cabo de São Vicente. Foto: Ricardo Oliveira/Wiki Commons

 

Sabe-se que a zona entre Sagres e Vilamoura (Albufeira) deverá ser coberta pela expansão do Sítio de Importância Comunitária da Costa Sudoeste – à espera de aprovação desde Maio de 2016, quando esteve em consulta pública. Mas nada está previsto para a área marítima que vai de Vilamoura até Vila Real de Santo António, igualmente rica em biodiversidade.

Na região existem ainda a ZPE e o Parque Natural da Ria Formosa, mas trata-se de “uma zona laguna intertidal com uma cobertura muito limitada dos habitats costeiros e mais profundos”, afirma-se no artigo já publicado.

Na zona marinha junto a Aveiro, a equipa detectou também uma área importante para a biodiversidade que em grande parte está fora da Rede Natura 2000. Todavia, deverá ficar protegida pelo futuro Sítio de Importância Comunitária Maceda/Praia da Vieira, entre Ovar e Leiria, também à espera de aprovação desde 2016.

 

Devemos estar preocupados?

Os investigadores acreditam que sim, uma vez que “o surgimento da economia azul está a apressar os países a tomarem decisões de pequena escala sobre a aplicação espacial de actividades marinhas”, como a exploração de minérios e de outros recursos do fundo do mar.

No caso português, têm sido apontadas lacunas na informação sobre sistemas marinhos e biodiversidade, considerada “pouca e fragmentada”, lembra a equipa.

Ao mesmo tempo, as autoridades continuam a trabalhar no Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo, que vai regular as actividades económicas e identificar zonas importantes para a conservação de biodiversidade no mar português.

Inês Gomes sublinha a importância de proteger as áreas identificadas e diz que são necessários mais dados de monitorizações de toda a costa portuguesa, para que seja possível actualizar este estudo com nova informação. E apela também a uma maior colaboração dentro da comunidade científica e entre esta e outras entidades.

“Esta é uma altura muito importante para o futuro. O próximo passo deve ser a integração de mais dados e de mais conhecimento científico na estratégia que está a ser desenhada para o espaço marítimo português”, alerta.

No estudo, liderado pela Universidade de Aveiro, colaboraram também a Universidade de Ghent, na Bélgica – onde foi desenvolvido o método aplicado nesta análise -, a Universidade dos Açores, a SPEA, o IPMA e o Flanders Marine Institute.

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

Quer contribuir para o aumento do conhecimento científico sobre o mar português? Saiba como pode colaborar nos projectos de ciência cidadã Gelatinosos, do IPMA, e Marine Forests, da Universidade do Algarve.

E consulte o Plano de Situação do Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional, em consulta pública ao próximo dia 31 de Julho, terça-feira.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

Don't Miss