Na ribeira do Torgal, muito perto de Odemira, vivem lagartos-de-água, barbos, mexilhões-de-rio e uma vegetação exuberante. E 28 espécies de libélulas, registadas e monitorizadas por uma equipa de biólogos. Este ano, estes vão tentar descobrir por que encontraram menos espécies e muito menos animais na campanha de 2016 neste refúgio de biodiversidade.
A contagem das libélulas na ribeira do Torgal, afluente do rio Mira, é uma forma de avaliar o estado de saúde deste curso de água, considerado uma “espécie de ribeira relíquia mediterrânica, que funciona como refúgio para muitas espécies no Sul do país”, diz Patrícia Garcia-Pereira, biólogoa do cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Universidade de Lisboa).
Ali ocorrem espécies como o escalo-do-torgal (Squalius torgalensis), o barbo-do-sul (Luciobarbus sclateri), o mexilhão-de-rio-ibérico (Unio tumidiformis) e o lagarto-de-água (Lacerta schreiberi), endemismo ibérico menos comum no Sul do país.
Nos últimos anos, entre Abril e Setembro, cinco investigadores do cE3c e do Tagis – Centro de Conservação das Borboletas de Portugal recolhem amostras em seis pontos num troço da ribeira para monitorizar as 28 espécies de libélulas que ali se podem observar.
Nesta lista incluem-se duas espécies protegidas a nível europeu, a libélula-esmeralda (Oxygastra curtisii) e o gonfus-de-Graslin (Gomphus graslinii). Contam os animais adultos que descobrem a voar e as larvas capturadas com camaroeiros e recolhem exúvias (o exoesqueleto do insecto, uma espécie de casca) nas margens da ribeira.
O estudo das libélulas do Torgal, tidas como bioindicadores da qualidade de habitats de água-doce, começou em 2012, no âmbito do projecto LIFE+ Ecotono, coordenado pela Quercus, que consolidou as margens e recuperou a vegetação autóctone. Actualmente, é a Câmara Municipal de Odemira que assegura a continuação da monitorização destes insectos.
A contagem de 2015 revelou um “aumento significativo da abundância de muitas espécies”, dizem os investigadores numa nota enviada à Wilder. “Estes dados indicavam que as intervenções nas margens e consequente aumento do caudal do curso da ribeira teriam tido um efeito positivo.”
No entanto, os resultados da monitorização das libélulas de 2016 deixaram os biólogos surpreendidos. “Verificou-se uma diminuição na abundância e riqueza específica de libélulas relativamente ao ano anterior.” A equipa encontrou menos larvas e menos exúvias. E cinco espécies não foram observadas de todo, como o gonfus-de-graslin e a libélula-anelada (Cordulegaster boltonii). Apenas duas espécies, libélula-crepuscular (Boyeria irene) e a libelinha-laranja (Platycnemis acutipennis), aumentaram as suas populações.
Agora, a equipa quer saber qual a causa destas alterações, “se correspondem a flutuações naturais das populações ou se, pelo contrário, estão a ocorrer alterações na comunidade de libélulas devido a alterações ambientais”. Salientam, por exemplo, que “o ano de 2016 foi particularmente atípico, sem grandes precipitações no Inverno, tendo a temperatura mantido-se baixa até final de Maio. Não houve propriamente uma Primavera, tendo chovido intensamente nos meses de Abril e Maio”.
Por isso, este ano vão regressar à ribeira do Torgal. O trabalho de amostragem “será de extrema importância para continuar a acompanhar a evolução das libélulas do Torgal que não foram observadas em 2016”, escrevem os biólogos.
A 17 de Junho será organizado um dia para monitorizar libélulas, onde todos estão convidados a participar e ajudar. No topo da lista das espécies a procurar estão a libélula-anelada e a gonfus-de-graslin.
[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.
A melhor altura para observar libélulas na ribeira do Torgal é Maio e Junho. No local pode ainda encontrar a Estação da Biodiversidade da Ribeira do Torgal, de fácil acesso. Este é um pequeno percurso com nove painéis a chamar a atenção para as espécies mais emblemáticas.