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A maior área protegida marinha do mundo fica na Antártida

31.10.2016

A maior área protegida marinha do mundo vai nascer a 1 de Dezembro de 2017 no Mar de Ross, na Antárctida, num dos ambientes mais intocados e selvagens do mundo – onde vivem focas, pinguins, baleias e esponjas raras com 500 anos de idade.

 

A notícia surgiu na sexta-feira passada, dia 28 de Outubro. Delegados de 24 países e da União Europeia reunidos na Conferência da Comissão para a Conservação dos Recursos Vivos marinhos da Antárctida (CCAMLR, sigla em inglês) em Hobart, na Austrália, chegaram a acordo para tornar o Mar de Ross, na Antártida, na maior área protegida marinha do mundo, depois de seis anos de negociações.

A 1 de Dezembro de 2017 começa uma nova etapa naquela região do planeta. Durante 35 anos, cerca de 1.550.000 quilómetros quadrados – uma área maior que o Reino Unido, França, Alemanha e Itália juntas – terão protecção especial.

Esta nova área marinha protegida, proposta pelos Estados Unidos e pela Nova Zelândia, tem como grande objectivo proteger os habitats e zonas de alimentação para mamíferos marinhos, aves, peixes e invertebrados, incluindo espécies icónicas como as orcas, pinguins-imperador e a foca-de-weddell (Leptonychotes weddellii). Vai proteger espécies bentónicas raras e vulneráveis, como esponjas únicas que vivem até aos 500 anos, e zonas importantes para o ciclo de vida do bacalhau-da-antárctida (Dissostichus mawsoni).

O Mar de Ross alberga muitas espécies que não vivem em mais lugar nenhum do mundo, incluindo 50% da população das orcas-do-Mar-de-Ross (um dos quatro tipos de orcas que foram recentemente descritas no mar Antárctico), 40% dos pinguins-de-Adélia (Pygoscelis adeliae) e 25% dos pinguins-imperador (Aptenodytes forsteri).

Durante 35 anos, as actividades humanas serão limitadas ou totalmente proibidas para conservação, monitorização dos ecossistemas e gestão de recursos piscícolas. Em 72% da área protegida, a pesca estará totalmente proibida. Em outras áreas será permitida a captura de peixe e de krill para fins de investigação científica. As áreas que ficam fechadas para a pesca, ou com pesca condicionada, podem ser usadas pelos cientistas para comparar com áreas abertas à pesca e perceber quais os impactos da exploração pesqueira nos ecossistemas marinhos.

 

Uma negociação “incrivelmente complexa”

 

A nova área marinha protegida foi aprovada pelos representantes de 25 delegações internacionais, reunidos em Hobart, de 17 a 28 de Outubro.

“Esta foi uma negociação incrivelmente complexa”, que se estendeu por seis encontros anuais da CCAMLR – organismo criado em 1982 para conservar a vida marinha na Antárctida e promover o seu uso sustentável -, comentou Andrew Wright, secretário-executivo do organismo, em comunicado. Foram precisos vários anos para recolher dados científicos que defendessem a criação da área protegida e decidir qual a localização exacta das suas fronteiras. Mas não só. Nem todos estavam convencidos.

A Rússia bloqueou a formação desta área marinha por cinco vezes. Para tentar persuadi-la a mudar de opinião, Lewis Pugh – patrono da ONU para os Oceanos e defensor desta área protegida nos últimos dois anos – nadou várias vezes nas águas geladas do Mar de Ross, para alertar para a sua importância. Chamaram-lhe louco. “Hoje é com emoção que vos digo que o plano louco funcionou”, escreveu no seu site. “Este é um grande momento na história da conservação.”

Para Andrew Wright, “esta decisão representa um nível de cooperação internacional quase sem precedentes, em nome de um grande ecossistema marinho que alberga importantes habitats bentónicos e pelágicos”. “Valeu a pena a espera porque agora há o acordo de todos os Estados membros de que esta é a coisa mais correcta a fazer e todos vão trabalhar para implementar com sucesso esta área protegida”.

A Rússia alterou a sua posição no último ano. Sergei Ivanov, representante especial do Presidente russo Vladimir Putin para a Ecologia, disse, citado pela BBC News, que “a Rússia está orgulhosa da sua história de exploração e ciência na Antárctida. Nesta época de turbulência política em tantas partes do mundo, estamos satisfeitos por fazer parte deste esforço de colaboração internacional para salvar o Mar de Ross”.

Uma das questões-chave foi a duração de vida desta área protegida. O acordo é de 35 anos, mas muitos conservacionistas acham que é pouco, tendo em conta a duração de vida das espécies no Mar de Ross, como as baleias.

“Ainda há vários detalhes sobre a área marinha protegida que ainda não estão finalizados mas a área protegida não está em causa e estamos profundamente orgulhosos em termos chegado até aqui”, acrescentou Andrew Wright. Uma das coisas que ainda está por fazer é o plano de monitorização e avaliação da área protegida.

 

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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