Desde 2016 que o GelAVista, projecto de Ciência Cidadã, anda a investigar quais são os organismos gelatinosos mais abundantes na costa portuguesa. A Wilder falou com a equipa por detrás da iniciativa e dá-lhe a conhecer os principais resultados dos primeiros dois anos, apresentados agora.
Desde o começo do GelAVista, em Fevereiro do ano passado, somaram-se 174 observadores a enviar dados de observações à equipa, “alguns deles muito frequentes para a zona de Lisboa e costa algarvia”, indicou à Wilder a coordenadora deste projecto do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Antonina dos Santos.
Resultado? 1.080 registos de avistamentos de medusas e de outros ‘gelatinosos’, a maior parte para o ano de 2017 (860). Mas bem maior foi o total de organismos observados nestes avistamentos: “O número de gelatinosos é aproximado, pois contabilizam-se em intervalos de abundância, mas foram assinalados cerca de 7.850 gelatinosos em 2017 e 12.830 desde o início do projecto.”
É claro que a diferença de números, no ano passado e neste último ano, pode estar relacionada “com o maior número de observadores GelAVista que registamos actualmente, em comparação com o ano passado”, ressalva Antonina dos Santos.
Entre as principais espécies em Portugal Continental está a Catostylus tagi, que já era considerada a medusa mais comum no litoral continental. Esta foi a mais avistada em 2017 (51% do total), com destaque para a zona de Lisboa.
A equipa foi todavia surpreendida pela “considerável abundância de Catostylus tagi nas praias algarvias, uma espécie que se considerava limitada aos estuários do Tejo e Sado.”
Ainda em 2017, quase um quarto dos avistamentos (24%) foram de Rhizostoma luteum, esta mais registada no Litoral Algarvio. “É uma medusa de grandes dimensões com a campânula a chegar aos 60 centímetros de diâmetro”, indica um folheto de informação sobre as espécies procuradas no âmbito do GelAVista.
Já a Velella velella, a terceira medusa mais avistada neste último ano (13%), pode “formar agregados densos, cobrindo vastas áreas de areal ou à superfície da água.”
Quanto à conhecida caravela-portuguesa (Physalia physalis), foi a mais reportada tanto nos Açores (80%) como na Madeira (60%) – mas com menos avistamentos, comparativamente, do que em Portugal Continental. É constituída “por vários indivíduos simbióticos (zoóides), cada um com a sua função específica, que funcionam todos juntos como um único organismo”, descreve o mesmo documento. Muito urticante, “os seus tentáculos podem chegar aos 20 centímetros.”
Ano de 2016 foi “atípico”
Ao contrário do que sucedeu este ano, a equipa do GelAVista concluiu que a caravela-portuguesa tinha sido a segunda espécie mais avistada em 2016: um terço do total (33%), apenas ultrapassada pela Catostylus tagi (41%).
“O ano de 2016 foi um ano atípico, com um Inverno bastante quente, o que indica que poderá ter existido um favorecimento desta espécie [caravela-portuguesa]”, explicou Antonina dos Santos. Em 2017, “verificaram-se diversas tempestades que poderão ter transportado estes organismos para zonas mais a norte. Foram, por exemplo, avistadas em número recorde em praias do Reino Unido.”
Em contrapartida, em Portugal só se avistaram Physalia physalis durante os meses do Verão, resultando em 7% dos avistamentos de gelatinosos registados ao longo do ano – “um cenário mais normal” do que no ano passado.
Todavia, a coordenadora do GelAVista deixa um aviso: “Temos de considerar escalas temporais mais alargadas para perceber quais os padrões normais de ocorrência de cada espécie e os factores que estarão na sua origem. Estes primeiros dados fornecem-nos indicações que terão de ser verificadas nos próximos anos.”
Procuram-se mais observadores no Porto, Leiria e Coimbra
Apesar do crescimento do número de cidadãos que contribuem para este projecto, “a cobertura nacional ainda não é a ideal”, reconhecem os responsáveis do GelAVista. “A maior parte dos avistamentos provém da zona de Lisboa e da costa algarvia.”
Assim, fazem falta mais observadores no litoral das regiões do Porto, Leiria e Coimbra, exemplificam, tal como na costa vicentina, mais a sul. Os dados de avistamentos nulos são também ainda poucos para as costas norte e sul, “apesar da valiosa colaboração de observadores frequentes no distrito de Lisboa e na Península de Setúbal.”
Ainda assim, os primeiros dois anos de projecto já dão base para algumas conclusões e surpresas. “A espécie Rhizostoma luteum, anteriormente considerada rara, revelou-se uma espécie bastante comum, tendo este ano atingido a costa de Lisboa”, adiantou Antonina dos Santos.
Estes e outros resultados foram apresentados num encontro realizado a 16 de Dezembro, no edifício do IPMA em Algés, com uma parte dos observadores que já colaboraram com este projecto, aberto também a todos os outros interessados.
Entretanto, a equipa do IPMA tem vindo a divulgar o projecto em encontros nacionais e internacionais, trabalho que vai continuar em 2018 – tal como a recolha de dados enviados pelos cidadãos. Foi também já publicado um artigo científico, com recurso aos dados reunidos por este projecto e recolhidos em campanhas oceanográficas, com “indicações importantes sobre a ecologia da espécie Velella velella“.
[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.
O que deve fazer, se quiser reportar o avistamento (ou não avistamento) de um organismo gelatinoso?
Estas observações são tão importantes no Inverno como no Verão. De acordo com o IPMA, basta enviar informação sobre o avistamento para o email do projecto, [email protected]. Neste, deve incluir dados sobre a data, local, número de organismos observados e ainda uma fotografia dos mesmos, sempre que for possível.
Fique ainda a conhecer melhor quais são e onde andam os organismos gelatinosos da costa portuguesa, neste artigo da Wilder.