Para este estudante de Doutoramento em Biologia pela Universidade de Évora, com 29 anos e residente em Cascais, nestas experiências como voluntário “há sempre coisas fascinantes ao virar da esquina”.
WILDER: O que faz enquanto voluntário?
Frederico Carvalho Martins: Como voluntário na Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), participo em vários tipos de censos e contagens de aves, principalmente na região onde vivo. Participo então em projectos de campo para identificação e contagem de espécies de aves.
W: Há quanto tempo é voluntário pela natureza e o que o levou a começar a participar?
Frederico Carvalho Martins: Comecei essencialmente a fazer voluntariado pela SPEA no final dos meus estudos em 2013. Naquela altura ouvi dizer que precisavam de ajuda para organizar o congresso nacional e participei brevemente na parte da divulgação. Depois dessa experiência, percebi que poderia ajudar mais esta organização da qual tinha gostado bastante.
Apesar do curso em Biologia, o meu conhecimento sobre aves era um tanto ao quanto limitado, mas comecei a participar nos eventos que eram participados por pessoas experientes da SPEA e assim fui adquirindo mais e mais conhecimentos na identificação de aves. Depois disso tive períodos de paragens longas na minha participação, uma vez que estive a estudar e a trabalhar no estrangeiro.
Em 2019, quando voltei, e já com mais conhecimentos sobre aves no geral, voltei a tornar-me sócio da SPEA e decidi participar no maior número de projectos que me fosse possível. Assim, nos últimos três anos tenho contribuído para os projectos Arenaria, Noctua, RAM (aves marinhas), censos de aves comuns e de aves invernantes.
W: Quais são os maiores desafios dos censos de aves em que tem participado?
Frederico Carvalho Martins: No geral os censos são momentos muito relaxantes, porque são momentos de apreciação da natureza e não surgem situações muito adversas. Penso que o mais complicado acaba por ser a organização da agenda para que se enquadre nas necessidades do projecto em que estou a participar: organizar o horário e preparar o percurso e o tempo que estarei no campo.
Existe também o desafio de identificação das espécies, porque apesar de ter alguma experiência, há sempre aves que escapam, que parecem algo de diferente ou soam de uma maneira estranha, e não consigo ter uma certeza absoluta na identificação. Mas na realidade esse é um dos desafios mais interessantes: manter a atenção em tudo o que me rodeia e querer ver mais e conhecer mais.
W: Quando começou o seu interesse pelas aves?
Frederico Carvalho Martins: As aves em particular começaram a ser interessantes para mim no final da minha licenciatura, quando comecei a entender um pouco mais sobre elas. Tinha muitos colegas que eram ases a identificá-las e comecei a tomar gosto pelos conhecimentos que me passavam. Foi durante o mestrado que fiz na Suécia que o fascínio disparou, uma vez que fiz um curso específico de ornitologia e aprendi a identificar os sons da maioria das espécies na Europa. E quando se aprende a ouvir, é impossível ignorar o canto das aves, esteja-se onde se estiver.
W: Porque considera as aves tão especiais?
Frederico Carvalho Martins: As aves são um grupo muito especial, no meu entender. São a porta de entrada para muitas pessoas que gostam de natureza e que querem saber mais e ajudar a protegê-la. As aves são animais diurnos e por isso estão aqui à vista de todos, para as podermos apreciar. Para além disso, muitas têm cantos maravilhosos e todos gostamos de “ouvir os passarinhos”. São especiais porque mostram que a natureza está do outro lado das nossas janelas.
W: Como aprendeu a identificar estas espécies?
Frederico Carvalho Martins: Aprendi essencialmente de duas maneiras. Primeiro, através de um curso de ornitologia que fiz, e em segundo lugar pelos conhecimentos que as pessoas que me rodeavam me foram passando. Essa é a melhor parte de aprender a identificar aves, no meu entender: pode ser uma atividade muito social, em que pessoas com mais experiência vão passando aos poucos e poucos a informação sobre como identificar as espécies. Muito interessante é o aspecto do canto, pois cada um arranja as suas mnemónicas para decorar os cantos das aves e memorizar determinados aspectos do som. Um exemplo é a felosa-comum (Phylloscopus collybita), que se chama ‘chiffchaff’ em inglês. Eu aprendi a identificar esta espécie como se ela cantasse o seu nome em inglês ‘chiff chaff chiff chaff chiff chiff chaff chiff chaff…’. Mas certamente outras pessoas memorizaram de uma maneira diferente. Esse processo lúdico/didático é muito interessante.
W: O que tem aprendido e o que tem ganhado com esta experiência de voluntariado?
Frederico Carvalho Martins: O que tenho ganho de mais significativo é a apreciação do que está à minha volta: saber que as aves estão integradas no ambiente que nos rodeia e que há sempre coisas fascinantes ao virar da esquina. Outra aprendizagem que me chega pelo voluntariado é que cada um contribui para a sociedade da maneira como pode. Tenho a noção de que tenho um conjunto de experiências que facilitam a minha participação neste tipo de actividades de cidadania, que ajudam a informar o estado da natureza e permitem à SPEA informar os nossos responsáveis sobre como proteger melhor o nosso ambiente. Existem muitos outros tipos de voluntariado que são essenciais para a nossa vivência e cada um contribui como pode.
W: Costuma participar nos censos sozinho, acompanhado ou em grupo? E porquê?
Frederico Carvalho Martins: Normalmente acabo por fazer os censos sozinho por uma questão de logística, porque me tenho que deslocar ou estar restrito a um horário específico. Uma vez por outra tento convidar amigos fora desta área da natureza, mas nem todos querem acordar às 6 da manhã, ou caminhar 10 quilómetros para “contar aves”. Assim faço-o como sendo o meu momento, em que posso estar mais atento e apreciar as aves.
Conte as Aves que Contam Consigo
A série Conte as Aves que Contam Consigo insere-se no projeto “Ciência Cidadã – envolver voluntários na monitorização das populações de aves”, dinamizado pela SPEA em parceria com a Wilder – Rewilding your days e o Norwegian Institute for Nature Research (NINA) e financiado pelo Programa Cidadãos Ativos/Active Citizens Fund (EEAGrants), um fundo constituído por recursos públicos da Islândia, Liechtenstein e Noruega e gerido em Portugal pela Fundação Calouste Gulbenkian, em consórcio com a Fundação Bissaya Barreto.