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Abutre-preto. Foto: Juan Lacruz/Wiki Commons

Reintroduzidos na natureza quatro abutres-pretos

05.11.2024

Depois de várias semanas na jaula de aclimatação construída no Parque Natural do Douro Internacional, em Freixo de Espada à Cinta, quatro abutres-pretos (Aegypius monachus) foram reintroduzidos na natureza a 3 de Novembro para ajudar a reforçar a colónia mais isolada do país, anunciou a associação Palombar.

Arçã, Alfavaca, Azedinha e Almeirão – três fêmeas e um macho – estiveram na jaula de aclimatação construída no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return no Parque Natural do Douro Internacional. A jaula foi aberta no domingo, 3 de novembro, no âmbito de um programa de solta branda.

Depois da jaula aberta, os abutres decidem quando querem sair, sem intervenção dos técnicos do projeto.

Os quatro abutres-pretos da jaula de aclimatação. Foto: Uliana de Castro/Palombar

Os quatro abutres decidiram permanecer mais uma noite na jaula, já aberta, e só saíram no dia seguinte, 4 de novembro, às 11h21.

“Aparentemente, precisaram do incentivo do Arribes, um outro abutre-preto juvenil, selvagem, que nasceu este ano na colónia do Douro Internacional e que recebeu um emissor GPS/GSM. O Arribes acabou por entrar na jaula e “chamar” os seus pares, que o seguiram para o exterior muito timidamente. Do exterior, toda a cena era observada por um grifo (Gyps fulvus) curioso, que se foi aproximando e que gerou animosidade entre os cinco abutres-pretos. O Arribes acabou por se afastar, voando, e os quatro abutres, no limiar da porta, deixaram o grifo entrar na jaula e alimentar-se dos restos de carne que ainda lá havia. A pouco e pouco, os quatro abutres foram explorando o ambiente exterior e já passaram a primeira noite em liberdade”, segundo a Palombar.

Os nomes dos abutres foram escolhidos por alunos do 7.º ano do Agrupamento de Escolas Guerra Junqueiro, de Freixo de Espada à Cinta. Por terem sido os primeiros abutres a integrar este programa de solta branda, todos receberam nomes iniciados pela letra A. Os nomes são também alusivos ao património natural e cultural da região: Arçã: é o nome dado, em Trás-os-Montes, a uma espécie de rosmaninho; Alfavaca: é uma planta aromática. Os alunos escolheram este nome porque, segundo explicaram, “esta planta é utilizada para tratar infeções e feridas. E, tal como a planta cuida de nós, o abutre-preto também cuida de todos, porque faz parte da patrulha de limpeza da natureza”; Azedinha: nome que alude ao estômago dos abutres, que é muito ácido ou “azedo”; Almeirão: é uma planta herbácea nativa do sul da Europa, que quiseram homenagear. 

Estes quatro abutres-pretos inauguraram a jaula de aclimatação construída no âmbito do projeto LIFE Aegypius Return em Fornos, no concelho de Freixo de Espada à Cinta, numa propriedade dos parceiros de projeto ATN/Faia Brava.

abutre em voo
Abutre-preto. Foto: Artemy Voikhansky/Wiki Commons

Todos estes abutres são juvenis, nascidos em liberdade (dois em 2022 e dois em 2023), que tinham sido encontrados debilitados em vários pontos do país.

Foram resgatados e reabilitados em diversos centros de recuperação: CARAS – Centro de Acolhimento e Recuperação de Animais Silvestres (Évora), dois deles; outro no CERAS – Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens (Castelo Branco) e mais um no CRASM – Centro de Recuperação de Animais Selvagens de Montejunto (Tojeira, Cadaval).

Depois todos foram transferidos para o CERAS, onde terminaram a sua reabilitação, e daí para a jaula, que foi inaugurada a 21 de maio de 2024.

A introdução dos abutres na jaula foi acompanhada por equipas de veterinários do CERAS e do Centro de Recuperação de Animais Selvagens do Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (CRAS/HV-UTAD), que também apoiaram durante a recolha de amostras biológicas e a colocação de emissores GPS/GSM.

Segundo a Palombar, “a jaula de aclimatação foi construída com o objetivo de receber abutres-pretos provenientes de centros de recuperação para a fauna, para que se possam adaptar ao ambiente natural de forma gradual e fidelizar-se à região”. O objetivo é “reforçar a colónia reprodutiva transfronteiriça do Douro Internacional, que é bastante frágil pelo seu reduzido tamanho e por ser a mais isolada das colónias portuguesas”.

Através deste programa de solta branda, o projeto LIFE Aegypius Return prevê devolver à natureza 20 abutres-pretos até 2027, nesta área protegida.

Abutre-preto. Foto: Juan Lacruz/Wiki Commons

O projeto LIFE Aegypius Return é cofinanciado pelo programa LIFE da União Europeia. Nele participam a Vulture Conservation Foundation, beneficiário coordenador, e os parceiros locais Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural (que contam com cofinanciamento da Viridia – Conservation in Action e MAVA – Fondation pour la Nature), Herdade da Contenda, Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Liga para a Protecção da Natureza, Associação Transumância e Natureza, Fundación Naturaleza y Hombre, Guarda Nacional Republicana e Associação Nacional de Proprietários Rurais Gestão Cinegética e Biodiversidade. 

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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