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Pirilampo-comum. Foto: Kristian Pikner/Wiki Commons

Quatro espécies de pirilampo portuguesas adicionadas pela primeira vez à Lista Vermelha da UICN

11.07.2024

Quatro espécies de pirilampo portuguesas foram pela primeira vez adicionadas à Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Aprenda o que pode fazer para ajudar os cientistas a trazer estas espécies de volta.

Uma equipa internacional de biólogos encontrou-se recentemente em Portugal para medir o risco de extinção das espécies europeias de pirilampos.

As conclusões foram anunciados no final de Junho pela UICN, a organização que gere a maior base de dados do mundo sobre o risco de extinção de espécies, a Lista Vermelha.

Todas as espécies de pirilampo portuguesas analisadas estão em declínio, e o Vaga-lume Europeu (Lampyris noctiluca) foi considerado globalmente “Quase Ameaçado”, por apresentar forte indícios de que num futuro próximo possa preencher os critérios para ser avaliado como “Vulnerável”, “Em Perigo” ou “Criticamente em Perigo”.

Segundo os biólogos, a altura de agir para salvar esta espécie é agora, antes que seja tarde de mais.

No total estão registadas para Portugal 10 espécies de pirilampos.

Sérgio Henriques, coordenador de conservação de invertebrados no Global Center for Species Survival, uma parceria do Zoo de Indianápolis e a UICN, é um dos autores desta análise e tem monitorizado estas espécies em Portugal e noutros países. “Toda a gente com que tenho falado lembra-se de ver mais pirilampos quando era criança. Acho que coletivamente sabemos que há cada vez menos destas espécies. Para mim a questão mais importante não é saber quão rápido elas estão a desaparecer, mas o que vamos fazer para que não desapareçam.”

O estudo analisou quatro das espécies que ocorrem em território nacional: vaga-lume-europeu (Lampyris noctiluca), o vaga-lume-pequeno-de-lunetas (Lamprohiza mulsantii), o pirilampo-preto (Phosphaenus hemipterus) e o pirilampo-lusitânico (Luciola lusitanica). 

As maiores ameaças detectadas foram a poluição luminosa, perda de habitat e alterações climáticas.

“Estudos recentes mostraram que tanto os machos como as fêmeas de vaga-lume-europeu enfrentam problemas na altura de encontrar parceiros e mesmo níveis baixo de iluminação artificial à noite podem impedir algumas fêmeas de se reproduzir”, comentou, em comunicado, Raphaël De Cock, da Comissão para a Sobrevivência das Espécies especializado em pirilampos da Europa, no âmbito da UICN.

“A maioria das outras espécies de pirilampos europeus também usa luz para encontrar parceiros, por isso podemos extrapolar com confiança que a sua reprodução está ameaçada pela poluição luminosa. Estudos e censos em curso na Europa e em todo o mundo irão de certo revelar quão rapidamente estão a declinar estes brilhantes insectos e como isso vai continuar nos próximos anos…”, acrescentou.

Causas

Segundo os biólogos há três causas principais para a situação preocupante em que se encontram os pirilampos.

Uma delas é a poluição luminosa. Na verdade, “o que torna os pirilampos animais tão especiais pode também ser parte da razão para o seu declínio: a sua capacidade de produzir luz”, diz Sérgio Henriques.

“Os pirilampos usam bioluminescência para comunicar e encontrar parceiros. Mas um dos mais belos espetáculos do mundo natural depende de escuridão para que seja uma forma eficaz de comunicação. O aumento de luzes artificiais nos últimos anos levou a um aumento de poluição luminosa em espaços urbanos, rurais e mesmo áreas naturais, o que impacta a reprodução destas espécies e pode funcionar como uma barreira à sua dispersão.”

Mesmo relativamente longe de fontes de luz artificial, a intensidade e quantidade da luz que produzimos cria luminância difusa do céu noturno, chamada de skyglow em inglês, que tem impactos na qualidade de vida humana, nos impede de desfrutar do céu noturno e interfere com a biologia de muitas espécies nocturnas, incluindo pirilampos.

“A luz destas espécies é muito bonita mas singela e com a poluição luminosa que produzimos, estamos a colocar barreiras intransponíveis para estes animais encontrarem parceiros. Seria como tentar sussurrar uma mensagem romântica durante um concerto de Rock”, explica Sérgio Henriques.

“Felizmente, a solução para este problema está nas nossas mãos e todos podemos fazer algo para ajudar. Reduza a sua conta de luz ao mesmo tempo que ajuda a salvar a natureza. E se quiser ter ainda mais impacto, fale com as suas autoridades locais, empresas ou organizações e peça para baixar ou apagar as luzes que deixam ligadas toda a noite,“ sugere o cientista.

Outra das causas é a perda de habitat.

Em Portugal alterações nas práticas tradicionais de pastorícia e agricultura (como eucaliptais), desenvolvimento urbano e outras infraestruturas (como barragens), causam modificações rápidas nos ecossistemas ou perda de habitat, destruindo o equilíbrio natural de que os pirilampos, e muitas outras espécies, necessitam. O aumento de espécies invasoras, como as acácias, também alteram o habitat dos pirilampos e podem reduzir a viabilidade de manter populações sustentáveis destas espécies.

Além disso, “diretivas governamentais para a redução de material vegetal em florestas (gestão de combustíveis) para minimizar o risco e impacto de incêndios, têm também gerado medidas de gestão extremas, que removem a vegetação rasteira por completo em áreas bem superiores a 100 metros à volta de aglomerados populacionais, durante algumas das fases mais sensíveis do ciclo de vida dos pirilampos”.

“Identificar, proteger e restaurar os habitats dos pirilampos é essencial para reverter o declínio que enfrentam. Registar observações em plataformas de ciência cidadã como iNaturalist, pode ajudar os cientistas a monitorizar as suas populações e habitats adequados”, aconselha ainda.

Por fim, os pirilampos estão entre as espécies a sofrer com as alterações do clima.

“Os pirilampos são particularmente vulneráveis a secas extremas ou à redução de humidade, uma vez que as suas larvas se alimentam de caracóis e lesmas, que são mais activas em período de chuva ou elevada humidade, sofrendo declínios populacionais em períodos de seca.”

Na opinião de Sérgio Henriques, “proteger o nosso património natural implica também evitar o uso de inseticidas e de outros químicos, principalmente perto de áreas naturais ou de linhas de água, mantendo populações saudáveis de várias espécies de invertebrados, incluindo caracóis e lesmas”.

“Preservar habitat implica apoiar espécies nativas de plantas, quando possível, e remover espécies invasoras, o pode garantir a sobrevivência dos pirilampos. Se dermos oportunidade à natureza de se regenerar, os pirilampos recuperam. Não é tarde demais para agir se começarmos agora.”


Saiba mais sobre os pirilampos de Portugal aqui.

Agora é a sua vez. Descubra aqui como atrair e cuidar de pirilampos num espaço verde.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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