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uma borboleta-monarca, de perfil
Borboleta-monarca (Danaus plexippus). Foto: Qoatl/Wiki Commons

Migração das borboletas-monarca pode estar ameaçada por pessoas com boas intenções

16.10.2024

Cientistas recorreram a dados de 17 anos de ciência cidadã para perceberem o que estará a causar a diminuição de monarcas que todos os outonos percorrem a rota do Canadá e Estados Unidos para o sul do México.

Num artigo publicado esta semana pela revista científica PNAS, investigadores da Universidade da Georgia descrevem como analisaram 17 anos de dados sobre ajuntamentos noturnos de borboletas-monarca (Danaus plexippus), transmitidos por mais de 2600 cidadãos-cientistas ao longo da rota de migração da espécie.

Uma vez que estas borboletas não voam durante a noite, juntam-se em grandes grupos para pernoitarem em árvores e arbustos. Todavia, os dados de ciência cidadã contabilizados pela equipa indicam que o tamanho desses ajuntamentos têm vindo a descer, confirmando que há menos borboletas a chegarem ao México. O declínio dos ajuntamentos noturnos face ao que era observado há 17 anos pode chegar aos 80%, com estas perdas a aumentarem ao longo do caminho para sul, indica uma nota de imprensa da Universidade da Georgia.

Em contrapartida, as populações reprodutoras nos Estados Unidos parecem estáveis, pelo que os cientistas estão a tentar perceber quais serão as causas para estes declínios na rota de migração. “As monarcas estão cada vez mais a falhar a chegada aos destinos de inverno”, afirma Andy Davis, primeiro autor do estudo. “Ou estão a perder a habilidade de navegação ou a perder a vontade de migrar.”

Na verdade, isso não significa que haja menos alimentos ou boas condições de habitat ao longo do caminho, concluíram também os cientistas. Pelo contrário: a rota que estas borboletas percorrem tem vindo a ficar mais verde e com temperaturas mais quentes, o que na verdade deveria resultar em ajuntamentos noturnos maiores.

Outra possibilidade que tem sido colocada por investigadores é que as borboletas estejam a ficar pelo caminho devido às alterações climáticas, retidas pelo aumento das temperaturas nas regiões mais quentes dos Estados Unidos e pelo número crescente de asclépias tropicais que são plantadas por cidadãos. As asclépias (‘milkweed’, em inglês) são o único grupo de plantas de que se alimentam as lagartas da borboleta-monarca, pelo que se tornaram populares como espécies de jardim – mesmo as asclépias tropicais, que não são nativas desta parte do globo.

No entanto, a equipa da Universidade da Georgia considera que não é isso que se está a passar, uma vez que a diminuição dos grupos noturnos se faz sentir de forma consistente ao longo de todo o caminho, incluindo antes das regiões mais quentes.

Parasitas e criação em cativeiro

Os culpados poderão ser outros, apontam os investigadores. Em primeiro lugar, o aumento das quantidades de um parasita que debilita as borboletas da espécie, que cresceu dez vezes desde o início dos anos 2000 e parece estar ligado às plantações crescentes de asclépias não nativas.

“Muitas lagartas de monarca infetadas não sobrevivem até à idade adulta. Aquelas que o conseguem não voam bem a não vivem muito tempo, contribuindo provavelmente para o declínio ao longo da rota de migração”, explica a nota de imprensa. “As asclépias não nativas têm épocas de crescimento maiores, o que pode levar à infeção de mais lagartas pelo parasita, pois os seus esporos podem acumular-se nas folhas.”

Em segundo lugar, o problema pode estar ligado à libertação de borboletas criadas em cativeiro por pessoas que, ironicamente, o fazem com a intenção de ajudar a espécie. “Todas as evidências que temos mostram que quando as monarcas são criadas em cativeiro, seja dentro ou fora de casa, não são boas a migrar”, acrescenta Andy Davis.

Como ajudar a “salvar as monarcas”?

Neste caso, os investigadores sublinham que “menos é mais”. Ou seja, apesar de ser feitas com boas intenções, as plantações de asclépias ao longo do caminho e a libertação de borboletas criadas em cativeiro podem estar a interferir com o sucesso da migração.

Em contrapartida, será vantajoso aumentar as plantas com flor ao longo da rota – não as quantidades de asclépicas tropicais – uma vez que o néctar é um alimento importante que fornece energia às monarcas migradoras.

“Uma das melhores coisas que as pessoas podem fazer para assegurar que as monarcas estarão resistentes e saudáveis é basicamente deixar as lagartas sozinhas nos seus jardins das traseiras”, sugere o primeiro autor do artigo. “Resistam à tentação de as trazer para dentro e de protegê-las porque, ao que parece, a Mãe Natureza faz um melhor trabalho a criar migradoras robustas e saudáveis do que o que nós fazemos”, conclui.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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