Esta semana, a Wilder sentou-se à conversa com Edwina Pitcher no Jardim Gulbenkian em Lisboa sobre o seu livro Wild Guide Portugal, lançado em Abril. Esta escritora e fotógrafa inglesa, de 31 anos, fez 3.000 quilómetros num Jeep vermelho à procura das melhores experiências para aproveitar a natureza. Diz que Portugal tem de tudo. Mesmo.
Wilder: Como teve a ideia de fazer este livro?
Edwina Pitcher: Foi em 2013, enquanto estava a fazer o Caminho de Santiago, de Lisboa até Santiago de Compostela. Passei por muitos sítios selvagens lindos, com muita natureza, e comecei a ver o lado mais rural de Portugal. Apercebi-me de que aqui não precisas ir muito longe para encontrar sítios selvagens. Em Portugal, os sítios selvagens escondidos são fáceis de encontrar.
W: E qual foi o passo seguinte?
Edwina Pitcher: Quando regressei a Inglaterra apresentei a ideia à editora Wild Things Publishing. Na altura estavam a pensar fazer algo sobre a Península Ibérica. Mas acabámos por concluir que Portugal tem tantas coisas que precisava de ter o seu próprio espaço. Começou por ser um livro sobre lugares para nadar na natureza, como lagos e praias fluviais. Até que foi crescendo e começámos a incluir os melhores sítios para caminhar na natureza, para andar de bicicleta, para subir a uma montanha, para ver o pôr-do-Sol ou as estrelas à noite e sítios para comer, desde que estejam em contacto com os produtos locais. Na verdade, isso quase que podia ser um livro por si só (risos). No fundo, são tudo formas de apreciarmos a natureza.
W: Quanto tempo durou esta viagem pela natureza selvagem por Portugal?
Edwina Pitcher: Foram quase dois anos, 2015 e 2016. Desde o início tive a companhia da Diana Matoso. Além de conduzir (coisa que eu não sei) ela é portuguesa e tem um grande conhecimento de sítios selvagens em Portugal. Ela foi perfeita para o projecto. Viajámos juntas no Jeep vermelho do avô dela e acampámos, falámos com as pessoas, perguntámos-lhe onde nadavam, onde gostavam de ir. Durante 2015 vinha a Portugal várias vezes e ficava aqui por um mês. Em 2016 decidi mudar-me para cá e por isso viajámos mais.
W: Resumidamente, como foi o vosso roteiro?
Edwina Pitcher: Começámos pelo Centro, pela região de Arouca, porque a Diana vive em Aveiro. No primeiro dia de viagem apanhámos uma enorme tempestade. Não conseguíamos ver nada das janelas do Jeep. Mas no dia seguinte, quando a tempestade passou, pudemos ver onde estávamos. Era lindo! Estávamos no Arouca Geopark, com as suas serras espantosas. Era Maio, havia flores lilases e amarelas. Fizemos a região Centro, depois fomos ao Norte. Conhecemos o Minho, vimos muitas fortalezas, provámos o vinho verde, dormimos sob as estrelas junto ao rio Lima. Estivemos em Trás-os-Montes, e depois fomos sempre descendo.
W: Para quem é este livro?
Edwina Pitcher: É para pessoas que gostam de natureza, mas não é para pessoas que gostam de nadar com tigres (risos). Não é assim tão selvagem. Não tens de nadar com tigres, podes ir a algum sítio bonito para ver o pôr-do-Sol, beber um copo de vinho verde, ou simplesmente relaxar. Basicamente, é um livro sobre diferentes formas de estar na natureza. É para as pessoas que querem fazer algo energético – como canyoning, canoagem ou saltar para um rio – e também é para quem quer olhar para as estrelas à noite, ou encontrar um castelo, estar sentado a ver o pôr-do-Sol ou a fazer um piquenique numa colina. Ou ainda quem se aventura e segue um trilho até encontrar um bosque antigo, ou quem gosta de andar de bicicleta. É sobre formas diferentes de abrandar mas também de nos sentirmos com energia e revigorados. A natureza é para toda a gente. Isso é o mais importante que quero dizer com este livro.
W: Qual a maior diferença entre este livro e os outros guias turísticos sobre Portugal?
Edwina Pitcher: Penso que a principal diferença é que este é um guia sobre todos os sítios fora das cidades. Como encontrar uma mini-aventura nos arredores de Lisboa ou do Porto. Se estiveres em Coimbra, onde podes ir para nadar num rio? Incluímos alguma informação relativa a cidades, como os restaurantes que usam produtos locais ou naturais. Depois estas são sugestões que não são caras, na verdade, a maioria das actividades são gratuitas, sem bilhetes de entrada. É muito acessível para qualquer pessoa encontrar a natureza. Outra coisa distintiva é que estes são começos de aventuras, não dizemos “isto é aquilo que tens de fazer” nem apresentamos um pacote turístico de coisas genéricas, que poderiam estar em qualquer lugar. Dizemos “comece a sua aventura aqui e depois é livre para explorar o que quiser, mas aqui estão algumas ideias”. É um livro que não condiciona as pessoas e que dá uma forma alternativa para conhecer um país.
W: Experimentou tudo o que vem no livro?
Edwina Pitcher: Sim! Experimentámos muitas coisas fantásticas. Fiz caminhadas com burros, saltei para rios de uma altura de seis metros e fiz canyoning. As pessoas convidavam-nos para experimentar e nós aceitávamos, pelo livro. Para várias coisas, éramos iniciantes. Este é mesmo um livro feito com amor.
W: Foi fácil ou difícil viajar em Portugal?
Edwina Pitcher: Basicamente, nós fizemos os erros para que as pessoas não tenham de os fazer porque as direcções já estão no livro. Incluímos coordenadas GPS, mapas e pequenos guias sobre como chegar aos sítios. Aliás, em Portugal é muito fácil pedir indicações às pessoas e elas querem ajudar.
W: A propósito, como era a reação dos locais à vossa viagem para mostrar o Portugal mais selvagem?
Edwina Pitcher: Muitas pessoas disseram que éramos malucas. Mas penso que no bom sentido. Queriam falar, dizer que nos compreendiam, que também gostavam daquele lugar. Queriam dizer que aquela era a sua casa, que viviam no sítio mais bonito de Portugal. Senti muito orgulho e amor pelos lugares e que as pessoas queriam cuidar deles e mostrar quão bonitos eram os rios, as serras ou a praia secreta. Mas também houve quem se mostrou preocupado com o facto de o livro revelar locais até então secretos. Diziam-me recear que as pessoas iriam deixar lixo e estragar.
W: E o que lhes respondia?
Edwina Pitcher: Dizia-lhes que compreendia. Aliás, penso que isso é muito importante. Mas as pessoas que lerem este livro gostam mesmo da natureza e querem fazer turismo de forma sustentável. Espero encorajar mais disso, incentivando a deixarmos um lugar mais limpo do que aquele que encontrámos. Se visitarmos um lugar e virmos uma garrafa de cerveja no chão, por que não apanhá-la? Estes são sítios naturais mas nem todos estão protegidos e precisam de protecção. Se houver pessoas a visitá-los, talvez isso ajude a gerar mais dinheiro para serem protegidos por aquilo que são, espaços naturais selvagens e não lugares para construir hotéis. Se reconhecerem o quão lindo e selvagem é Portugal, haverá mais pessoas que o queiram proteger e manter assim.
W: O que distingue Portugal de outros países que conhece?
Edwina Pitcher: É muito fácil viajar aqui. Os trilhos estão muito bem assinalados. E há sempre um café (risos). É um país pequeno mas tem tudo, mesmo. Há montanhas, há o mar, rios, lagos, vales glaciares, neve, florestas. É um país com paisagens tão diferentes, e essa diversidade é muito pouco usual. E a vida selvagem é extraordinária, com garranos, lobos, linces, águias, lagartos, tantas espécies pouco comuns para os ingleses verem. E flamingos no Algarve! E golfinhos no Sado! Esta é vida selvagem que podes ver facilmente. E depois, Portugal é um país muito seguro. Éramos duas mulheres a viajar sozinhas e nunca tivemos nenhum problema. Sentimo-nos seguras. Tínhamos noção de que as pessoas sabiam que estávamos na região. Para quê teres televisão se tens avós à janela (risos)? Todos na aldeia sabiam que estávamos por ali, o que é lindo! O espírito de comunidade é muito forte. E as pessoas ajudaram-nos muito, a indicar onde havia uma fonte para irmos buscar água ou onde poderíamos comprar comida. Uma noite até nos abriram uma mercearia de propósito para que pudéssemos comprar algo para comer!
W: Quais serão os maiores desafios para este Portugal mais selvagem?
Edwina Pitcher: Na minha opinião, acho que são os incêndios florestais. No Norte passámos por um, na região de Viana do Castelo. Estava a começar, os bombeiros já tinham sido chamados. Vi uma senhora idosa a tentar apagar as chamas mas o incêndio estava a ficar tão grande, tão depressa. Outras pessoas começaram a ajudar até que os bombeiros chegaram. Também encontrámos muito lixo. Levávamos um saco de plástico só para pôr o lixo que encontrássemos. Por que se não, a vida selvagem iria ingeri-lo. Podes salvar uma ave se apanhares o plástico do chão e o puseres no bolso. Sem problemas.
W: E qual será o próximo projecto?
Edwina Pitcher: Continuo interessada na Península Ibérica. Quero descobrir mais sobre os mitos e as lendas de Portugal. Há tanta história! Ainda não dei Portugal como terminado. Quero descobrir mais sobre os dólmens, a história e os povos, os visigodos, os romanos, há estradas antigas que comecei a seguir. Talvez entre em Espanha. A fronteira não interessa, a paisagem é um contínuo. Acima de tudo quero conhecer melhor a Europa. Estamos todos ligados pela nossa História. Sinto que há uma verdadeira ligação europeia, mesmo depois do Brexit… Há uma história partilhada e é importante sentirmo-nos ligados a isso. Porque a paisagem faz parte de nós, faz parte de quem somos.
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Wild Guide Portugal
Por Edwina Pitcher
Wild Things Publishing
Data de publicação: Abril de 2017
Preço: 16.99 Libras (ebook: 6.99 Libras)
O Wild Guide Portugal faz parte de uma série de livros da editora Wild Things Publishing. Pode encontrá-lo na livraria Palavra de Viajante, em Lisboa, ou nas lojas da Fnac.
[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.
Edwina Pitcher gostava de saber que sítios selvagens de Portugal já visitou. Lança-lhe um desafio de partilhar as suas fotografias no Facebook do Wild Guide Portugal. Pode saber mais sobre esta viagem no Tumblr, Twitter, Facebook e Instagram.