Equipa da Universidade do Algarve e do CCMAR-Centro de Ciências do Mar está a instalar aparelhos transmissores em caranguejos para descobrir mais sobre os movimentos migratórios da espécie.
“Desde 2016, quando o primeiro registo de caranguejo azul foi reportado na Ria Formosa, e em 2017 no estuário do Guadiana, que tentamos monitorizar o melhor possível esta espécie invasora”, explica João Encarnação, um dos investigadores do CCMAR ligados a este projecto.
O caranguejo-azul (Callinectes sapidus), oriundo do Atlântico Oeste (desde os Estados Unidos à Argentina), foi detectado pela primeira vez no Estuário do Tejo em 1978. Entretanto, quase 30 anos depois, no estuário do Guadiana encontrou um ‘hotspot’ – talvez por esse “ser o sistema que apresenta as condições mais propícias para esta espécie se desenvolver, desde a fase adulta, reprodução, e crescimento”, indica o investigador.
É neste local que a equipa tem estado a instalar transmissores acústicos em caranguejos-azuis, recorrendo a ondas de som para transmitir os dados de localização destes crustáceos, uma vez que “a tecnologia GPS não funciona debaixo de água.” Estes aparelhos necessitam de receptores acústicos instalados ali perto para tudo funcionar, pois são esses últimos que detectam esses caranguejos quando estes passam nas imediações, de forma “a registarem a data e a hora de cada ocorrência.”
“Neste estudo estamos a usar transmissores que pesam cerca de três gramas na água e medem menos de três centímetros de comprimento”, descreve João Encarnação, que garante que a fixação destes pequenos aparelhos “não afecta o bem estar de cada indivíduo”.
Como é a migração em Portugal?
Já se sabe bastante sobre as áreas preferidas deste caranguejo invasor em termos de ecossistema, mas o que os cientistas procuram agora saber é como são as migrações sazonais que a espécie faz em Portugal e na Europa.
É que o caranguejo-azul “depende efectivamente de migrações para completar o seu ciclo de vida”: durante o período de desova, as fêmeas passam das zonas de estuário para áreas com água mais salgada, na parte costeira, onde as larvas depois de nascerem se deslocam por várias semanas ao sabor das correntes. Já no estádio larvar final, descreve João Encarnação, estes crustáceos assentam no fundo marinho e passam para as zonas altas dos estuários. “Sabe-se inclusive que os juvenis preferem zonas de muito baixa salinidade.”
O que falta desvendar, adianta o investigador, é quais são as épocas dessas migrações no que respeita a Portugal e também “as respectivas variações de acordo com o estádio de desenvolvimento”.
“Sabendo um pouco mais sobre estes movimentos, poderemos ajustar e melhorar medidas de gestão desta espécie invasora, tal como a introdução de pulsos de água doce na altura em que as larvas estão a reentrar nos estuários, por forma a reduzir drasticamente a quantidade de indivíduos que chegará à fase adulta.”
Mais de duas dezenas de caranguejos
Para já, no início deste mês, a equipa instalou dois receptores acústicos no médio estuário do Guadiana, que se juntam aos receptores que já funcionavam na foz do rio, em Vila Real de Santo António.
Até ao final de Maio, com a ajuda de pescadores do estuário do Guadiana, estão também a marcar 24 caranguejos-azuis com emissores acústicos, prevendo-se que o estudo se prolongue até ao final do tempo de vida das baterias destes aparelhos – cerca de um ano.
“Pedimos que se algum destes caranguejos voltar a ser capturado – apela João Encarnação – que o devolvam excepcionalmente à água no exato local de captura, já que a informação fornecida por cada transmissor é inestimável e assim esses indivíduos poderão continuar a transmitir dados por mais algumas semanas.”
Este estudo está a realizar-se no âmbito do “ATLAZUL – impulso de uma aliança litoral atlântica para o crescimento azul”, que tem o apoio de fundos europeus, e no qual “o Algarve participa em várias actividades”, acrescenta o investigador do CCMAR.
Entretanto, a população local, especialmente os pescadores lúdicos e profissionais, têm ajudado a detectar a expansão desta espécie invasora ao longo do Algarve e também na Costa Oeste. Em causa está a campanha de ciência cidadã NEMA-Novas Espécies Marinhas do Algarve, coordenada por João Encarnação, “que permitiu avançar de forma significativa o nosso conhecimento científico sobre esta espécie em Portugal”.